Manifestação popular

Artigo | “Por direitos e democracia, a luta é todo dia”

Democratização da comunicação e emancipação popular estão entre os eixos das manifestações do 23º Grito dos Excluídos/as

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Grito acontece nesta quinta-feira (7), às 16h, em Goiânia,  na Praça do CAIC (ou Praça do CIOP), Jardim Curitiba I e II
Grito acontece nesta quinta-feira (7), às 16h, em Goiânia, na Praça do CAIC (ou Praça do CIOP), Jardim Curitiba I e II - Divulgação

“Ouso dizer que está nas mãos dos Excluídos/as
o futuro da humanidade”

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Papa Francisco

O tema do 23º Grito dos Excluídos/as é - como sempre foi em todos os Gritos - “Vida em primeiro lugar!” e o lema - que muda a cada ano - é “Por direitos e democracia, a luta é todo dia”. 

No artigo anterior “Grito dos Excluídos/as 2017 - CNBB solicita ‘efetivo apoio’” apresentei, com alguns comentários, o conteúdo da Carta da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora da CNBB sobre o 23º Grito. Neste artigo, abordo a temática e os objetivos (geral e específicos) desse Grito e faço algumas reflexões.

Começo lembrando que “os direitos e os avanços democráticos no Brasil, conquistados nas últimas décadas, são fruto das lutas populares. Exemplo disso foi a significativa participação da sociedade civil no debate para a elaboração e promulgação da Constituição Federal de 1988”, embora “muitas leis que garantiam direitos sociais não tenham sido regulamentadas, e muito menos aplicadas, correndo o risco de serem retiradas”.

Hoje, essas leis, em nome da chamada “modernização” - que na realidade é uma forma mais sutil e mais perversa de aumentar a exploração dos trabalhadores/as, sugando seu sangue - estão sendo retiradas pelo Governo ilegítimo do golpista Michel Temer, que não passa de um fantoche do sistema capitalista neoliberal mundial. Com o ajuste fiscal, esse Governo ilegítimo impõe reformas (ou melhor, antirreformas), que têm o objetivo de “retirar os direitos dos trabalhadores/as para tentar resolver a crise econômica no país”, como “a reforma trabalhista; a previdenciária; o congelamento de investimentos por 20 anos na saúde, educação, seguridade, saneamento; e a terceirização, que representam um retrocesso nos direitos conquistados no Brasil com muitas lutas, nos últimos 30 anos”.

O processo democrático - que garante vez e voz ao povo - não foi consolidado. “O que vivenciamos hoje é uma democracia representativa, profundamente questionada porque não representa a vontade popular. Se de fato ‘todo poder emana do povo’, como está na Constituição Federal, é preciso com urgência regulamentar e por em prática as leis que garantem vez e voz do povo nas decisões políticas do país. Avançar da democracia representativa para a democracia direta e participativa”.

“A organização, a participação e a construção da luta de classe (que não é “ódio de classe”) precisa ser uma prática diária. Despertar a solidariedade entre os trabalhadores/as e organizar a resistência são elementos fundamentais nesse processo de democratização e defesa de direitos. Entretanto, o objetivo da nossa luta vai além do direito e da democracia, pois visa à construção de um Projeto Popular para o Brasil e outro mundo possível: justo e solidário, onde a vida esteja em primeiro lugar”. 

As reformas desse Governo (assim como muitas medidas do Governo Dilma) “revelam um Estado que se volta contra a sociedade e o próprio ‘estado de direito’ e se curva aos interesses do capital - as grandes empresas, o agronegócio. 

A luta é todo dia! Não devemos nos pautar somente em processos eleitorais, mas na possibilidade de reconquistar direitos em um cenário de longo prazo. Porém, com o sonho de construir uma nova sociedade pautada no bem viver.

A era dos retrocessos de direitos conquistados deve nos provocar a solidariedade de classe, a organização popular em rede, o retorno ao trabalho de base, a ressignificação do método Ver-Julgar-Agir e reencontrar estratégias culturais e populares de encantar-se com a luta e a defesa da vida, conquistando direitos e construindo a democracia”. 

O objetivo geral do 23º Grito dos Excluídos/as é: “Valorizar a vida e anunciar a esperança de um mundo melhor, construindo ações a fim de fortalecer e mobilizar a classe trabalhadora nas lutas populares. Denunciar a estrutura opressiva e excludente da sociedade e do sistema neoliberal que nega a vida humana e quer nos impedir de sonhar”.

Os objetivos específicos são:

- “Defender a vida dos Excluídos/as, assegurar os seus direitos, voz e lugar. Construir relações igualitárias que respeitem a diversidade de gênero, cultural, racial, religiosa e sejam esperança para juntas e juntos lutarmos por outro mundo possível;

- Construir espaços e ações organizadas politicamente a fim de fortalecer e mobilizar o povo a construir um novo projeto de sociedade mais igualitária e fraterna que valorize a vida, a distribuição de terra, renda e bens para todos;

- Denunciar as estruturas opressoras da sociedade, as injustiças cometidas pelo atual modelo econômico neoliberal, como a concentração de renda, a criminalização dos movimentos, dos defensores e defensoras dos direitos humanos e das lutas populares;

- Ocupar os espaços públicos e exigir do Estado a garantia do acesso e a universalização dos direitos básicos como educação, segurança pública, saúde, transporte, alimentação saudável, saneamento básico, moradia. Lutar contra a privatização dos recursos naturais e contra as reformas que retiram direitos dos trabalhadores/as;

- Cobrar dos governantes uma auditoria integral da dívida pública (interna e externa), que consome aproximadamente 45% do nosso dinheiro (orçamento federal) pagando juros e amortizações aos especuladores”.  

Os eixos que estão sendo trabalhados neste ano são: democratizar a comunicação, direitos básicos, Estado fomentador de violência, projeto de país que desejamos e Estado que queremos, participação política e emancipação popular, unir generosas/os nas ruas, uma ecologia integral (Fonte: Jornal “Grito dos Excluídos/as”, número 66, ano 23, abril/maio 2017, p. 1-3).  

Para os cristãos e cristãs, o Grito dos Excluídos/as (dos Descartados/as) é o Grito de Jesus de Nazaré. Dói muito constatar que na Igreja (falo da Igreja Católica, mas vale também para as Igrejas evangélicas) existem Comunidades, Paróquias e Dioceses que - por omissão ou ação de seus pastores (apesar da Carta da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Social Transformadora da CNBB, de 12 de julho de 2017, solicitando “efetivo apoio”) - são indiferentes ou se opõem ao Grito dos Excluídos/as (às vezes, até boicotando-o com certo cinismo). Esses pastores são maus pastores, são os Judas de hoje, que traem Jesus na pessoa dos Excluídos/as. Terão que prestar conta a Deus! 

“Ai dos pastores que espalham e extraviam as ovelhas do meu rebanho, diz o Senhor. Agora sou eu que vou pedir contas a vocês pelo mal que praticaram, diz o Senhor” (Jr 23, 1-2). 

“Eu garanto a vocês - diz Jesus de Nazaré - tudo o que fizeram (ou deixaram de fazer) a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim que o fizeram (ou deixaram de fazer)” (Mt 25, 40 e 45). 

Irmãos bispos do Conselho Episcopal Pastoral (Consep) e da Presidência da CNBB: não sejam - por medo ou conveniências nem sempre evangélicas - omissos, mas verdadeiros profetas da vida! “Um dia de oração e jejum pelo Brasil” é sempre um tempo forte de graça de Deus, mas não basta. “O jejum que eu quero - diz o Senhor Deus - é este: acabar com as prisões injustas, desfazer as correntes do jugo, libertar os oprimidos (os excluídos, os descartados) e despedaçar qualquer jugo, repartir a comida com quem passa fome, hospedar em sua casa os pobres sem abrigo, vestir aquele que se encontra nu e não se fechar ao seu semelhante (ao seu irmão)” (Is 58, 6-7).

Como Jesus de Nazaré, os bons pastores estão sempre ao lado das ovelhas excluídas (descartadas) e solidários com elas na defesa de seus direitos. 

Venham! Juntos e juntas - numa grande mobilização nacional, com manifestações no Brasil inteiro - vamos participar do Grito dos Excluídos/as! Vamos nós mesmos ser o Grito dos Excluídos/as!

 

(*) Frei Marcos Sassatelli é frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção - SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.

Edição: Brasil de Fato