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Por que o Recife é um caos em dias de chuva?

O Brasil de Fato investiga as razões do caos urbano na capital

Recife (PE) |
Casa de Vinícius Leôncio nunca havia sido invadida pela água. A cada chuva situação do bairro piora.
Casa de Vinícius Leôncio nunca havia sido invadida pela água. A cada chuva situação do bairro piora. - Luiz Felipe/acervo pessoal

A época de chuvas chega e, a cada ano, tornam-se mais frequentes as cenas de alagamento na Região Metropolitana do Recife. Locomover-se nas cidades, missão já complicada em dias de sol, torna-se quase impossível com as chuvas. Quais os motivadores do caos urbano na capital pernambucana e o que precisa ser feito para mudar essa realidade?
Para elencar os erros cometidos no Recife, a presidenta do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), Vitória Andrade, lembrou que o problema teve início há séculos, quando decidiram construir a cidade sobre uma região de alagado. “O ecossistema não suporta essa densidade habitacional, com tantos edifícios. Para completar, não há rede eficiente de esgoto e nem manejo das águas da chuva. A pouca rede que seria para águas pluviais acaba usada para esgoto. Temos muita lição de casa para fazer”.
O escoamento das águas da chuva também é apontado como problema pelo presidente do Sindicato dos Urbanitários de Pernambuco (SINDURB), José Barbosa. Ele critica que as prefeituras priorizam o asfaltamento mas esquecem de pensar nas galerias. “Elas não têm a dimensão apropriada para escoar o volume de águas e ainda sofrem da falta de manutenção. É uma responsabilidade da prefeitura”. Para ele, o sistema também precisa de bombeamento. “O Recife é no nível do mar. Em dias de maré alta, o escoamento fica complicado”.
Vitória Andrade opina que o poder público não tem estabelecido normas ou pensado a cidade de maneira integrada. “Os agentes públicos atuam de maneira separada, um com transporte, outro com esgoto. Não se pensa o problema como um sistema e isso pode gerar um colapso”, diz, “é mais um prédio construído, são as periferias sem esgoto, é a falta de tratamento do lixo, que vai para os canais. É uma cadeia”. E Barbosa completa: “os bairros mais pobres são os que mais sofrem porque sequer há política de escoamento pensada para essas comunidades”.
O estudante Vinícius Leôncio sabe bem o que é isso. Ele teve sua casa alagada pelo temporal do dia 30 de maio. “Acordei com meu pai chamando para ajudar. A água entrou muito rápido pela frente e por trás de casa. Fomos suspendendo os móveis, colocando em cima de outros móveis ou em cima de tijolos”. O saldo de perdas inclui um computador e a bateria do carro. As pessoas sequer conseguiam sair de casa.
Leôncio é morador do bairro de São Benedito, em Olinda, desde que nasceu. Ele tem visto as chuvas causarem cada vez mais estragos na região. Entre os possíveis prejudiciais, o estudante aponta a reforma da Avenida Presidente Kennedy. “Agora, qualquer chuva alaga a avenida. Os pontos de alagamento continuam dias após a chuva. E tem também a reforma de um canal próximo. A obra é para ajudar a escoar a água, mas enquanto não está pronta, o escoamento está mais difícil. Quem mora próximo vê alagar mesmo com uma chuvinha”, reclama, informando que um vídeo do local circulou na internet mostrando um homem com água no pescoço tirando a mãe de dentro de casa numa prancha de surfe.
Na opinião de Vitória Andrade, o Recife precisa adotar medidas para superar o caos urbano que vai além dos alagamentos. “Precisamos melhorar a taxa de hipermeabilização do solo e precisamos de uma política séria para tratar dos esgotos, da drenagem. É preciso oferecer trabalho perto das residências para as pessoas se deslocarem menos nas cidades”. A reportagem entrou em contato com a Prefeitura do Recife mas não obteve resposta.

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