Opinião

Massacre de Orlando: mais uma tragédia anunciada

Já passou da hora do estado brasileiro responder às necessidades da população LGBT

Belo Horizonte |
É preciso que a diversidade sexual, identidade de gênero sejam debatidas amplamente, na escola, no espaço público e na sociedade em geral, só assim teremos condições de vivermos numa sociedade democrática e civilizada
É preciso que a diversidade sexual, identidade de gênero sejam debatidas amplamente, na escola, no espaço público e na sociedade em geral, só assim teremos condições de vivermos numa sociedade democrática e civilizada - Arquivo pessoal

No último dia 12, aconteceu o maior massacre à população lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) dos últimos tempos. O jovem Omar Saddiqui Mateen (29), entrou na boate GLS Pulse, em Orlando, Flórida, nos Estados Unidos, e disparou contra os frequentadores, matando 49 pessoas e deixando 53 feridos. No total, foram 50 vidas tiradas naquela madrugada, incluindo a do atirador.

O caso causou comoção do movimento de LGBT de toda parte do mundo e de parcela da sociedade. Esse massacre já é considerado o segundo maior caso de atentado da história dos Estados Unidos, depois do “11 de setembro de 2005”, que um avião colidiu com o prédio das torres gêmeas. No entanto, o massacre está bem longe de ter a mesma comoção social, tanto dos americanos como da população em geral.

Infelizmente, tal situação é a materialização extrema e cruel do preconceito, discriminação e violência que atingem cotidianamente à população de LGBT. O ódio e aversão extremos aos LGBT, que chamamos de LGBTfobia, deve ser enfrentada, mas, sem dúvida, não é tarefa simples, pois tem formas muito bem elaboradas de manifestação e, consequentemente,  causa sérios danos, adoecimento e até morte de inúmeros LGBT.

Mais de 70 países do planeta tem alguma legislação que penalizam a homossexualidade, sua maioria na África e Oriente Médio. Como se não bastasse, sete países condenam com pena de morte a homossexualidade: Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes, Somália, Mauritânia, Iêmen e Uganda.  Nesses países penalizam com prisão, tortura e execução as relações “antinaturais” entre indivíduos do mesmo sexo, segundo seus códigos penais.  

A ideologia LGBTfóbica não é um problema só dos outros. No Brasil a situação também é muito grave. O nosso país é o campeão de assassinatos de LGBT e também o que mais mata travestis e transexuais. No ano passado foram 319 brutalmente assassinados e neste ano já foram 133 homossexuais mortos.  São mais de 300 assassinatos por ano, ou seja, a cada 26h, um LGBT é assassinado, segundo os dados do Grupo Gay da Bahia (GGB).

Além disso, o discurso de ódio é propagandeado intensamente. Os evangélicos e católicos fundamentalistas têm divulgado diariamente a intolerância nas suas pregações e também nos programas religiosos. Há pastores que fazem campanhas frequentes pelo nosso extermínio, como a cura, a condenação pelo pecado e incentivo à violência. O argumento religioso e moral tem sido o principal responsável pelo aumento do preconceito.

No parlamento brasileiro, a situação não é diferente. Um grupo de deputados, conhecidos como bancada da bíblia, tem atuado fortemente para nenhuma lei prol-LGBT possa ser aprovada, tanto no âmbito da Câmara dos Deputados como no Senado Federal. Além disso, apresentam projetos contrários aos LGBTs, como o projeto de cura gay, estatuto da família e dia do orgulho heterossexual, numa clara oposição à efetivação dos direitos e cidadania dos LGBTs.                                                                                                                 

O massacre LGBTfóbico de Orlando nos possibilita inúmeras reflexões e contém vários elementos de preconceito e intolerância. Já passou da hora do estado brasileiro responder às necessidades da população LGBT. É preciso que a diversidade sexual, identidade de gênero sejam debatidas amplamente, na escola, no espaço público e na sociedade em geral, só assim teremos condições de vivermos numa sociedade democrática e civilizada.

*Carlos Magno Fonseca é jornalista, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) e Conselheiro do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

 

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