Coluna

Rede Negras Empoderadas realiza sessão exclusiva do filme Pantera Negra

Imagem de perfil do Colunistaesd
Personagens femininas de Pantera Negra não caem na tradicional rivalidade
Personagens femininas de Pantera Negra não caem na tradicional rivalidade - Divulgação | Marvel Studios
A população negra também quer consumir e celebrar a cultura, não só na periferia

Nesta terça (20), a partir das 19h, a rede Negras Empoderadas realizará no Shopping Eldorado uma sessão exclusiva do filme Pantera Negra, somente para o público negro. Além de ser uma grande celebração entre a comunidade negra para assistir na telona a saga do primeiro super-herói afro-americano da história, também tem por objetivo problematizar a questão da representação e da representatividade negra no cinema, bem como o acesso desta população aos bens culturais. 

Nós, negros, também queremos consumir e celebrar a cultura, não somente nos espaços periféricos. Para passar essa mensagem com o impacto necessário, cerca de 300 pessoas participarão do evento. A escolha do local vai de encontro à proposta de impactar e marcar a presença negra, estando em grupo, nos locais que geralmente não são acessíveis para nós, segundo Mayra Silva de Souza, uma das co-criadoras da Rede Negras Empoderadas e produtora do evento.

Para que o evento tenha êxito, foi necessária uma grande mobilização da Rede Negras Empoderadas, por meio das redes sociais. Segundo Mayra, a ação começou bem tímida, mas rapidamente ganhou força devido ao apoio de parceiros negros, artistas, empreendedores e formadores de opinião. 

Pude acompanhar as primeiras mobilizações e sondagens de interesse sobre o evento e prontamente me senti motivada a fazer parte de uma mobilização protagonizada por mulheres negras. Passei a colaborar com as ações de divulgação do evento e grande foi a minha alegria ao ser convidada para fazer a abertura do evento com uma intervenção poética e com a exibição do clipe Pretas Panteras. Vai ser realmente emocionante para todas que participaram do clipe nos vermos em uma sala de cinema, e em seguida, assistirmos juntas Pantera Negra.

Penso que a vida da população negra brasileira é bastante concreta. Nossos heróis e heroínas são pessoas reais, que lutam diariamente pela sobrevivência. São nossos pais, amigos e familiares. Queremos nos permitir essa ludicidade, de nos vermos com superpoderes, em um planeta imaginário. E vivenciar essas experiências juntos, será realmente incrível.

Continua após publicidade

Para participar do evento os interessados tiveram que adquirir previamente o ingresso no valor de cinquenta reais, com direito a um combo com a tradicional pipoca e refrigerante ou outras guloseimas. A mobilização da Rede atraiu importantes parceiros e patrocinadores que colaboraram com o custeio do evento.  

Pensando em alcançar aqueles que não poderiam arcar com o valor, a Rede Negras Empoderadas realizou uma série de ações, disponibilizando cotas de ingressos para sorteios, cotas de meia entrada e ações de apadrinhamento. Assim, em pouco mais de um mês esse grande evento foi organizado a muitas mãos.

Mayra Silva de Souza afirma ter consciência de que essa ação não impacta diretamente na estrutura da questão racial no Brasil, e que esta, seria uma grande pretensão. No entanto afirma ser uma ação que além de aproximar negros e negras, evidencia positivamente o potencial de ações em rede, para a mobilização destas e outras pautas. 

O filme Pantera Negra foi lançado em cadeia nacional no último dia 15, apresentando grande aceitação da crítica especializada e do público, com números impressionantes de bilheteria. No entanto, aqueles que, como eu, optaram em comparecer ao evento “Pantera Negra – 1° Encontro Negras Empoderadas 2018”, além de assistir um filme formidável participarão de uma importante ação coletiva protagonizada por muitas mãos negras. 

Rede Negras Empoderadas
A Rede Negras Empoderadas teve sua gênese em novembro de 2015, a partir do encontro de 23 mulheres negras que se reuniram para estreitar os laços e trocar experiências, transpassando as fronteiras virtuais. Deste encontro a rede ampliou-se, e atualmente agrega 11.500 mulheres negras, incluindo diversos coletivos, do Brasil e do mundo, em um grupo fechado no Facebook. Ainda nesta rede social, mantém uma página aberta a quem possa interessar. 

Desde então, a Rede Negras Empoderadas realiza ações coletivas para dar visibilidade à presença da população negra e às pautas que a mesma apresenta, com enfoque para as mulheres negras. Mayara afirma que, para o futuro, a rede pretende realizar ações voltadas para a formação como grupo de estudos e clube de leitura, focado em escritoras e intelectuais negras. 

Sobre o filme
O filme Pantera Negra é baseado na história do super-herói homônimo, da empresa norte-americana Marvel Comics, que integra o grupo The Walt Disney Company. Sendo o primeiro super-herói afro-americano, o personagem estreou em 1966 na história do Quarteto Fantástico. Desde então, muitas foram as tentativas frustradas de emplacar a sua saga, o que também reflete toda a expectativa do público em geral após 56 anos de espera. 

Pantera Negra é a identidade secreta de T´Challa, príncipe de Wakanda, uma nação fictícia localizada na África. Na saga, após um longo período de afastamento devido aos eventos de Capitão América: Guerra Civil, T´Challa retorna a fim de se tornar a nova liderança da nação.

No entanto, descobre que facções de oposição tramam para impedi-lo. Para evitar a destruição de Wakanda, o herói Pantera Negra entra em ação e, em sua empreitada, conta com a ajuda do agente da C.I.A Everett Ross e dos membros das Forças Especiais Wakadianas, para prevenir que seu mundo seja tragado pela guerra.

Com um elenco majoritariamente negro e trazendo grandes nomes de Hollywood tais como Chadwick Boseman no papel principal, Lupita Nyong'o, Angela Bassett, Forest Whitaker, entre outros, o filme Pantera Negra tem quebrado os recordes de bilheteria nos Estados Unidos e no mundo, o que, a meu ver, não se deve somente à primorosa produção do filme.

Pantera Negra vai de encontro a uma lacuna de representação e representatividade da população negra na grande indústria cinematográfica. Essa pauta tem sido frequente nas grandes premiações do cinema, como Oscar, Golden Globe e Emmy por exemplo. Nestas oportunidades, profissionais negros da indústria cinematográfica pautam a falta de condições e oportunidades para desenvolverem seus trabalhos em pé de igualdade com profissionais não negros. 

Viola Davis retratou essa realidade em seu emocionante discurso ao se tornar a primeira mulher negra a ganhar o Emmy, em 2015. “A única coisa que separa mulheres negras de qualquer coisa é a oportunidade. Você não pode vencer um Emmy por papéis que simplesmente não estão lá”. E finalizou com “obrigada por nos levar além da linha”, dirigido a todos os profissionais que escreveram sua personagem . Nesse sentido, o sucesso de Pantera Negra ratifica essa afirmação da atriz Viola Davis. 

Nós, negros, ansiávamos por Pantera Negra, por uma narrativa, mesmo que fictícia, que apresente essas personagens negras vivendo em uma nação avançada, tecnológica, preservada, contribuindo, assim, para a quebra de paradigmas sobre a forma como África é historicamente retratada, sempre nos polos da violência e pobreza ou da exoticidade.

Pantera Negra tem história e um núcleo familiar bem consolidado em sua biografia. Possui um vigor super-humano e sentidos aguçados, além de habilidades ligadas ao seu intelecto genial. É psicologicamente complexo e leal. Qualidades que, infelizmente, não são frequentemente atribuídas a personagens negros na ficção. 

Que o sucesso de Pantera Negra evidencie que nós negros clamamos cada vez mais por essa representatividade positiva e construtiva, não somente no audiovisual. 

*Débora Garcia é poetisa, gestora cultural, idealizadora e artista no coletivo Sarau das Pretas.

Edição: Daniela Stefano