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Maria Rita Kehl: Comissão da Verdade veio muito tarde, após esquecimento da história

"Quem não estava muito envolvido na ditadura sentiu que ficou tudo bem depois"

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Maria Rita Kehl fala sobre a Comissão da Verdade na Rádio Brasil de Fato
Maria Rita Kehl fala sobre a Comissão da Verdade na Rádio Brasil de Fato - Marcelo Cruz
"Quem não estava muito envolvido na ditadura sentiu que ficou tudo bem depois"

Na penúltima edição do programa No Jardim da Política de 2018, o estúdio da Rádio Brasil de Fato contou com a presença da psicanalista, jornalista e escritora Maria Rita Kehl, que compôs a Comissão Nacional da Verdade. A entrevista acontece no mês em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 70 anos

O bate papo começou com uma análise dos últimos anos de política no Brasil e o evidente retrocesso dos direitos humanos com a ascensão da direita ao poder. Kehl comentou os efeitos na sociedade gerados pela campanha eleitoral de Jair Bolsonaro (PSL), pautada no ódio às minorias sociais e ataques ao oponente Fernando Haddad. “Trabalhar com preconceitos é uma aposta covarde, mas é uma aposta com chance de ganhar. Porque se há um clima de valores que vão na contramão dos preconceitos, as pessoas são coagidas a não exercer seus preconceitos socialmente. Então, trabalhar valorizando os preconceitos tem muita chance de dar certo, é como se fosse tirada uma tampa e muita coisa reprimida vem à tona”, analisa.

A entrevistada também contou como foi seu trabalho na Comissão Nacional da Verdade, instituída pela presidenta Dilma Rousseff em 2012 para investigar as graves violações de direitos humanos cometidas no período da ditadura por agentes do Estado. Para ela, a Comissão da Verdade no Brasil ocorreu tarde. Kehl ainda relembra o caso dos vizinhos Uruguai, Chile e Argentina, onde as comissões foram feitas, e violadores presos depois que a ditadura acabou.

Para ela, a anistia foi para os dois lados, com a soltura dos presos políticos, mas com a ineficiência de punição dos violadores. “Quem não estava muito envolvido na ditadura sentiu que ficou tudo bem depois, que os dois lados se perdoaram. Quando o assunto ressurge durante a Comissão da Verdade, as pessoas chegavam na gente e questionavam se não íamos ver ‘o outro lado, o lado dos terroristas’. Não viram a gente com bons olhos”. 

Kehl analisa que o incômodo gerado em muita gente por se trazer à tona essa triste parte da história brasileira pode vir de uma negação. Para a psicanalista, grande parte da sociedade não sabia das atrocidades que aconteciam no período. Neste sentido, o acesso ao conteúdo faz as pessoas buscarem justificativas e culpabilizar as vítimas, achando que eram terroristas, por exemplo. 

A entrevistada também elogiou o ex-presidente Lula pela forma como lidou com toda a sociedade quando chegou à Presidência. “Quando o Lula finalmente teve condições de ser eleito, como bom negociador sindicalista, ele teve que acomodar. Ele é um idealista, mas não um idealista que não leva em consideração os fatos, então ele negociou. Lula percebeu que era melhor negociar do que bater de frente”, opinou. 

No final da conversa, Kehl ressaltou a importância da reflexão para além da informação. Para a entrevistada, vivemos em uma sociedade com muita informação, porém, sem a discussão crítica e discussão das ideias, primordiais para uma sociedade mais justa. 

Além da escritora, a edição também trouxe uma entrevista com Dona Jacira, artista plástica e mãe dos rappers Emicida e Fióti. Ela está lançando o primeiro de três livros que contam sua trajetória, intitulado "Café", pela editora LiteraRUA e contou um pouco sobre ele. 

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Edição: Mauro Ramos