Reforma política

Financiamento público de campanha é forma de combater corrupção, dizem especialistas

Tornar o crime de corrupção hediondo ou aumentar a duração das penas não resolverá problema, apontam advogados

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Manifestação contra o financiamento privado de campanhas
Manifestação contra o financiamento privado de campanhas - Pedro França/Agência Senado

A chave para conter a corrupção pode estar na prevenção, fiscalização e transparência do sistema político. Especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato consideram que propostas como tornar o crime de corrupção hediondo ou aumentar a duração das penas para esse tipo de prática, ou seja, a adoção de medidas punitivas, não resolvem o problema.

O ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcelo Lavenere, ressalta que o foco deve estar na fiscalização: “O tamanho da pena não inibe a corrupção, o que inibe é a fiscalização. Não adianta deixar que a prática da corrupção aconteça e, depois que houver a corrupção, punir”.

Defensor do financiamento público de campanha, Lavenere faz duras críticas à reforma política em votação na Câmara dos Deputados, que deve ser apreciada ainda esta semana. Segundo ele, criar um fundo de financiamento com grande volume de recursos e sem regras bem definidas de distribuição seria uma “orgia” e mais um golpe que o Congresso quer dar, para deixar o dinheiro nas mãos dos grandes partidos.

“O Congresso absolutamente ilegítimo pretende dar mais um golpe. Já deu o golpe no impeachment, deu o golpe para colocar o [presidente Michel] Temer para fazer um programa para o qual ele não se elegeu como vice-presidente, e o outro golpe é fazer uma reforma política que atenda os interesses das elites e não os populares”, afirma.

O financiamento público levará ao barateamento das campanhas eleitorais, explica. Ele opina que o financiamento privado de campanhas tem sido o responsável pela corrupção no país nos últimos 20 anos. Nesse sentido, a proposta dos movimentos populares, dos quais o advogado participa, seria fazer uma campanha para conscientizar a população de que o gasto, desde que correto, é pequeno comparado a outras despesas como o pagamento de juros da dívida. 

Esse recurso, que seria pago com o dinheiro dos impostos dos cidadãos “é, sim senhor, para financiar a democracia. O dinheiro que vocês pagam é para garantir o país, para financiar a soberania nacional e para defender as instituições. Ou, você quer os banco, as empresas estrangeiras financiem os nossos candidatos?”, indaga.

Já o professor da Faculdade de Direito Mackenzie, Diogo Rais, ressalta ser importante impedir a concentração e o volume de dinheiro nas campanhas eleitorais. Mecanismos de controle e transparência devem, acima de tudo, garantir um rateio igualitário dos recursos não só públicos, mas também privados, que vão para as campanhas eleitorais, opina.

Para Diogo, é preciso adotar mecanismos mais assertivos do que a punição excessiva: “Toda a parte punitiva pode ter a sua função, mas na verdade nós temos hoje muitos mecanismos de interação e cruzamento de dados, de uma forma muito mais rápida e transparente. Se a gente tiver contas mais transparentes e uma fiscalização mais intensa, a gente vai pegar onde a coisa está acontecendo”.

Apesar de ter como mote o combate à corrupção, o movimento gerado pela Lava Jato não teve resultado positivo, opina Rais. Isso porque a força-tarefa adotou uma postura punitiva, o que acabou levando à criminalização da política.

“É preocupante isso. A gente precisa fazer uma distinção das punições, da apuração e tudo mais só que a gente precisa fazer um movimento para que isso não vire a criminalização da política. Parece que a própria lei criminalizou a política. Ela trouxe uma série de rigor a respeito disso. Tem que punir com segurança. Uma punição sem segurança jurídica é uma não punição”, diz ao acrescentar que a falta de certeza jurídica prejudica o lado pedagógico da punição.

Edição: Vanessa Martina Silva