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Literatura de Cordel: tradição oral vira Patrimônio Cultural Imaterial

Título concedido pelo Iphan reconhece importância de uma das mais genuínas manifestações culturais do Brasil

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A cordelista apaixonada pela literatura de Cordel, Izabel Nascimento, exibe alguns "folhetos" de cordel
A cordelista apaixonada pela literatura de Cordel, Izabel Nascimento, exibe alguns "folhetos" de cordel - Fotografare Due Click Per Te
Título concedido pelo Iphan reconhece importância de uma das mais genuínas manifestações culturais do Brasil

"Poeta, cantor da rua, que na cidade nasceu, cante a cidade que é sua, que eu canto o sertão que é meu. Se aí você teve estudo, aqui Deus me ensinou tudo sem de livro precisar, por favor não mexa aqui, que eu também não mexo aí. Cante lá,que eu canto cá" . Assim como Patativa do Assaré, Ariano Suassuna, Apolônio Alves dos Santos, Moreira de Acopiara e Maria das Neves Batista Pimentel são alguns dos baluartes da literatura de cordel.

Versadores de temas que vão do cotidiano aos dissabores de questões políticas e de desigualdade social. Os cordelistas contam em versos muita da nossa identidade brasileira e agora ganharam mais um motivo para divulgar e perpetuar esse estilo. O cordel agora é Patrimônio Cultural Imaterial.

O título, dado em setembro de 2018 pelo Iphan, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional veio depois de mais de dez anos de investidas da Academia Brasileira de Literatura de Cordel.

O presidente da entidade, cordelista da cidade de Ipu, no Ceará, Gonçalo Ferreira, comenta com alegria sobre a importante conquista e ressalta o compromisso da Academia Brasileira de Literatura de Cordel em manter há 30 anos o cordel vivo e livre de preconceitos, que tentam limitá-lo e designá-lo como “arte menor”.

"É um movimento cultural essencialmente brasileiro e nordestino. Agora a nível de cultura superior é universal a ressonância da literatura de cordel e a grandeza como a de Homero, a Roma de Virgílio, a Espanha de Cervantes, a Portugal de Camões, de onde nasceram as redondilhas, que no Brasil evoluíram para sextilhas, oitavas mourão, padrão, galope a beira mar, martelo agalopado, que é o estilo mais pomposo da literatura de cordel", diz Gonçalo. 

Chamada de “pliegos sueltos”, na Espanha e “folhas soltas” ou “volantes”, em Portugal, a literatura de cordel veio com os colonizadores portugueses e ancorou em Salvador. Depois foi se disseminando, ganhando maior popularidade no nordeste brasileiro e conquistando corações de ouvintes e cordelistas. Um destes corações conquistados pela literatura de cordel é o da da escritora sergipana Izabel Nascimento. Ela escreveu seu primeiro folheto aos 13 anos de idade e mantém viva a tradição desse estilo como presidenta da Academia Sergipana de Literatura de Cordel.

"Porque hoje o cordel é um bem nacional, ele é uma riqueza da nossa nação. Então o Estado assume o cordel com o dever de proteger e salvaguardar o cordel e divulgar também. Não somente o Estado, mas o cordelista precisa fazer uma reflexão do que é o cordel para sua história, do que as pessoas que estão agora, que não sabem o que é o cordel, o que elas precisam saber? Quais são as histórias mais importantes que a gente conta através do cordel?", afirma Izabel. 

A presidenta da Academia Sergipana de Cordel fala sobre as conquistas acumuladas em um ano da Instituição, desde o dia de sua fundação, em 19 de julho de 2017. A primeira delas é a publicação de uma Antologia feita somente por mulheres cordelistas. Intitulado "Das Neves às Nuvens", o trabalho é uma homenagem à primeira cordelista que se tem notícia, Maria das Neves Batista Pimentel, e de acordo com Izabel reúne histórias de 17 cordelistas sergipanas.

"Há exatos 80 anos, em 1938, ela fez a primeira publicação, de um folheto de sua autoria, no entanto ela não pode, pelas questões da época, ela não pode assinar o nome. As mulheres eram terminantemente proibidas, cerceadas deste universo do cordel. Então ela assinou como Altino Alagoano, que era o nome de seus esposo. Isso pra nós foi um debate muito importante que nós fizemos na época da publicação desse livro", fala Nascimento. 

A segunda, e não menos importante conquista, é o lançamento da Rádio Cordel, uma rádio web encabeçada por Izabel Nascimento e pelo técnico de som Agnaldo Silva, que dissemina a cultura de cordel e divulga trabalhos de novos e antigos cordelistas.

"Olá amigos e amigas ouvintes da Rádio Cordel Sergipe. Eu sou Isabel Nascimento, cordelista sergipana e estou como presidenta da Academia Sergipana de Cordel. Através da Rádio Cordel Sergipe, nas comemorações de um ano de fundação, divulgaremos toda programação do cordel não só no nosso estado, mas onde estiver a poesia, a música, a arte, que enaltece a nossa alma. Eu quero saudar a todos e todas, que seja muito bem-vindos, muito bem-vindas, aproveitem, apreciem e contribuam com a programação da nossa Rádio Cordel Sergipe" narra Izabel. 

 

“O fino trato da literatura de cordel no Estado encontrou um aliado.

E vai assim trilhando um caminho mais iluminado.

Com resistência nordestina, brasileira e de todos que amam o legado,

de um povo humilde, mas sempre arretado.”

Edição: Camila Salmazio