Lei da mordaça

Adolescente sofre violência em ato de protesto contra o projeto Escola sem Partido

Boletim de Ocorrência caracterizou a denúncia como “constrangimento ilegal” e “crimes contra a pessoa”

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
A imagem mostra o momento exato em que a estudante foi assediada pelo agressor, em ato contra o projeto Escola sem Partido
A imagem mostra o momento exato em que a estudante foi assediada pelo agressor, em ato contra o projeto Escola sem Partido - APP-Sindicato

A estudante Luiza* tem 14 anos e cursa o 1º ano do ensino médio. No final de 2016, a adolescente esteve entre as milhares de secundaristas do Paraná que ocuparam suas escolas contra a Reforma do Ensino Médio. Além do discurso afinado, Luiza chama atenção nos espaços que frequenta por adotar um estilo único, com roupas confortáveis, alargador nas orelhas e cabelo bem curto tingido de rosa.

Na última semana, no dia 15, o assunto que levou Luiza e outros estudantes para a frente da Câmara Municipal foi o início da tramitação do projeto Escola Sem Partido, batizado de “Lei da Mordaça” por professores e estudantes contrários à medida. Ezequias Barros (PRP), Osias Moraes (PRB) e Thiago Ferro (PSDB) são os autores da proposta, ambos ligados a igrejas evangélicas e levam em conta princípios religiosos em sua atuação política, ainda que o Brasil adote o modelo do Estado laico. O clima tenso marcou a manifestação, que reuniu cerca de cem pessoas, entre militantes a favor e ativistas contrários à Escola sem Partido. O que poderia ter sido mais um momento de luta por direitos na caminhada de Luiza se tornou, na memória, uma manhã de dor e de humilhação: ela foi assediada por um homem de mais de 30 anos, que passou a mão em seus seios e disparou comentários homofóbicos na tentativa de enfraquecer sua coragem de se posicionar politicamente.

"Ele disse que eu era muito bonitinha e tinha que virar menina", lembra a estudante. O homem estava articulado entre manifestantes do Movimento Brasil Livre (MBL), todos reunidos em frente à câmara para apoiar a aprovação da lei da mordaça. Além de Luiza, o agressor também assediou e empurrou uma colega do Coletivo Rua, que não quis dar entrevista nem se identificar por não se sentir à vontade para relatar o ocorrido.

Constrangimento em dobro, da agressão à denúncia

Após a agressão, Luiza foi com a mãe à delegacia para formalizar um Boletim de Ocorrência (B.O.). O assediador também foi encaminhado à polícia no banco de trás de uma viatura, onde parecia muito à vontade e, segundo Luiza, sorria cinicamente. “Eu tive que repetir o depoimento a três policiais diferentes”, relatou a jovem. Experiente no âmbito das injustiças, a estudante diz que sequer se surpreendeu com a postura dos agentes na delegacia. “Duvidaram da minha história e a questionaram inúmeras vezes. Perguntaram até se eu não deveria estar na escola quando participei do ato”, disse. “E eu nem tinha aula naquele horário”.

No B.O., a denúncia foi categorizada como “constrangimento ilegal” e “crimes contra a pessoa”. O documento indica o nome de Francisco João de Oliveira Junior como o responsável pelas agressões, junto a um número de telefone. A redação tentou entrar em contato, mas não foi atendida

Thiago Ferro é acusado de exigir salário de assessores

Um dos vereadores proponentes da lei da Mordaça nas escolas curitibanas, Thiago Ferro (PSDB), é acusado de exigir parte do salário de dois ex-assessores de seu gabinete. O denunciante, que não teve o nome divulgado e foi assessor de Thiago Ferro em período anterior ao mandato, afirma que o pastor exigia parte do salário de dois assessores do gabinete de Ferro, conforme informações da assessoria de comunicação da Câmara.

Segundo o corregedor da Câmara, Wolmir Aguiar (PSC), a denúncia apresenta mensagens de Whatsapp em que o denunciante se comunica com um terceiro e fala que a prática continuava.

A sindicância para apurar o caso começou no dia 16 de agosto e tem 30 dias para ser concluída.

Alvo de piada

No programa de humor “Greg News”, veiculado no YouTube, o ator Gregório Duvivier ironiza e critica os retrocessos trazidos pelo Escola sem Partido. Entre as análises, o ator dispara: “A proibição mais explícita é a de impedir que se fale de gênero e sexualidade nas salas de aula. Aparentemente, nossos políticos se preocupam muito com isso”. Em 2 de agosto, o prefeito de Curitiba, Rafael Greca (PMN), declarou seu apoio às propostas da bancada evangélica e disse que as crianças da cidade devem ser educadas “na inocência cristã”.

*Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada

Edição: Ednubia Ghisi