Seletividade

Juízes federais param por auxílio-moradia, mas carregam histórico “antigreve”

Paralisação é vista por outras categorias como uma tentativa de manter privilégios

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Supremo deve julgar até o fim do mês se o Estado mantém ou não o pagamento do benefício
Supremo deve julgar até o fim do mês se o Estado mantém ou não o pagamento do benefício - Divulgação STF

Há duas semanas, a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) anunciou uma greve de um dia em defesa do auxílio-moradia, benefício pago a mais de 17 mil servidores no país. Os valores podem chegar a R$ 4.377,73 por mês. Dos 1,3 mil votantes, 81% foram favoráveis à paralisação das atividades nesta quinta-feira (15).

Segundo nota oficial da Ajufe, “a magistratura é alvo de questionamento e de ataques injustos e levianos, mesmo percebendo o benefício com base na lei e em uma decisão judicial legítima”.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estima que o Brasil gaste cerca de R$ 98 milhões por ano para pagamento do benefício a juízes federais. O valor é considerado indenizatório, por isso não há incidência no Imposto de Renda nem desconto previdenciário.

Polêmica

O auxílio-moradia é pago em respeito a uma decisão liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), desde 2014. A polêmica ganhou novo tempero em fevereiro deste ano, quando o jornal Folha de S. Paulo divulgou que o juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, recebe o benefício integral, embora tenha um imóvel registrado em seu nome na cidade onde trabalha.

O plenário do STF deve julgar no dia 22 de março se o Estado mantém ou não o auxílio-moradia aos magistrados brasileiros.

Isolados

O anúncio da paralisação da Ajufe provocou o repúdio da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF) e do Conselho dos Tribunais de Justiça estaduais.

Esta semana, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação e as entidades afiliadas também criticaram, em nota, a mobilização dos juízes federais pela manutenção do benefício: “Diante da ameaça de greve, (...) as entidades educacionais convidam Vossas Excelências a refletirem sobre a desigualdade social e de renda em nossa sociedade e no serviço público, e como suas remunerações contribuem para esse problema”.

Para entender por que outras entidades sindicais e de classe viraram as costas e não se solidarizam com a greve de 15 de março, o Brasil de Fato recuperou casos emblemáticos em que juízes federais e de tribunais superiores consideraram ilegais as greves de outras categorias de trabalhadores.

Abril de 2004

Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) ordenou o fim da paralisação de policiais federais em São Paulo, sob multa de R$ 60 mil por dia em caso de descumprimento. A decisão liminar do TRF3 repercutiu de forma negativa já que, nos outros 25 estados, o mesmo movimento de greve por melhores condições de trabalho foi considerado legal.

Maio de 2014

Decisão da 3ª Vara Federal de Pernambuco condenou as associações de bombeiros militares, soldados e praças a pagar os recursos gastos com o deslocamento da Força Nacional ao estado, em decorrência da greve da categoria. Durante a paralisação, os trabalhadores exigiam um reajuste salarial. A remuneração dos soldados era equivalente a R$ 2.409.

Junho de 2014

Através de 12 ações judiciais, a Justiça Federal impediu greves de 10 categorias de servidores públicos por melhores condições de trabalho e proibiu manifestações que bloqueassem rodovias em seis estados durante a Copa do Mundo. As multas diárias pelo descumprimento das decisões chegaram a R$ 15,8 milhões. O Sindicato Municipal dos Aeroviários do Rio de Janeiro (Simarj) foi submetido a uma multa de meio milhão por hora de paralisação, para não prejudicar os turistas.

O que diz a lei

O artigo 1º da Lei 7.783, de 1989, assegura o direito de greve, “competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”.

Uma greve só é considerada legal depois que todos os caminhos de negociação com o empregador forem esgotados. O movimento deve ser coletivo, temporário e pacífico, com um aviso prévio de 48 horas após votação em assembleia.

Para empresas que exerçam atividades essenciais, como a prestação de serviços de saúde, abastecimento de água e energia, o prazo é de 72 horas.

Edição: Ednubia Ghisi