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O ego supremo

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Alexandre de Moraes, um dos cotados, é fraco de ideias e de liderança
Alexandre de Moraes, um dos cotados, é fraco de ideias e de liderança - Marcelo Camargo / Agência Brasil
Entre as várias candidaturas postas para a vaga do STF há de tudo

Tem ganhado espaço nos meios de comunicação os nomes de possíveis indicados a preencher a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal, que era ocupada por Teori Zavascki, morto em desastre aéreo sob investigação. A enxurrada de sugestões que surgem em meio a balões de ensaios, defesas de posições e exibições vergonhosas de sabujice explícita, indica a força que o Judiciário vem ganhando no jogo político.

Como fica cada vez mais patente, não se trata de uma discussão que leve em conta apenas as atribuições da corte, mas seu papel decisivo num momento de desequilíbrio dos poderes da República. O interesse na substituição de Teori Zavascki não escondeu, em nenhum momento, a perspectiva de procrastinação possível dos processos por ele relatados. Toda a consternação com as circunstâncias trágicas da morte do ministro surgiu tingida de pragmatismo.

Entre as várias candidaturas postas – com direito à gama de possibilidades que o termo permite em sua encampação espúria, de cabos eleitorais a “programas de governo” – há de tudo. Desde os que de forma cabotina se recusam ao pleito, escudando-se em posturas técnicas, até os que fazem da oportunidade uma plataforma para manifestar sua submissão programática e afronta à independência do tribunal.

A situação acaba por manifestar uma confusão perigosa entre as atribuições constitucionais da corte e sua possível utilização como instrumento conjuntural de sustentação do estado de exceção que preside o processo político brasileiro, na vigência de um golpe. É sempre bom lembrar que, desde suas origens, o protagonismo do Judiciário esteve presente em ações e omissões que ecoavam o interesse da oposição parlamentar e as invectivas da mídia.

No entanto, a situação parece ter chegado ao seu extremo com duas candidaturas que se alternam entre as mais debatidas publicamente. Ainda que sejam possivelmente tributárias da teoria do “bode na sala”, não deixam de ser significativas pelo que expressam de deletério à democracia brasileira. Trata-se da dupla formada por Alexandre de Moraes, atual ministro da Justiça, e Ives Gandra Filho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

De Alexandre Moraes, em sua indisfarçável fantasia de pular etapas e assumir a cadeira de ministro do STF, pode-se dizer que fere as duas exigências legais para o cargo. Seu conhecimento jurídico não é reconhecido nem pelos colegas. Já sua reputação, da qual o cargo cobra que seja ilibada, tem demonstrado indigência nos campos da ética (ele mente) e da respeitabilidade profissional (agravou a crise penitenciária). Sem falar da capacidade de convivência republicana com outras instâncias de governo.

A recente renúncia coletiva do Conselho de Política Criminal de Penitenciária é um sinal claro da discordância aberta entre especialistas acerca da política para o setor e da ausência de capacidade de coordenação do colegiado por parte do ministro responsável. É fraco de ideias e de liderança.

Além disso, numa função que exige sobretudo equilíbrio, tem se mostrado sempre açodado, quando não violento, como demonstrou sua atuação em casos de protestos, inclusive de estudantes em São Paulo. Alexandre de Moraes atropelou o bom senso ao defender a primazia das armas sobre a inteligência. Sua filiação ao PSDB é ainda um carimbo ideológico explícito a transpirar parcialidade.

De Ives Gandra Filho não é preciso aduzir nada. Ele mesmo registra, em seus livros e artigos, posições que afrontam o direito moderno, inclusive decisões constitucionais já sedimentadas. Não reconhece união entre pessoas do mesmo sexo (utilizando para isso argumentos toscos, doutrina religiosa medieval e linguagem desrespeitosa), defende a submissão das mulheres, condena o aborto em todas as circunstâncias e ataca as experiências com células-tronco.

Sua ideologia, que emana do conservadorismo católico da Opus Dei, organização a qual integra, não é apenas antimoderna, mas anti-humanista. O impedimento em atuar em questões que envolvem temas relacionados a direitos humanos e família, por exemplo, seria automático em razão de sua vinculação originária com argumentos religiosos acima da postulação da laicidade do Estado e da defesa do direito das minorias. Não se quer retirar de Ives sua opção ideológica pela reação universalizante, mas apenas impedir, em razão das atribuições do STF, que faça uso dela contra a dignidade humana.

Para completar, Ives Filho é reconhecido como um dos nomes mais próximos da reforma trabalhista intentada pelo presidente não eleito. Em outras palavras, é um dos homens por trás da retirada de direitos e da destruição da CLT em nome da “modernidade” das relações flexíveis no setor. Além de preposto de Escrivá e de sua Opus Dei, Ives acende uma vela jurídica para o projeto neoescravagista das federações empresariais. No STF, seria ponta de lança do trabalho que vem operando no TST.

Um quer ser o que não é, alcançando um lugar para o qual não foi talhado. O outro, humildemente, mira algo ainda mais supremo. Dos dois pode se dizer muita coisa de grande. Mas possivelmente nada maior que seus egos.

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