Greve

Servidores da segurança pública no Rio entram em greve a partir de sexta-feira (20)

Trabalhadores já vinham realizando paralisação e agora prometem greve por tempo indeterminado

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Policiais civis, agentes penitenciários e bombeiros se unem para lutar por direitos trabalhistas
Policiais civis, agentes penitenciários e bombeiros se unem para lutar por direitos trabalhistas - Divulgação

Sem receber décimo terceiro salário, horas extras e bonificações, os trabalhadores da segurança pública do Rio de Janeiro decretaram greve a partir dessa sexta-feira (20) e por tempo indeterminado. O atraso nos salários (pagos na quarta-feira (18)) já havia motivado policiais civis, delegados e agentes penitenciários a decretarem paralisação parcial no começo da semana. Os bombeiros, que não podem fazer greve, também prometem realizar ações para manifestar o descontentamento da categoria com o agravamento da crise do estado.

Os trabalhadores da segurança pública afirmam que o plano de greve continua, pois “não é apenas pelos salários”, conforme disseram alguns servidores durante assembleias realizadas pelos bombeiros e policiais civis.

“Os serviços nas delegacias estão funcionando parcialmente, mas todos os funcionários estão indo trabalhar. Com a greve vamos garantir apenas os 30% dos trabalhadores, que é o percentual estabelecido por lei”, afirma o delegado Rafael Barcia, que é o presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Rio (Sinpol).

As delegacias estão realizando somente atendimentos de serviços emergenciais durante toda a semana. “Estamos garantindo as prisões em flagrante, cumprindo mandados de prisão, registro de roubo de carro e os crimes com violência. Todos os demais serviços, assim como a administração, estão parados”, afirma o delegado.

Entre as reivindicações dos trabalhadores está a regularização do pagamento que vem sofrendo atrasos desde o ano passado. “Queremos receber até o quinto dia útil do mês e não apenas no décimo dia, como foram feitos os pagamentos dos últimos meses. Além disso, nossas horas extras não são pagas há seis meses, inclusive o valor referente aos dias trabalhados durante a Olimpíada, apesar de a verba ter sido repassada pelo governo federal”, explica o delegado Rafael Barcia.

Segundo o presidente da Coligação dos Policiais Civis (Colpol- RJ), Fábio Neira, a situação dos servidores da segurança pública é dramática. “A crise, os atrasos nos salários e a falta de pagamento dos benefícios estão provocando nos policiais um estresse muito grande. Praticamente triplicou o atendimento psicológico que a Colpol oferece aos policiais e se estendeu também às famílias. Já temos casos de suicídio e tragédias familiares”, explica Fábio Neira.

A Colpol é uma organização sindical que existe desde 1979, criada em plena ditadura militar para lutar por salários dignos, plano de carreira, aumento do efetivo, entre outras reivindicações. Hoje, integrada ao Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais do Rio de Janeiro (Muspe-RJ), a entidade tem participados dos atos de rua contra as medidas do governo Pezão.

Agentes penitenciários

Embora a Justiça tenha determinado nessa quinta-feira (19) que os agentes penitenciários voltem ao trabalho, os servidores do sistema prisional garantem que só vão restabelecer os serviços quando suas exigências foram cumpridas.

O presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, estabeleceu que caso os agentes não cumpram a decisão até sexta-feira (20) os servidores estarão sujeitos a uma multa diária de R$ 100 mil. No entanto, o presidente do Sindicato dos Servidores do Sistema Penitenciário (SindSistema), Gutembergue de Oliveira, informou que vai recorrer da determinação.

Além da regularização dos pagamentos, que vem sofrendo atrasos desde o ano passado, os servidores pedem melhorias nas condições de trabalho e no sistema prisional como um todo.

Em nota, o inspetor penitenciário Gutembergue de Oliveira afirma que a superlotação das celas e a insuficiência de médicos, enfermeiros, assistentes sociais e outros profissionais expõe inspetores penitenciários à convivência diuturna com os mais diversos perfis de presos.

Além disso, segundo Gutembergue, a má qualidade e quantidade das refeições servidas (tanto a presos, quanto a funcionários) tem sido motivo de constantes insatisfações, bem como o excessivo trabalho gerado pelo afluxo de materiais de higiene pessoal e alimentação vinda de fora da cadeia, em razão da falta de fornecimento desses materiais pelo Estado.

“Todos esses fatores, geridos por inspetores submetidos a uma condição de pressão e temperatura insuportável a qualquer ser humano, ocasiona baixas médicas pelo elevado grau de estresse e doenças funcionais, sem o devido acompanhamento ao servidor”, afirma o agente.

Desde o início da paralisação as visitas aos presos foram suspensas, o que tem acirrado os ânimos dentro dos presídios. Na quarta-feira (18), agentes que estavam em greve, do lado de fora do Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, na zona oeste, tiveram que correr para o interior do complexo para conter uma confusão entre detentos.

De acordo com os funcionários, a confusão ocorreu no presídio Esmeraldino Bandeira, que tem cerca de 2.500 presos. "Não só o Esmeraldino Bandeira, como outras unidades vão acabar estourando se o governo não atender nossas reivindicações. Essa é a tendência.", disse um agente que pediu anonimato.

Bombeiros

Proibidos por lei de fazer greve, os trabalhadores do Corpo de Bombeiros se reuniram em assembleia na quarta-feira (18) e decidiram somar força as demais categorias de servidores da segurança pública.

Em entrevista ao Brasil de Fato, uma das lideranças dos bombeiros afirmou que entre as medidas de protestos que estão sendo avaliadas pelos militares estão o aquartelamento (ficarem retidos dos quarteis e não saírem para atender os chamados) e manifestações contra o governo Pezão. “Estamos nos preparando para lutar contra esse ‘pacote de maldades’ do governo Pezão”, afirma o bombeiro que pediu para não ser identificado.

Direito à greve

O direito à greve é garantido por lei. O artigo 9º da Constituição Federal do Brasil estabelece que esse é um direito social de todo trabalhador. Mesma a última decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece que a administração pública pode fazer o corte do ponto dos grevistas, reconhece que o desconto não poderá ser feito caso o movimento grevista tenha sido motivado por conduta ilícita do próprio Poder Público.

Como os atrasos salariais, assim como o não pagamento do décimo-terceiro e horas extras, configuram um descumprimento da lei, fica assim estabelecido o direito à greve aos servidores públicos, desde que seja garantido o atendimento mínimo de serviços essenciais.

Em decisões sobre casos de greve a polícia civil e federal em outros estados em anos anteriores os ministros do STF se posicionaram contrários. Em 2014, a última vez que o STF se manifestou sobre esse tipo de greve, o ministro Gilmar Mendes negou um pedido da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) pelo direito à greve.

No entanto, decisões judiciais anteriores não interferem necessariamente em caso atuais, apesar de abrir um precedente (chamado de jurisprudência, no meio jurídico).

“O direito à greve, estabelecido pela Constituição é bastante amplo. Ele diferencia servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada. Os servidores estão subdivididos entre civis e militares. Para os civis estão garantidos o direito à greve desde que ele não interrompa serviços essenciais para a população e funcionamento do Estado”, esclarece a desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ), Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, integrante da Associação Juízes para a Democracia (AJD).

Cumpridos esses critérios, defende a desembargadora, os policiais civis e agentes penitenciários teriam direito à greve assim como todos os demais trabalhadores. “Decisões anteriores sobre casos de outras greves não influenciam na situação atual. O que deve prevalecer sempre é o que estabelece a Constituição do Brasil e o Direito Internacional, que reconhecem o direito à greve, portanto ele deve ser respeitado”, explica a magistrada.

No caso específico dos bombeiros, por estarem incorporados ao setor militar, a desembargadora afirma que fica suspenso o direito à greve. No entanto, segundo Sayonara, o Estado brasileiro precisa criar mecanismos que garantam os direitos desses trabalhadores. “O Estado não pode dizer simplesmente ‘não pode fazer greve” e lavar as mãos. Deve haver canais capazes de sanar os conflitos trabalhistas dos bombeiros, que em muitos países, inclusive, não são militares. O Direito deve estabelecer um modelo”, defende a desembargadora.

Edição: Vivian Virissimo

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