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Repórter SUS | Como o desmonte do SUS pode interferir na sua vida?

O programa de saúde da família está relacionada à universalidade e integralidade do atendimento

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O programa de saúde da família surge em meados dos anos 90 e foi o primeiro contato de grande parte da população com o SUS.
O programa de saúde da família surge em meados dos anos 90 e foi o primeiro contato de grande parte da população com o SUS. - (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
O programa de saúde da família está relacionada à universalidade e integralidade do atendimento

O Sistema Único de Saúde (SUS) está fazendo 30 anos. Por conta disso, o Brasil de Fato inicia uma série sobre a falta que o SUS pode fazer. O que tem no SUS? Como funciona? A psicóloga e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Camila Borges, fala sobre a estratégia de saúde da família. 

O QUE É O SAÚDE DA FAMÍLIA? 
A estratégia de saúde da família é uma criação do SUS e está diretamente relacionada àquilo que é uma inovação do Sistema Único de Saúde. Eu diria que o que há de inovação, de revolucionário são principalmente dois de seus princípios: a universalidade e a integralidade. O programa de saúde da família surge em meados dos anos 90 e foi o primeiro contato de uma grande parte da população com o SUS. Na verdade, às vezes foi o primeiro contato com qualquer serviço de saúde. 

POR QUE O PROGRAMA É IMPORTANTE?

Quando o programa trabalha com a ideia de primeiro contato, de vínculo, de porta de entrada, de continuidade do tratamento, significa que a estratégia de saúde da família tem a responsabilidade sobre um conjunto de pessoas e sobre todo o processo de saúde e doença. E isso deu muito certo. 

Atualmente contamos com um modelo que acompanha esses quadros mais típicos, isso que sempre foi feito em questão de saúde pública, o clássico: mortalidade infantil, pré-natal, neonatal. Ela amplia o conjunto populacional que vira prioridade, por exemplo, inserindo a saúde do idoso. Permanece tendo o olhar clássico da saúde pública sobre alguns problemas clássicos: pensar na tuberculose, diabetes, DSTs, mas ela dá conta daquilo que sempre escapou a esses programas, que a gente pode classificar como atendimento à demandas espontâneas e pequenas emergências. Então, a criança caiu jogando futebol e abriu o lábio. Ela vai na saúde da família e tem alguém lá que vai suturar. Isso é o tipo de coisa que não cabia na ideia de atenção primária antes e isso cabe na saúde da família. 

ACOMPANHAMENTO

Em algumas regiões onde a estratégia de saúde da família está há alguns anos, você tem histórias de uma equipe que acompanha o nascimento da criança, todo seu desenvolvimento, a adolescência, aqueles adolescentes vão virar adultos, vão ser pais e mães e estão acompanhados por aquela equipe de saúde da família.

Isso gera segurança e estabilidade na construção de uma ideia de autocuidado, de uma perspectiva com saúde à longo prazo. Nesse contexto, que aponta para a fragilização da estratégia de saúde família, em linhas gerais, o que a gente pode dizer é que a população vai perder aquilo que eu chamei de revolucionário no início: que é a universalidade e a integralidade. 

QUAL O PREÇO DO DESMONTE?

É possível que nesse desmonte de estratégia de saúde da família o SUS passe a oferecer não um serviço integral, mas um serviço simplificado. Essa desassistência no fim das contas pode significar a criação de um mercado para o que tem sido anunciado como um plano de saúde barato. Para um serviço privado funcionar bem, ele tem que ser lucrativo. E pra ele ser lucrativo, ele não vai trabalhar em cima de demandas que sejam complexas. 

Agora, num cenário mais pessimista, onde a estratégia de saúde da família não funcionar bem ou for fechada, você vai ter populações, que antes tinham acesso a isso, tendo acesso a nada. Porque uma parte do país também não tem nem o serviço privado chegando. A gente está caminhando para um cenário de desassistência que nunca foi visto desse a criação do SUS.

Desde a criação a gente tem ampliado o acesso. Com problemas, com algumas dificuldades, com muita necessidade de melhoria, mas o acesso foi ampliado concretamente. Esse cenário atual aponta para a redução do acesso. Isso significa rasgar a Constituição. 

*O quadro Repórter SUS é uma parceria entre a Radioagência Brasil de Fato e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz)

Edição: Brasil de Fato