Movimento

Em Pernambuco, torcida pede um Sport do povo de novo

Torcedores rubro-negros lançam manifesto para resgatar um Sport “das massas”

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Arquibancadas vazias têm sido uma constante na Ilha do Retiro
Arquibancadas vazias têm sido uma constante na Ilha do Retiro - Sport Recife/Comunicação

No último dia 15 de fevereiro a torcida do Sport tardou a pregar os olhos. O Rubro-negro fora eliminado da Copa do Brasil, em plena Ilha do Retiro, pelo modesto Ferroviário do Ceará, equipe da 4ª divisão do Campeonato Brasileiro. A forma da eliminação foi agravante: o Sport abriu 3x0, teve oportunidades para mais, mas os cerca de 3 mil torcedores viram o time tomar três gols em 10 minutos. Nos pênaltis, deu Ferrão. Menos de um mês antes, o Leão levara um surpreendente 3x0 do fragilizado rival Náutico, atualmente na 3ª divisão e em crise econômica.

A queda diante do Ferroviário foi a gota d’água. Desde o início do ano o futebol do Sport era burocrático e os bastidores conturbados, com atrasos salariais, desentendimentos entre atletas e diretores e negociações conflituosas. Um grupo de torcedores rubro-negros que há meses debatia via Whatsapp assuntos relacionados ao clube decidiram, então, organizar as ideias e ampliar o debate com o conjunto da torcida leonina. Por isso lançaram um manifesto e iniciaram o Movimento Democracia Rubro-negra. O objetivo não é criticar a atual gestão, mas pensar que clube o torcedor quer e se o que está sendo construído condiz com o anseio das arquibancadas.

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Um dos integrantes do Democracia Rubro-negra é João Victor Rocha, de 34 anos, morador do Recife. Ele descreve o movimento como “horizontal, plural e ainda sem hierarquia”. “Uma boa parte do grupo é sócio do Sport, mas não todos. Não fazemos essa diferenciação e somos contra excluir os torcedores que não são associados. Somos um movimento de torcedores apaixonados pelo Sport”, afirma João Victor. Ele destaca que a crise no Leão e o progressivo afastamento do perfil de um clube de massas levou os integrantes a iniciarem o movimento.

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Entre as pautas do movimento está na facilitação do acesso dos torcedores aos jogos. Na análise do movimento, o aumento no preço dos ingressos da Ilha do Retiro, nos últimos anos, foi uma ação das últimas gestões para tentar afastar as torcidas organizadas. “Não compactuamos com torcidas que praticam a violência. Achamos que isso não deveria ser parte da vida do clube. Mas o aumento do preço do ingresso acabou afastando todas as organizadas, incluindo as que iam só para apoiar”, lamenta Rocha. “Sob o pretexto de afastar torcidas violentas, a diretoria tomou medidas que afastaram todos os torcedores de menor poder aquisitivo. Por isso não concordamos”, pontua.

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Na avaliação dos membros do Democracia Rubro-negra, essa política de ingressos é “suicida”. “Acabaram por afastar a grande maioria dos torcedores do Sport. Se mantivermos isso, vamos afastar uma geração inteira. Vamos perder torcedores”, diz João Victor. O movimento pede uma nova política de ingressos em que pessoas de baixa renda consigam ir aos jogos. “A parte mais cara do estádio é aquela que fica vazia, porque o time está deixando de arrecadar e está afastando o torcedor”, avalia. “É preciso democratizar o acesso aos jogos do Sport”.

Outro ponto do manifesto é em relação aos rubro-negros do interior, que estariam se sentindo “abandonados”. “Sempre que o Sport vai jogar no interior há uma mobilização da cidade, porque é a única oportunidade no ano que o torcedor tem de estar em contato com o clube. E esse torcedor não pode ser negligenciado”, reivindica Rocha. O movimento vê como necessário o clube promover atividades, estimular a criação de “Consulados do Leão” e que estes tivesse um canal de diálogo com a gestão do clube, além de ter acesso a produtos. “Esse torcedor pode não ir a jogos com tanta frequência, mas compra camisa e consome o clube de outras maneiras. E você garante que o amor pelo Sport se perpetue pelas próximas gerações. É estratégico”, diz João Victor, opinando que, sem isso, a população vai torcer para os clubes do Sudeste.

Copa do Nordeste

O Movimento Democracia Rubro-negra também coloca como um dos erros da atual gestão a saída do Sport da Copa do Nordeste. O movimento afirma que a competição, que este ano poderia render até R$ 3,5 milhões ao clube, é um torneio que o torcedor gosta. “A diretoria não apresentou uma explicação plausível. Agora esse erro precisa ser uma prioridade a ser corrigida”. Outro ponto destacado é que o Nordestão possibilitaria que o Sport enfrentasse equipes de nível técnico superior às do Campeonato Pernambucano. O torcedor pontua ainda a necessidade de unir o futebol regional. “O fortalecimento da Copa do Nordeste é uma das saídas a médio prazo para que os clubes da região consigam reduzir as diferenças econômicas em relação aos times do eixo Sul-Sudeste”.

Eleições democráticas

Outro ponto prioritário para o Democracia Rubro-negra é em relação às eleições do clube. Atualmente o pleito no Sport funciona com eleição direta para presidente, mas caso alguma das partes recorra, cabe ao Conselho Deliberativo (CD) decidir a chapa vencedora. E o CD é eleito juntamente com o presidente, todos da mesma chapa. “Não adianta ser presidente e CD todos de um mesmo grupo. O CD acaba só homologando as decisões. Não há debate”, reclama Rocha. O grupo quer que o CD e o presidente sejam eleitos votações separadas, no mesmo dia. E que o CD não seja 100% de uma chapa, mas composto proporcionalmente ao número de votos conquistados nas urnas. Outro ponto seria criar mecanismos de consulta direta aos sócios, como assembleias gerais.

Gestão profissional e transparente

Uma das bandeiras do movimento de torcedores é a transparência. Eles se queixam que as últimas gestões rubro-negras passaram longe disso. “Não sabemos contratos de atletas, receitas de publicidade, despesas do clube... nada. A direção não é dona do clube. O torcedor, que é quem financia e tanto ama o Sport, é o verdadeiro dono do clube”, diz. O movimento pede um portal da transparência rubro-negra.

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O movimento pede ainda uma gestão profissional. “É moda os grandes clubes falarem de gestão ‘moderna’, e aqui no Sport não é diferente. Mas a maneira que ela se aplica aqui é uma farsa, porque o clube tem o que há de mais arcaico nas gestões, como nepotismo e indicações de pessoas sem qualquer currículo para assumir os cargos”, se queixa João Victor. O Sport tem hoje o Executivo de Futebol remunerado, mas o Democracia Rubro-negra defende que o clube tenha mais trabalhadores pagos para se dedicar totalmente ao futebol do Leão. “Mas que isso não afaste os diretores ‘amadores’. Eles devem continuar, mas que cobrem resultado desses contratados.

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João Victor afirma que apesar de o movimento surgir num ano de eleições no Sport, o objetivo da Democracia Rubro-negra não é integrar alguma das chapas que disputará a direção no mês de dezembro. “Queremos ajudar no debate e no resgate do Sport que aprendemos a amar desde crianças, um clube de massas, não uma entidade fechada, sem transparência e que só atende aos interesses do ‘clubinho’ que está na diretoria”, dispara. O manifesto do Democracia Rubro-negra está no site Petição Pública e, para participar ou se informar sobre as próximas ações do movimento, o e-mail para contato é [email protected].

Edição: Monyse Ravenna