Racismo religioso

SP: Marcha denuncia tentativa de criminalizar cultos de matriz africana

Milhares de pessoas se concentraram em frente ao MASP, em São Paulo, contra recurso que tenta proibir abate no RS

Brasil de Fato| São Paulo (SP) |

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Cerca de 5 mil manifestantes ocuparam duas faixas da Avenida Paulista
Cerca de 5 mil manifestantes ocuparam duas faixas da Avenida Paulista - Juliana Gonçalves

Cerca de 5 mil pessoas se concentraram, na noite da última quarta-feira (8), em frente ao Museu de Arte de São Paulo (MASP), na capital paulista, para denunciar a tentativa de criminalização do abate de animais dentro de cultos religiosos.

Batizada de "Marcha a Favor da Liberdade Religiosa e Contra o Recurso 494601", a mobilização foi organizada por movimentos religiosos de matriz africana e comunidades tradicionais de terreiro.

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O recurso julgado nesta quinta-feira (9) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pode proibir a prática o abate religioso nas casas de Candomblé, Umbanda e Jurema Sagrada no Rio Grande do Sul. Porém, os manifestantes entendem que o recurso pode ser replicado em outros estados e foram às ruas em repúdio ao julgamento do recurso.

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Marcha contou com muitos praticantes das religiões. Imagem: Rafael Beserra Fatobi

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Sobre a marcha, Roger Cipó, fotógrafo e ogã (cargo masculino no candomblé, aquele que toca tambor e auxilia nos rituais de abate) acredita que foi um dos atos públicos mais importantes para os povos de terreiros. Nunca diante de um ataque tão direto às nossas práticas, o povo de terreiro se mobilizou dessa forma e ocupou às ruas.

Para ele, que foi um dos organizadores, o candomblé desde sempre pensa a alimentação como um momento sagrado. Impedir esse direito seria um crime. A gente está falando de um crime contra a humanidade em relação aos povos de terreiros por ser uma tradição negra e isso caracteriza em racismo religioso.  

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A opinião de Cipó é dividida pela intelectual e artista Erica Malunguinho, fundadora da Aparelha Luzia. "Vendo essa perseguição que está acontecendo pela lei do abate é nítido que essa perseguição tem um fundo racial. A vida dos animais não está ameaçada por conta do candomblé."

Durante a concentração no vão do MASP, os religiosos entoaram cantos aos orixás. Imagem: Rafael Beserra Fatobi

Malunguinho cita o fato das indústrias alimentícias não serem questionadas com o mesmo rigor que as religiões de matriz africana, mesmo o abate ocorrendo em momento sagrado.

Presente a marcha, a sacerdotisa Marisa de Oyá do terreiro Ilê Asé Oyá Mesan Orun, fala sobre a comida dentro do candomblé. A nossa comida, a nossa sacralização não ofende a ninguém. É feita dentro dos nossos terreiros e comungado com o nosso povo. Parem de nos marginalizar.  

Para a sacerdotisa, a tentativa de criminalizar o abate religioso serve para marginalizar ainda mais as comunidades de terreiro. 

Ialorixá Marisa de Oyá ao final da marcha. Foto: Juliana Gonçalves

Já Pai Rodney de Oxóssi, sacerdote do Ilê Obá ketu Axé Omi Nlá entende o recurso como uma violação grave da constituição. Violar os direitos dos afro-religiosos é violar uma garantia constitucional que é o direito à liberdade de crença, expressão e de culto, não podemos permitir que todas as nossas liberdades corram risco.  

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Para Mãe Vera de Oxum, esse ataque é também uma questão de respeito. A gente só quer ser respeitado, só isso. A gente não quer mais nada. Respeite a minha religião, assim como respeito todas as outras religiões. 

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Assim como em São Paulo, houve marchas em Salvador, Londrina, Rio de Janeiro e outras capitais.

Edição: Tayguara Ribeiro