ELEIÇÕES

Auditores propõem reforma tributária aos candidatos a presidente

Proposta da “Reforma Tributária Solidária” será apresentada aos presidenciáveis em agosto

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Movimento pela Reforma Tributária Solidária foi lançado durante o 3º Fórum Internacional de Tributação (FIT)
Movimento pela Reforma Tributária Solidária foi lançado durante o 3º Fórum Internacional de Tributação (FIT) - Foto: Divulgação/Anfip

No Brasil, quem ganha mais de R$ 200 mil por mês paga impostos como se ganhasse R$ 60 mil. O dado foi apresentado pelo estudo Reforma Tributária Solidária, organizado por associações de auditores fiscais que tem como objetivo alavancar o debate sobre o sistema de tributos brasileiro nas eleições deste ano.

Lançado durante o 3º Fórum Internacional de Tributação (FIT), que aconteceu entre os dias 4 e 6 de junho, em São Paulo, a publicação de 800 páginas é composta por artigos de mais de 40 pessoas, entre estudiosos, acadêmicos e profissionais, e apresenta um amplo diagnóstico do sistema tributário nacional, apontado como principal causador da desigualdade social no país.

O levantamento resultará em uma proposta de reforma tributária que será entregue diretamente aos presidenciáveis no mês de agosto.

Promovido pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip) e pela Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), a Reforma Tributária Solidária foi feita a partir da análise das 27,5 milhões de declarações de imposto de renda entregues em 2016.

Os organizadores ressaltam que, diferentemente das outras propostas de reforma tributária já existentes, o novo modelo não abrange questões pontuais, mas uma reforma completa do sistema tributário.

O aspecto central da proposta dos auditores fiscais é deslocar os impostos da classe trabalhadora para os mais ricos, sem a criação de novas tributações. 

Desigualdade em números

Aproximadamente 50% da carga tributária brasileira incide sobre o consumo, enquanto o imposto sobre a renda é de 20%, e, sobre o patrimônio, apenas 4%. Charles Alcantara, presidente da Fenafisco, que, ao lado de Martins de Sá Neto, participou de um debate no Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé para divulgar o movimento da Reforma Tributária Solidária na noite desta quinta-feira (7), explica que com essa estrutura de arrecadação, quem recebe menos paga mais impostos.

A restrição do orçamento doméstico é uma implicação de ordem econômica direta da tributação baseada nos impostos indiretos, já que há uma retirada maior de renda das famílias de classe média e baixa, que acontece na compra de qualquer produto.

“Vamos imaginar que o imposto incidente sobre uma compra de R$ 100 no mercado é de R$ 30. Esse valor para quem ganha um salário mínimo tem peso, mas R$ 30 para quem ganha R$ 50 mil tem outro peso”, exemplifica Alcantara. “Quando a tributação pesa muito no consumo, ela proporcionalmente sacrifica muito mais as baixas rendas”, complementa.

O jornalista Altamiro Borges, Floriano Martins de Sá Neto (Anfip) e Charles Alcantara (Fenafisco) participaram de debate sobre a Reforma Tributária Solidária nesta quinta-feira (7). Foto: Barão de Itararé 

O representante da Fenafisco declara que a elite brasileira fez uma opção estratégica ao direcionar uma maior tributação indireta sobre o consumo, já que os “impostos se tornam invisíveis”. 

As diferenças entre o sistema brasileiro e os de outros países é grande. De acordo com informações apresentadas pelo estudo, nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a tributação sobre o consumo é de 32%, enquanto sobre renda e patrimônio é de 34%.

Floriano Martins de Sá Neto, presidente da Anfip, avalia que o país tem um dos sistemas tributários mais perversos e injustos do mundo, e justamente por isso propostas que fazem “remendos” no modelo atual de tributação não são suficientes.

“Esse modelo precisa de uma reforma estruturante. Entendemos que precisa ser um modelo de um país desenvolvido e não de um país atrasado no qual aqueles que estão no andar de cima se acostumaram a não pagar impostos, transferindo toda a carga necessária para o financiamento do Estado para os trabalhadores e pequenos empresários”, afirma o auditor fiscal.

Injustiça 

Segundo dados da Receita Federal de 2016, ano em que o salário mínimo era de R$ 880, cerca de 80 mil declarantes brasileiros ganham mais de 160 salários mínimos por mês, mais do que R$ 140 mil. Se essa camada de renda não fosse isenta de impostos via declaração de lucros e dividendos, seriam, no mínimo, R$ 80 bilhões a mais para cofres públicos, aponta Charles Alcantara.

Já quem ganha mais de 240 salários mínimos por mês (mais de R$ 200 mil), tem 70% de seus impostos isentos, com uma alíquota efetiva que não ultrapassa os 6%. Para fazer uma comparação, os auditores citam o exemplo de um indivíduo de classe média alta, que, por ganhar R$ 30 mil por mês, paga uma alíquota efetiva entre 12% e 14%, sendo que essa realidade já é muito distante da maioria dos brasileiros.

Alcantara ainda relata que cerca de 20 mil brasileiros ganham mais de 320 salários mínimos mensais, valor maior do que R$ 281 mil, e pagam alíquota efetiva de no máximo 2%. 

“A política neoliberal quer fechar a conta tirando direito e reduzindo o Estado, não é ampliando e cobrando de quem não paga. Por isso que a reforma da Previdência era tão fundamental para o Temer”, analisa o presidente da Fenafisco.

Apenas 21% da receita de tributos vem da taxação sobre a renda no Brasil, um percentual muito inferior à média da OCDE, de 34%. Nos Estados Unidos, por exemplo, esse tributo em específico equivale a 49% do total. 

Segundo os auditores, o Imposto sobre Grandes Fortunas também é um aspecto essencial para uma reforma justa. A taxação de patrimônios acima de R$ 1 milhão poderia render um valor equivalente a R$ 100 bilhões aos cofres públicos.

Propostas

A Anfip e a Fenafisco lançaram um manifesto para visibilizar o “Movimento Reforma Tributária Solidária, Menos Desigualdade, Mais Brasil” e adiantou oito pontos principais que nortearam a proposta final da reforma.

São eles: Adequação do sistema brasileiro a modelos de sucesso de outros países, financiamento do gasto social, um sistema tributário progressivo, redução da carga tributária indireta, revisão do sistema de partilha dos impactos entre os estados, ampliação da tributação ambiental, o resgate do papel da tributação aduaneira e o fomento de ações para o aumento das receitas, sem o aumento da carga tributária.

Ao longo do Fórum Internacional de Tributação (FIT), os propositores da Reforma Tributária Solidária já iniciaram contato com todos os presidenciáveis, sem exceção, para apresentar alguns aspectos do estudo.

Ainda não há data para a entrega oficial da proposta, que será realizada em agosto, quando as campanhas irão começar oficialmente.

Edição: Diego Sartorato