Saúde

Liminar que restringe atuação de enfermeiros ameaça existência do SUS, dizem médicos

Decisão de juiz de Brasília impede que profissionais da saúde requisitem exames e consultas ou revalidem receitas

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Cerca de 85% das profissionais pertencem ao gênero feminino
Cerca de 85% das profissionais pertencem ao gênero feminino - Agência Brasil

Uma recente decisão da 20ª Vara da Justiça Federal de Brasília altera o cotidiano dos profissionais de enfermagem. De acordo com a liminar expedida pelo juiz Renato Borelli, agora, enfermeiros não podem mais requisitar consultas e exames na atenção básica de saúde ou revalidar receitas médicas.

Algumas entidades se posicionaram contra a medida. Foi o caso do grupo Médicos pela Democracia. Na avaliação dos profissionais, a liminar contribui para o desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS) no país.

Silvio Lopes, integrante da coordenação dos Médicos pela Democracia, destaca os danos que serão causados pela medida: “Essa medida cria uma insegurança jurídica da prática de enfermagem enorme. Há mais de 20 anos, as enfermeiras e os enfermeiros realizam procedimentos, dentro da sua consulta de enfermagem, tanto de solicitação de exames e diagnóstico sindrômico [que parte da observação de sinais e sintomas] baseados em protocolos muito bem estabelecidos e validados”.

O argumento usado para a liminar judicial é de que essas são funções específicas dos médicos. A enfermeira Letícia Rangel, que trabalha na Unidade de Saúde da Família São Judas Tadeu, em Lauro de Freitas, na Bahia, no entanto, explica que o trabalho realizado pela categoria é essencial para o atendimento dos pacientes:

“A gente realiza diagnóstico de enfermagem, que é totalmente diferente do diagnóstico do médico. Se a gente não tem mais esse subsídio para realizar isso, a gente não consegue criar um plano de cuidados adequado para esses usuários e a limitação é enorme, seja no acesso dos usuários ao serviço, no aumento da agenda dos médicos ou na sobrecarga de trabalho”, diz Rangel.

Letícia explica que o atendimento fornecido aos pacientes deve ser multiprofissional e que a interferência na atividade dos enfermeiros afetará, principalmente, os usuários do sistema público.

“Isso ampliou muito o acesso da população aos serviços de saúde. Quando a gente passa a ser limitado a realizar as nossas atividades, isso afeta principalmente o usuário, o seu acesso, a diminuição dos índices de várias doenças crônicas e de situações de saúde”.

Atenção básica

Silvio Lopes defende que a atuação dos enfermeiros é fundamental para a ampliação da atenção básica no país. Para o médico, nos últimos 20 anos, os avanços na área foram consideráveis. Ele lista, por exemplo, a redução da mortalidade materna e infantil, a melhoria no controle da tuberculose e da leucemia.

O médico acrescenta, ainda, que a medida liminar pode ser entendida como isolada. Para Silvio, ela reforça mudanças prejudiciais que vêm sendo implementadas na estratégia de saúde da família desde o golpe político-midiático que retirou Dilma Rousseff (PT) da presidência.

“Desde que aconteceu o golpe em 2016, ninguém não se importa mais com a opinião pública. Se aprovam leis federais que vão incidir sobre a qualidade de vida e de saúde da população sem o menor pudor de contrariar a imensa maioria da opinião pública”, destaca.

Edição: Vanessa Martina Silva