Tocantins

Militantes do MST presos por 23 dias são libertados; juiz alega "erro de acusação"

Assentados foram acusados de invasão de propriedade privada em área do Incra destinada à reforma agrária

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

Ouça o áudio:

Familiares dos militantes presos fazem protesto pedindo sua libertação, em frente ao Tribunal de Justiça de Palmas, no dia 13 de março
Familiares dos militantes presos fazem protesto pedindo sua libertação, em frente ao Tribunal de Justiça de Palmas, no dia 13 de março - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

Os quatro militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) detidos no último dia 9 de março no município de Porto Nacional, no estado de Tocantins, foram libertados na noite desta quinta-feira (30). No alvará de soltura consta que não havia "indícios de materialidade delitiva e autoria para justificar as prisões".

De acordo com Zenilda Ferraz, dirigente estadual do MST em Tocantins, os militantes foram "acusados de invasão de propriedade privada, sendo que a área já não poderia ser classificada nesse artigo, justamente por ser uma área pública do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), destinada à reforma agrária".

Procurada pela reportagem do Brasil de Fato, a assessoria do juiz Márcio Barcelos, responsável pelo caso, disse, por telefone, que "ele não dá entrevista" e ressaltou "que todas as informações estão no processo e que a prisão não foi indevida, apenas os crimes em si pelo qual eles foram presos (roubo/invasão de propriedade/ desacato) foram erros de acusação".

Um dos militantes detidos, o agricultor José Carlos Evangelista de Souza, relatou à reportagem que sofreu agressões da Polícia Militar (PM) no dia da operação: "Foi a pior coisa que eu vivi na vida, nunca tinha passado por isso. Isso mexeu com o meu psicológico, mexeu com tudo, porque é pagar por uma coisa que você não deve. Nós estávamos sentados lá longe, em um barraco, quando a polícia chegou dando tiros. Entrou nas casas, pegou facões e bateu em nosso companheiro, empurrou uma arma nas minhas costas. Todo mundo está afetado com o que aconteceu, porque todo mundo trabalha junto, então nós que fomos presos representamos todos eles que estão lá na luta. Não temos outro lugar para ir", afirmou.

Zenilda Ferraz conta que as prisões ocorreram durante uma operação da PM na área do Acampamento Dom Celso após alguns conflitos entre membros do movimento e o caseiro do médico Tulio Gomes Franco, que hoje vive em um lote. Ela pondera que, apesar de a área ter sido destinada à reforma agrária em 1995 pelo Incra, uma série de lotes foram repassados desde então e hoje se encontram nas mãos de pessoas que não se encaixam no perfil de reforma agrária.

"São pessoas bastante influentes no município e no estado que estão em posse desses lotes, o que dificulta bastante. Recentemente, tivemos alguns problemas referentes ao caseiro da área onde Túlio reside. Ele começou a colocar gado para comer a horta do espaço onde o pessoal planta", conta. De acordo com o relato da líder, "não houve um acordo e como esse processo começou a se agravar, começaram a exigir que o caseiro se retirasse. Eles chamaram a polícia, que ignorou o fato de que era um processo agrário em litígio, que não cabe mais ao estado de Tocantins", disse.

Zenilda conta que houve truculência na ação da Força Tática da Polícia Militar: "Já chegou [a polícia] no acampamento atirando, espancou um jovem e outros acampados. Ele [o jovem] foi muito agredido, com spray de pimenta no olho, o que podia ter levado a uma coisa mais séria. Quatro pessoas foram conduzidas, acusadas de invasão de propriedade privada".

Os militantes foram soltos com o auxílio de defensores públicos. Durante o tempo em que ficaram presos foram protocolados três pedidos na primeira instância da Vara Criminal de Porto Nacional para a revogação da prisão e um habeas corpus no tribunal, rejeitados pelo juiz Márcio Barcelos.

Edição: Vanessa Martina Silva