Minas Gerais

PERFORMANCE

Conflitos de “Pai contra Mãe” vão para o palco

Grupo de dança faz espetáculo sobre violência policial, machismo, racismo e outros problemas do cotidiano

Belo Horizonte |
A mensagem para o público é um dos fortes motivos do espetáculo
A mensagem para o público é um dos fortes motivos do espetáculo - Luca Gregório

Os bailarinos fazem movimentos de confronto ao som de um tambor. O barulho se parece com a batida do coração ou com uma metralhadora, não se sabe bem, mas é aflitivo. A Companhia Fusion de Dança tenta mostrar que a dança também é lugar de encenar a realidade. A cena faz parte do espetáculo “Pai Contra Mãe”, que tem temporada de apresentação de 2 a 5 de dezembro e de 9 a 12 de dezembro no Centro Cultural do Banco do Brasil.
O processo de montagem durou dois anos, conta Isadora Rodrigues, produtora da Fusion, e foi inspirado no conto de Machado de Assis de mesmo nome, “Pai Contra Mãe”. O texto fala sobre uma mulher negra grávida em 1860, escravizada, que foge para salvar o filho da escravidão. Ao mesmo tempo, um homem livre se depara com a mulher e a captura, vendo na recompensa uma chance de dar um futuro ao seu filho.
A história, sob a direção de Leandro Belilo, é transposta para os dias atuais e incorpora elementos sobre o racismo, a homofobia, o machismo, a pobreza, a violência policial, para ao fim dar origem aos movimentos de dança dos sete bailarinos. “Nós usamos muito o break, hip hop dance, vouguing e inserimos o krumping, que é um estilo que bate no chão e diz ‘que que foi?’. É mais agressivo, com o intuito de provocar um ponto de vista”, detalha Isadora. 

Dança e vida real
O espetáculo tem um motivo a mais para chegar à representação mais fiel da realidade: a vida dos bailarinos. “Eu vivo o meu conflito constante. Minha irmã tem câncer e a gente precisa levá-la para a quimioterapia”, conta o bailarino Jonatas Pitucho, de 28 anos, nascido no Aglomerado da Serra em BH.
Para Aline Matias foi a tia quem trouxe um novo significado. Quando dançou parte do espetáculo em outubro, com a música “Maria da Vila Matilde”, de Elza Soares, a tia foi assistir. Uma semana depois seu marido faleceu, deixando-a com depressão depois de anos de violência doméstica. Do lado do caixão, a tia chamava Aline repetidas vezes: “aquela dança que você dançou, não é?”, dizia. Por vezes encenava estufando o peito e colocando os braços para trás. “Parece que ela crescia, que deu um poder para ela, literalmente”, descreve Aline.
A mensagem para o público é um dos fortes motivos do espetáculo. Para Isabela Isa-Girl, bailarina da Fusion e moradora do Barreiro, em BH, é preciso estar no palco para “dizer a outras pessoas que elas têm direito de viver, e não só sobreviver”, frente ao racismo, ao machismo, à pobreza, à homofobia e outras tantas dificuldades.

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