STF

Ato reúne manifestantes contra nomeação de Alexandre de Moraes

Participantes alegam que indicação teria objetivo de frear Lava Jato

Brasília-DF |
Para os críticos, escolha tem intenção de frustrar Lava Jato, que alcança expoentes de diversos partidos da base aliada
Para os críticos, escolha tem intenção de frustrar Lava Jato, que alcança expoentes de diversos partidos da base aliada - Lula Marques/Agência PT

Um grupo de manifestantes se reuniu na noite dessa quinta-feira (9) na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em um ato apartidário para protestar contra a nomeação do político e jurista Alexandre de Moraes para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ele foi indicado por Michel Temer na última segunda-feira (6) para suprir a vacância deixada pelo ministro Teori Zavascki, que morreu no mês passado em acidente aéreo. Caso a nomeação seja aprovada pelo Senado, Moraes será o revisor dos processos da operação Lava Jato.  

Tendo relações orgânicas com o PSDB desde 2015, ele solicitou desfiliação da legenda na última terça-feira (7), mesmo dia em que se licenciou por 30 dias do cargo de ministro da Justiça, até ser sabatinado pelos parlamentares.

Para os críticos, a escolha para o STF estaria vinculada à intenção de frustrar a Lava Jato, que alcança expoentes de diversos partidos da base aliada do governo, como PSDB, PMDB, DEM e PP.

A indicação de Moraes ocorre uma semana após a presidente do STF, Cármen Lúcia, homologar as 77 delações de ex-executivos da Odebrecht, o que teria servido de catalisador para endurecer as articulações contrárias ao avanço das investigações.

Entre os nomes citados pelos delatores, destacam-se o do próprio Temer, a quem Moraes está diretamente subordinado na hierarquia do Executivo, e os dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).

“Pelo que tudo indica, muitos podem não ser punidos, e aí não haverá um encaminhamento justo e adequado dos processos”, acredita o pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública da Universidade de Brasília (UnB) Leandro Grass, um dos articuladores do protesto.  

Para o universitário Breno Lobo, que compareceu ao ato, a indicação levanta suspeita também por conta do histórico profissional de Moraes.

“Ter numa cadeira do Supremo uma pessoa com um currículo que vai totalmente contra o que os direitos humanos pregam, por exemplo, é algo inadmissível, por isso precisamos demarcar nossa oposição. Hoje não há outro lugar onde a gente deva estar que não seja nas ruas”, defende o estudante.

A declaração é uma referência às polêmicas colecionadas por Moraes ao longo do tempo. Ex-secretário de Segurança Pública do governo Alckmin, em São Paulo (SP), o ministro afastado teve uma controversa atuação diante de manifestações populares. Entre outras coisas, autorizou, sem mandado judicial, ações policiais contra estudantes que ocupavam escolas em protesto contra o escândalo das merendas.

Durante sua gestão na pasta, também foram registrados altos índices de violência policial, com destaque para uma chacina ocorrida em agosto de 2015, em Osasco e Barueri, em que 19 pessoas foram mortas.

À frente do Ministério da Justiça (MJ), Moraes promoveu cortes que paralisaram a política nacional de direitos humanos, prejudicando pautas como a prevenção da tortura e a promoção da igualdade racial.

“Notadamente, ele não tem estatura para o cargo de ministro do STF. Essa indicação é uma coisa contra a qual todo brasileiro deveria reagir”, opinou o secretário-executivo da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, Márcio Araújo, que também se somou ao protesto.

Incoerência

Outro elemento que tem saltado aos olhos da opinião pública depois da indicação do ex-tucano é o posicionamento dele em tese de doutorado defendida na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), no ano de 2000. No estudo, Moraes sustenta que não seria adequada a nomeação para o STF de pessoas que exercem cargos de confiança durante o mandato do presidente em exercício. Segundo argumenta o autor, a medida é para evitar demonstração de “gratidão política”.   

“Isso é totalmente incoerente com o processo que estamos vendo agora. Há uma incoerência intelectual da parte dele, que inclusive tem denúncia de plágio sobre seus livros. Trata-se de uma desonestidade acadêmica. Tudo isso torna a conduta dele pouco ilibada para assumir o cargo”, criticou Leandro Grass.  

A manifestação está relacionada a denúncias trazidas esta semana por jornais da grande mídia de que, em um de seus livros, Moraes teria copiado trechos de um jurista espanhol sem creditar diretamente o autor. Em nota divulgada à imprensa,  o ex-tucano alegou que as fontes da obra estão citadas na bibliografia.  

Moraes também tem sido bastante criticado pela forma como conduziu a crise penitenciária e pelos posicionamentos em relação às políticas de combate ao uso de entorpecentes. Entre outras coisas, ele nomeou, no ano passado, um coronel da Polícia Militar como secretário de Políticas sobre Drogas do MJ. Também tem dito que pretende erradicar o comércio e o uso de maconha no Brasil.   

Caso seja confirmado na vaga de Teori Zavascki, Alexandre de Moraes, hoje com 49 anos, pode exercer o posto durante 26 anos, tendo em vista que a legislação permite o exercício da função do ministro do STF até os 75, quando se dá a aposentadoria compulsória.

Articulações  

O grupo organizador do protesto está montando um calendário de atividades para articular novas ações e visitas aos senadores, no intuito de convencê-los a desaprovar a nomeação. Na próxima terça-feira (14), os manifestantes devem realizar um novo ato, desta vez na porta do Senado, às 18 horas.  

Setores da comunidade jurídica também têm se manifestado contra a indicação de Moraes para o STF. Entre outras coisas, circula na internet um abaixo-assinado de iniciativa do Centro Acadêmico da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Até o momento, cerca de 243 mil pessoas aderiram à mobilização virtual.

Legislativo  

No Senado, a nomeação será inicialmente avaliada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, caso aprovada, seguirá para plenário. Segundo informou nessa quinta-feira (9) o novo presidente do colegiado, Edison Lobão (PMDB-MA), a sabatina do ex-tucano está prevista para o próximo dia 22. A leitura do relatório deve ser feita na próxima quarta (15).  

Nos bastidores, a projeção é de que a oposição deve encontrar grande dificuldade para barrar a condução de Moraes ao STF. Além de o relator do caso, Eduardo Braga (PMDB-MA), ser colega de legenda de Michel Temer, a CCJ tem ao todo dez integrantes investigados na Lava Jato, entre eles o próprio presidente do colegiado.

Governo

O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa do Planalto para tratar das críticas feitas à indicação de Alexandre de Moraes, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. Na última terça-feira (7), o porta-voz da Presidência da República, Alexandre Parola, argumentou que “as sólidas credenciais acadêmicas e profissionais o qualificam para as elevadas responsabilidades de ministro da Suprema Corte”.    

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