Violência

Pará: Entidades vão denunciar mortes de trabalhadores rurais na ONU

Apenas em uma semana foram registrados sete assassinatos de lideranças do campo no estado

Brasil de Fato | Belém (PA) |
Em menos de 24 horas duas pessoas foram mortas, uma delas com requintes de crueldade
Em menos de 24 horas duas pessoas foram mortas, uma delas com requintes de crueldade - Lilian Campelo/ Brasil de Fato

Diante do cenário de violência que vem se intensificando no estado do Pará, entidades da sociedade civil e movimentos sociais do campo e da cidade realizaram uma coletiva de imprensa em Belém nesta segunda-feira (8) para dar uma resposta aos ataques cometidos contra lideranças e trabalhadores rurais. Em uma semana foram registrados sete assassinatos na região.

A Ordem dos Advogados (OAB-PA), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri) anunciaram durante coletiva que irão mobilizar frentes para denunciar a violência no campo e cobrar das instituições do governo medidas de proteção para lideranças.

Ações

De acordo com Ulisses Manaças, dirigente do MST no Pará, a primeira frente é organizar lutas sociais através de atos públicos para dar visibilidade aos crimes que nos últimos dias vem ocorrendo. As entidades também irão denunciar os crimes nas esferas institucionais do governo, como na assembleia legislativa do Pará, por meio da Comissão de Direitos Humanos, e no Congresso nacional. Além de denunciar também para organizações internacionais como a Anistia Internacional e a Organização das Nações Unidas.

“Esses acontecimentos estão deixando a gente extremamente preocupados, porque é um grau de violência que nós nunca tínhamos visto nos últimos anos na região, o grau de brutalidade está fugindo do controle inclusive da segurança pública”, assegura.

O coordenador da CPT, padre Paulo Silva, declarou que a impunidade no estado é um dos fatores que fortalece os crimes no campo e citou como exemplo os assassinatos da Irmã Dorothy e do casal de extrativistas, José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo, mesmo com grande repercussão nacional e internacional, os acusados e condenados pela justiça ainda estão soltos.

“O Pará não pode ser considerado um estado de direito. Aqui quem manda é a bala, o poder econômico e o latifúndio”, disse. As cidades onde ocorreram os sete assassinados foram em Eldorado dos Carajás, Castanhal, Santa Barbara das Barreiras e em Parauapebas.

No dia 11, quinta-feira, uma comissão irá até o assentamento 1ª de Janeiro para prestar solidariedade à família de Kátia Martins de Souza, 43 anos. A liderança e trabalhadora rural foi assassinada com cinco tiros a queima roupa na frente do neto de oito anos, no último dia 4 de maio.

Crimes

Foto de Kátia Martins de Souza, morta na frente do neto de oito anos quando voltava de uma reunião

Segundo Pablo Esquerdo, do Sindicato dos Assalariados Rurais de Castanhal, Martins chegava em casa por volta das 20h, no assentamento 1ª de Janeiro, onde vivem 94 famílias - na divisa dos municípios de Castanhal e São Domingos do Capim, no nordeste paraense, a 130 quilômetros de Belém - quando foi abordada pelos assassinos que estavam em uma moto. Martins voltava de uma reunião com os assentados da comunidade do Bacuri.

Ele acredita que, pelas características do assassinato, trata-se de um crime de encomenda, como foi com o assassinato de seu tio, Evandro Rodrigues, morto em 2005 nas mesmas condições. “A gente não tem muitas informações, mas pelas características e pelo conhecimento que a gente já tem, a mesma coisa aconteceu em 2005 com o meu tio, até a forma como foi morto”, recorda.

No caso do tio de Esquerdo, a motivação do crime foi porque os assassinos queriam grilar lotes no assentamento Cupiubá, em Castanhal. Dos quatro envolvidos no assassinato três estão presos e um encontra-se foragido.

No dia seguinte, (5), outro assassinato ocorreria. No sudeste do Pará, em Eldorado do Carajás, Etevaldo Soares Costa foi encontrado morto dentro de um saco plástico com sinais de tortura. De acordo com Manaças, Costa e outros quatro trabalhadores rurais sem terra caminhavam pela mata da fazenda Serra Norte quando foram emboscados por um grupo de jagunços. Eles correram para escapar dos tiros, mas Etevaldo não conseguiu e foi capturado vindo a sofrer de forma cruel como descreve o coordenador do MST.

“Eles torturaram ele [Costa] cortaram os dedos, cortaram as pernas em quatro partes, furaram os olhos, degolaram, colocaram ele em um saco plástico e jogaram fora da fazenda para tirar os vestígios de crime”, afirma.

O MST protocolou no final de abril, na Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup-PA), um documento contendo várias denúncias de ameaças e violência que lideranças e trabalhadores rurais estavam sofrendo no estado.

“Nós já fizemos protocolo de denúncia nas delegacias especializadas de conflitos agrários, protocolamos denúncia inclusive com o secretário de segurança pública contra esse estado de coisas, mas as políticas públicas não estão sendo tomadas para salvaguardar o direito à vida daqueles que lutam pelos direitos humanos e muito menos as políticas públicas em relação a questão fundiária que está na origem do problema”, critica Manaças.

Nota

Em nota a Segup afirma que vem atuando nas questões agrárias e realizará a reintegração de posse em 60 fazendas neste ano de 2017, uma delas na fazenda Serra Norte, onde ocorreu o assassinato de Costa. Segundo a nota, a reintegração está prevista para ocorrer ainda no primeiro semestre.

A Secretária ainda informa que a Delegacia de Conflitos Agrários e a Divisão de Homicídios está investigando as mortes registradas e revelou que nesta terça-feira (9), chegam em Belém três suspeitos de participação do assassinato de quatro pessoas, mortas em Santa Maria das Barreiras.

Edição: José Eduardo Bernardes