Agricultura

Movimentos do campo protestam contra redução de verbas para o setor rural

Orçamento das duas principais macropolíticas agrárias deve reduzir 63,4% e 44,5% em 2017

Brasília (DF) |
Trabalhadores protestam na sede do Ministério do Planejamento, em Brasília (DF)
Trabalhadores protestam na sede do Ministério do Planejamento, em Brasília (DF) - Bruno Pilon/MPA

Os movimentos do campo estão preocupados com os rumos da política agrária do país. No centro das aflições está o custeio das ações relacionadas à reforma agrária e à agricultura familiar, que devem sofrer redução de verbas no ano que vem.

O projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2017 prevê a destinação de R$ 201,7 milhões para a obtenção de terras e cerca de R$ 333 milhões para a área de assistência técnica e extensão rural. 

Os números correspondem, respectivamente, a (-) 63,4% e (-) 44,5% no comparativo com 2016, ano para o qual a LOA projetou custos em torno de R$ 551 milhões e R$ 601,4 milhões nas duas áreas, que correspondem às duas principais macropolíticas para o campo.

O projeto da LOA foi entregue ao Congresso Nacional pelos ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo de Oliveira, na semana passada e deve levantar uma nova polêmica com a oposição, pois segue a limitação das despesas primárias da União, em sintonia com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que propõe um novo regime fiscal e deve afetar as chamadas áreas sociais.

“A situação é preocupante porque o orçamento já era pouco pra atender a demanda. Agora, com essa redução drástica, não sabemos como vai ser, até porque na atual conjuntura não parece haver disposição política do Governo Federal para tratar dessas questões”, disse Antônia Ivoneide, do setor de produção do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST).

A ex-secretária-executiva do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Maria Fernanda Ramos Coelho, também demonstrou preocupação com o que se anuncia no horizonte do novo orçamento.

“Se compararmos esses números previstos para 2017 com os de 2015, por exemplo, os cálculos mostram uma redução de mais de 70% nos investimentos em dois anos, ou seja, é um desmonte absoluto. Fica claro que não existe política para a agricultura familiar nem para os agricultores. O que há, na verdade, é uma falsa retórica desse governo que está aí de dizer que eles vão fortalecer o segmento, mas é claro que não é verdade porque o projeto da LOA reflete exatamente o contrário. É preocupante o que está por vir”, lamentou.

Os movimentos do campo consideram o orçamento destinado à obtenção de terras como um elemento central da luta pela reforma agrária. “Essa é uma pauta que não tem avançado muito e, sem verba, só tende a piorar”, afirmou Antonia Ivoneide, destacando que há atualmente cerca de 120 mil famílias de vários movimentos acampadas em todo o país. Ao todo, o país conta com um número de 4 milhões de famílias consideradas sem terra. “Uma reforma agrária séria teria que considerar todo esse déficit”, acrescentou a militante.

MDA

Outro ponto reivindicado atualmente pelos movimentos do campo é a recriação do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), extinto em meados de maio pelo então presidente interino Michel Temer, no início do processo de impeachment. A medida provocou a reação de diversas entidades ligadas à causa agrária, mobilizando também expoentes da opinião pública,porque apontaria para uma mudança de perspectiva no tratamento dado à pauta agrária.

“Ele tinha uma importância institucional muito grande porque representava todo um conjunto de políticas voltadas para o campo, que agora estão em risco”, disse Lázaro de Souza Bento, da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), citando políticas de assistência técnica e outras ações que ficavam a cargo do Ministério. 

Ele destaca ainda que mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa do brasileiro são provenientes da agricultura familiar. “É um setor que precisa de atenção”, completou.

Com a extinção do MDA, os assuntos relacionados à área ficaram a cargo do recém-criado Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), enquanto a Secretaria de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário foi colocada sob o guarda-chuva da Casa Civil.

Nas últimas semanas, o assunto voltou ao noticiário porque o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, anunciou a recriação do MDA, gerando protestos especialmente por parte de parlamentares do PSDB e do DEM.

Ainda sem uma definição oficial, o tema segue entre as preocupações dos movimentos do campo. “Há uma insegurança muito grande sobre o que vai acontecer. Esse contexto todo é como se fosse uma ameaça rondando os camponeses”, disse Antônia Ivoneide, do MST.

O governo

O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) e da Casa Civil para tratar das verbas destinadas à pauta agrária em 2017 e também do possível retorno do MDA, mas não teve retorno até o fechamento desta matéria.

Neste momento, o ministro Eliseu Padilha recebe em seu gabinete, em Brasília, uma comitiva formada por representantes de movimentos do campo que protestam nesta segunda-feira (5) em diferentes regiões do país contra a desaceleração da pauta agrária. Ao todo, mais de 12 mil trabalhadores estão mobilizados em oito estados.

Além do incremento do orçamento para as políticas do campo e do retorno do MDA, os movimentos têm entre a pauta das manifestações o combate ao PL 4059, que propõe a abertura irrestrita das terras rurais brasileiras para estrangeiros; a promoção da produção de alimentos saudáveis e de políticas de transição para a agroecologia em detrimento do incentivo ao uso de agrotóxicos; e a oposição à reforma da Previdência que vem sendo proposta pelo governo, que deve aumentar a idade mínima a partir da qual os trabalhadores podem se aposentar; entre outras reivindicações.

Edição: Camila Rodrigues da Silva

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