Política

Bancada evangélica quer aprofundar terceirização em empresas e serviços públicos

Medida pode piorar a qualidade dos serviços prestados aos brasileiros e está sintonizada com recente decreto de Temer

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Frente Parlamentar Evangélica no lançamento do manifesto “O Brasil para os Brasileiros”
Frente Parlamentar Evangélica no lançamento do manifesto “O Brasil para os Brasileiros” - Valter Campanato/Agência Brasil

Os deputados da Frente Parlamentar Evangélica, uma das principais bancadas de apoio de Jair Bolsonaro (PSL), divulgaram um manifesto no qual propõem intensificar a terceirização da mão de obra em empresas públicas.

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A bancada tende a aumentar no próximo ano, contando com 84 deputados e sete senadores eleitos, de acordo com levantamento preliminar do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). O manifesto tem propostas divididas em eixos como “modernização do Estado", “segurança jurídica”, “segurança fiscal” e “revolução na educação”.

Flávio Batista, professor de direito do trabalho e seguridade social da Universidade de São Paulo (USP), ressalta que a proposta da bancada evangélica em relação à terceirização da mão de obra em empresas públicas já foi formalmente autorizada pelo governo de Michel Temer (MDB) no decreto  Nº 9.507, assinado em 21 de setembro deste ano. “Querem intensificar o uso dessa estrutura que já foi criada pelo Temer”, afirma.

No manifesto, divulgado em 24 de outubro, os parlamentares sugerem que “a utilização de mão de obra terceirizada no âmbito do serviço público deve ser potencializada, devendo ser amplamente utilizada em todas as atividades que não sejam tipicamente estatais e que não requeiram o uso do poder de polícia administrativa”. 

Batista aponta que com isso a tendência é que apenas representantes de poderes do Estado, como juízes e promotores, sejam selecionados por concursos públicos, enquanto atividades de prestação de serviço podem ser terceirizadas. "Por exemplo, um médico do SUS, não seria uma atividade típica do estado, e poderia ser terceirizado. Isso é terrível porque subverte todos os princípios constitucionais do direitos administrativos. Deixa de aplicar isonomia, moralidade administrativa, transparência, na seleção dos trabalhadores que estão a serviço do Estado. E traz para o Estado uma lógica de gestão privada”, afirma.

A socióloga do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômico (Dieese) Adriana Marcolino avalia que há interesse econômico por parte dos setores evangélicos. “Me assusta quando leio material da bancada evangélica porque eles tem interesse na privatização do Estado. Em várias cidades essas igrejas montam Organizações Sociais e acabam conquistando a gestão de serviços públicos, como hospitais e creches", ressalta.

Pior qualidade do serviço

O professor da USP diferencia que o objetivo do setor público, ao contrário do privado, não é gerar lucro. “O princípio da eficiência administrativa pela Constituição não significa gastar a menor quantidade de dinheiro possível, mas prestar o melhor serviço público possível. Jamais vamos obter isso substituindo a lógica do concurso público pela lógica da terceirização”, diz Batista. 

Adriana Marcolino concorda que a tendência é que o serviço das empresas públicas piore com a terceirização. “Sabemos que a terceirização é rentável porque tem condições piores de trabalho para quem é contratado. Quando os trabalhadores têm pior condição, o resultado desse trabalho acaba sendo pior”, conclui.

Apesar de ser cedo para sistematizar dados que apontem os impactos do decreto assinado por Temer, estudo publicado pelo Dieese aponta que, de modo geral, terceirizados trabalham 7,5% a mais e sua remuneração é, em média, 24,7% mais baixa.

Outro aspecto que a socióloga ressalta é a tendência que a terceirização nas empresas públicas aprofunde situações de nepotismo, clientelismo e corrupção. “Quem são os funcionários, quanto os funcionários recebem de salário, como é a prestação desse serviço. Questões como essas ficam mais difíceis de ter resposta, por se tratar de empresa privada”.

Marcolino lembra de um relatório do Tribunal de Contas que analisa as empresas que prestam serviço privado na saúde do estado de São Paulo. “Tem gestor com salário maior que R$ 60 mil, enquanto os trabalhadores têm condições piores de trabalho”, resume.

Edição: Brasil de Fato