Saúde

Profissionais temem precarização após mudanças no funcionamento nas UPAs

Na última quinta (29), o Ministério da Saúde reduziu de quatro para dois o número mínimo de médicos exigidos por Unidade

Saúde Popular | São Paulo (SP) |
Unidade da UPA 24 horas na Vila Santa Catarina em São Paulo (SP)
Unidade da UPA 24 horas na Vila Santa Catarina em São Paulo (SP) - Cesar Ogata/SECOM

A partir deste ano, o Ministério da Saúde vai flexibilizar regras para o funcionamento das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). A pasta vai reduzir de quatro para dois o número mínimo de médicos exigidos por unidade. A definição do número de profissionais caberá à gestão municipal de cada município.

O anúncio foi feito pelo ministro Ricardo Barros na última quinta (29) e preocupa profissionais da saúde, que temem precarização do trabalho e do atendimento.

Segundo Barros, a medida visa solucionar o problema da unidades fechadas. Os dados do ministério indicam que existem hoje 275 unidades em obras, enquanto 165 já foram concluídas, mas não estão abertas.

“É melhor dois [médicos] do que nenhum. O Brasil precisa cair na real. Não temos mais capacidade de contratar pessoal”, disse ele ao anunciar as novas regras.

Lumena Furtado, psicóloga e ex-secretária da Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) do Ministério da Saúde, considera “triste de se ouvir de um gestor público” a declaração feita pelo ministro.

Segundo ela, as UPAs foram criadas para auxiliar e qualificar o pronto atendimento na primeira urgência, e este conceito seria “quebrado” quando se flexibiliza a regra de equipe e equipamentos, já que menos profissionais não teriam condições de dar receber e dar acolhimento caso haja agravamento da situação de emergência.

“Não podemos trabalhar com essa noção simplista de que é ‘melhor um do que nenhum’. Temos que ter capacidade, dentro da política pública, de priorizar e manter uma rede qualificada de urgência e emergência. E, neste caso, isso significa uma pessoa ter acesso [às UPAs] e continuar vivendo”, adicionou.

As UPAS estão inseridas na Política Nacional de Urgência e Emergência, lançada pelo Ministério da Saúde em 2003 para estruturar e organizar a rede de urgência e emergência no país, com o objetivo de integrar a atenção às urgências.

A expectativa do governo federal é que, com a nova regra, a capacidade de atendimento das atuais 520 UPAs praticamente dobre em todo o país, chegando a 960 unidades em funcionamento. O ministro afirmou ainda que a medida não vai comprometer o atendimento nas unidades nem os trabalhos dos profissionais.

O médico Stephan Sperling discorda e afirma que a redução da exigência vai precarizar tanto o trabalho dos profissionais de saúde quanto o atendimento à população.

“Dentro de uma UPA, os médicos precisam dar conta de atender as demandas que chegam, remoções de urgência e emergência das Unidades Básicas de Saúde [UBS] e outros equipamentos, além das observações e da elaboração de um percurso clínico mínimo. É um volume muito grande de atendimento e reduzir para dois plantonistas fará com que o trabalho destes médicos fique extremamente precarizado e avolumado”, disse.

Para Sperling, o diagnóstico do Barros é “extremamente equivocado”. O médico defende que, para as unidades de emergência atingirem um bom funcionamento, é necessário qualificar também as UBS existentes e os serviços de pronto-socorro de centros de excelência e universidades.

Ele acredita que o ideal seria substituir com planejamento estas unidades por mais UBS com médicos de família e equipe especialista em APS, o que aumentaria o custo-efetividade do sistema.

“Ficar interpondo mais um equipamento de saúde que a pessoa pode procurar e não funcionar como uma referência e retaguarda desorganiza a demanda”, disse. Já as unidades que não estão em funcionamento, para ele, são reflexo da falta de contratação de profissionais e de estrutura em razão do subfinanciamento do SUS.

Na mesma linha, Furtado acredita que a medida ainda é agravada no contexto da PEC 55. “Um crescimento do recurso público para saúde é fundamental. Temos um sistema que está crescendo em número e, por isso, depende de um recurso a mais para avançar, ampliar o número de serviços e qualificar os que já existem”, disse a psicóloga.

Edição: Camila Rodrigues da Silva

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