Paraná

Julho das pretas

Artigo | Não sou um corpo de luta

"Das minhas heroínas herdei a ginga e o passo. Estar atenta ao movimento na roda. Enquanto bailo, me expresso"

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Brenda Santos é produtora cultural e criativa, entre outras coisas, do Um Baile Bom em Curitiba.
Brenda Santos é produtora cultural e criativa, entre outras coisas, do Um Baile Bom em Curitiba. - Miriane Figueira

No dia 25 de julho, celebra-se o Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha. Firmado em 1992, no I Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas (República Dominicana), o marco dá visibilidade à atuação das mulheres negras diante das suas diversas pautas. 

No Brasil, a mesma data traz a referência de Tereza de Benguela, que coordena a resistência do Quilombo de Quariterêque, o maior quilombo do Mato Grosso, às ações de bandeirantes do século 18. Impossível negar que as desigualdades e violências sofridas por mulheres negras nos campos de gênero, raça, classe e origem, são fruto de 400 anos de regime escravocrata. Meus espelhos são minhas ancestrais, irmãs de caminhada e suas conquistas. Quando as ouço, as leio, as observo, as escuto em mim. Elas sabem avançar e recuar. Sabem se unir e sabem se soltar. Aprendi que devo ser resiliente e, com o tempo, comecei a negar o termo LUTA. 

Seu peso me exige estado de alerta constante, a olhar a minha volta como campo minado. Não me permite espaço ou tempo para ser frágil, sentir medo ou cansaço. E na vida, para além dos discursos, sentimos tudo isso. A medida que me cobro, cobro uma irmã na mesma proporção. O que é a nossa essência, enquanto mulheres negras, para além do corpo de luta? Das minhas heroínas herdei a ginga e o passo. Estar atenta ao movimento na roda. Enquanto bailo, me expresso. Fico atenta aos passos de quem oprime e furta minha liberdade. Vejo os melhores caminhos e posso me retirar caso me sinta cansada. Avanço e me defendo conforme tenho dimensão de quem sou, onde estou e com quem posso contar. Na roda da vida, peço a bença, misturo guerra e dança. Trago junto quem me dá a mão. É a ação que atira, a criatividade que toca, o afeto que une e cura. 

 

Brenda Santos é Produtora Cultural e Criativa. 

Edição: Redação