terceiro setor

"MP mira ONGs que atuam em defesa de direitos humanos”, diz diretor da Abong

Mauri Cruz lembra que a constituição garantir a autonomia de associações e movimentos da sociedade civil

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Mauri Cruz, integrante da diretoria executiva da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais
Mauri Cruz, integrante da diretoria executiva da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais - Arquivo pessoal

Uma das novidades trazidas pela Medida Provisória (MP) 870 de 2019, que regulamenta a reforma administrativa do governo Bolsonaro, está sendo contestada por organizações não governamentais brasileiras.

A MP elenca entre as competências da Secretaria de Governo, ministério ligado à Presidência, a de “supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as atividades e as ações dos organismos internacionais e das organizações não governamentais (ONG) no território nacional”.

A redação é inédita em relação ao órgão, tradicionalmente visto como espaço de articulação e diálogo entre Executivo e sociedade civil. Atualmente, a pasta é ocupada pelo general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz.

Mauri Cruz, integrante da diretoria executiva da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), destaca que o termo “ONG” não é juridicamente preciso, já que a legislação prévia fala em organizações da sociedade civil. De qualquer forma, entende que a MP mira organizações específicas: as que atuam em defesa de direitos humanos, de indígenas, mulheres e outros grupos alvos do discurso de Bolsonaro.

Cruz entende que a redação é ilegal, e afirma que a Abong busca medidas para reverter o disposto na MP. “O artigo 5º [da Constituição] garante a autonomia da sociedade civil e das associações, fundações, movimentos. O texto constitucional veda a intervenção estatal. Primeiro, interpelar administrativamente o governo para que corrija e, depois, em relação ao Congresso, e, se necessário, até o Supremo”, diz.

Os incisos 12 e 13 do referido artigo dizem que “é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar” e que “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento”, respectivamente.

Um dos pontos que o governo Bolsonaro, e sua candidatura, pautou foi a de que diversas ONGs recebem recursos públicos e, portanto, deveriam ser fiscalizadas. Dados do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) apontam, no entanto, que 70% das organizações da sociedade civil atuam sem qualquer financiamento do Estado brasileiro.

Nilo D’Ávila, diretor de campanhas do Greenpeace, explica que já há uma série de regras que regulam a prestação de contas de ONGs que atuam em parcerias e convênios com entidades públicas, e, que neste sentido, a MP é despropositada,  concordando que o dispositivo fere a Constituição Federal.

“Não faz o menor sentido. Foi aprovado o marco regulatório da sociedade civil. Há diretrizes, auditorias necessárias, está tudo escrito. A função da MP é ameaçar”, critica.

O Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) existe desde 2014, tendo sido parcialmente alterado em 2015, passou a ser aplicado em todas as esferas administrativas desde 2017.  


 

Edição: Katarine Flor