Rio de Janeiro

Resistência

Mestre Moa do Katendê é homenageado por capoeiristas no Rio

Assassinato do Mestre de Capoeira é relembrado por manifestantes como um reflexo do discurso bolsonarista

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Mesmo com o tempo instável no Rio, os participantes realizaram o ato em homenagem à memória de Mestre Moa
Mesmo com o tempo instável no Rio, os participantes realizaram o ato em homenagem à memória de Mestre Moa - Brasil de Fato/RJ

O assassinato do Mestre de Capoeira Moa do Katendê na cidade de Salvador (BA) marcou o processo eleitoral mais polarizado desde a redemocratização do país. Por esse motivo, o Coletivo de Angoleiras do Rio e o Grupos de Capoeira Angola do estado organizaram um Ato-Roda em homenagem ao Mestre Moa na última quarta-feira (24). Várias pessoas se reuniram durante a tarde, no Largo da Carioca, para a concentração do evento. Vestidos de branco, os participantes se abrigaram do tempo instável no Rio na calçada do conhecido Edifício Central.

Antes da Roda, um espaço de falas explicou o contexto daquele momento. Diversos grupos e representantes de Capoeira se juntaram ao ato. O Maracatu Baques do Pina também fez uma apresentação. Mestre Manoel, do Grupo de Capoeira Angola Ypiranga de Pastinha Rio de Janeiro Brasil, que realiza um trabalho na Favela da Maré, no Rio, pratica a arte há 47 anos. Ele destaca que a Capoeira é marcada pela luta e libertação desde o seu surgimento.

"A Capoeira Angola foi a que me abraçou no sentido de conhecer minhas raízes enquanto afrodescendente, como negro que tem uma raiz que não está plantada aqui no Brasil, está na África. Isso dá uma força a ponto de saber que você não é qualquer um na sociedade", destacou.

O Mestre também contextualizou a importância política da roda de Capoeira realizada pelo seu grupo nos dias de hoje.

"Desde 1992 acontece uma roda política na Cinelândia toda última sexta-feira do mês com a galera da Maré. Não é só uma roda de Capoeira Angola, também é pra dizer ao povo tudo isso que tá acontecendo na favela, esse genocídio que não é de hoje, o preconceito. Nosso papel enquanto militante é um trabalho de resistência cultural. Mestre Moa é um guerreiro como nós, usando a cultura para realmente conscientizar e educar", explicou o Mestre. 

O Ato-Roda foi também um espaço  para firmar a posição dos capoeiristas do Rio em defesa da democracia. Mônica Ávila é professora e conhecida como Bombom no mundo da Capoeira. Ela destacou os riscos existentes no discurso de Jair Bolsonaro (PSL). 

"Estamos vendo um avanço do fascismo nunca visto. Um candidato falar as coisas que Bolsonaro fala sem receber nenhuma repreensão, ele já fala até em metralhar e prender os adversários. O que eu sinto é que essa resistência é pra salvar o país. Foi esse fascismo que matou o Mestre Moa, o racismo, a misoginia", declarou a professora que antes do ato estava no centro da cidade conversando com as pessoas confusas sobre o quadro político no segundo turno.

Capoeira e repressão

O grande histórico de luta e resistência do povo negro contra a escravidão é lembrado pela Mestra Cristina, do Grupo de Capoeira Angola Mocambo de Aruanda. Ela ressaltou que o assassinato do Mestre Moa do Katendê neste momento está relacionado com o avanço dos discursos de ódio propagados pelo candidato Jair Bolsonaro.

"Apesar de toda tentativa de aniquilar a nossa cultura e as nossas únicas referências, a Capoeira hoje se multiplicou e está no mundo inteiro. A morte de Mestre Moa, que foi um ataque à Capoeira, é muito simbólico. Mostra bem a possível volta de toda essa repressão, inclusive às nossas manifestações culturais. Cada mestre guarda a sabedoria dos tempos, quando o Mestre é silenciado é como se tivesse silenciado a todos nós", alertou. 

Segundo ela, as propostas de Bolsonaro deixam explícitas as intenções de aumentar a repressão contra a população negra nas favelas e também em outros espaços. 

"A Capoeira já nasceu com essa missão: de libertar o povo. Ao longo da história em vários momentos a Capoeira já foi proibida, inclusive no Código Penal. Sofreu sanções por simplesmente realizar a sua arte e sua luta. Eram presos, espancados, isso era uma situação recorrente na Capoeira ao longo da nossa história", ressaltou.

Mestra Cristina conta ainda que houve uma tentativa de realizar a manifestação na entrada da estação do metrô da Carioca, mas rapidamente os seguranças pediram para que os capoeiristas se retirassem. 

"Realmente foi uma repressão ao ato porque viram que era uma roda de Capoeira com propósito de denunciar o que está acontecendo, e dizer que a pessoa que assassinou o Mestre Moa foi apenas um veículo porque o grande responsável é o Jair Bolsonaro que fica propagando ódio dentro da população brasileira", finalizou a Mestra.

Edição: Jaqueline Deister