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Guia de Expressões do Imperialismo

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'Comunidade Internacional', 1911.
'Comunidade Internacional', 1911. - Fotografia: General americano William Mitchell
Quais são as palavras-chave dos poderosos?

Por Vijay Prashad*

A "comunidade internacional", dizem eles, está unida em relação à Venezuela. Mas quem é essa "comunidade internacional"? Na última contagem, a maioria dos Estados membros das Nações Unidas - incluindo os dois países com as maiores populações (China e Índia) - se opôs à agenda de mudança de regime liderada pelos EUA para a Venezuela. No entanto, o termo "comunidade internacional" é rotineiramente utilizado para definir a realidade, para impossibilitar que se tenha uma visão contrária dos fatos. Se a "comunidade internacional" diz que o governo líbio ou venezuelano está conduzindo um genocídio, ninguém deve questionar esse julgamento. Resta apenas discutir o que fazer com a situação. As sanções devem ser ampliadas? Deve-se permitir um bombardeio? As Nações Unidas precisam santificar o ataque? Deveria a doutrina "Responsabilidade em Proteger" (R2P), da ONU, ser usada como justificativa?
O uso causal da expressão "comunidade internacional" nos levou a pensar: existem outras expressões como essa que são usadas para moldar a forma como as coisas são vistas? Quais são as palavras-chave dos poderosos? Nossa equipe apontou várias expressões desse tipo, e essa lista se tornará - eventualmente – um amplo Guia de Expressões do Imperialismo. Por enquanto, veja uma amostra do nosso Guia.
Comunidade Internacional (substantivo). Um grupo de líderes mundiais poderosos que podem fazer o que querem, independentemente da lei internacional. As Nações Unidas têm 193 estados membros, do Afeganistão ao Zimbábue. Se quatro países (digamos, Serra Leoa, Cingapura, Eslováquia e Eslovênia) realizarem uma coletiva de imprensa, nenhuma agência de comunicação vai relatar isso como uma reunião da "comunidade internacional". Para isso, seria preciso ter a presença dos Estados Unidos, o Reino Unido, a União Europeia e o Canadá. Ninguém mais é convidado para esse clube dos herdeiros dos senhores coloniais, armados com um velho cutelo pronto para atingir coração de um país colonizado.

'Ditadura', 2018

Ditadura (substantivo). Um país cujo líder foi selecionado pela "comunidade internacional" como ditador. Depois que a URSS entrou em colapso, os EUA e seus aliados buscaram novas maneiras de definir seus inimigos. O termo "comunista" havia perdido sua atualidade. Os novos termos eram "Estado vilão", "estado terrorista" e "ditadura". O Departamento de Estado dos EUA apressadamente pintou velhos amigos como adversários (Manuel Noriega, do Panamá, e Saddam Hussein, do Iraque). O que define um país como um "Estado vilão" ou seu líder como "ditador"? Não os fatos, pois isso levaria a alguns resultados desagradáveis - os Estados Unidos, que conduziram guerras ilegais (como na América Central na década de 1980 ou na Ásia Ocidental nos anos 2000), não deveriam ser incluídos? O fazer com a Arábia Saudita ou a Guiné Equatorial? Se um Estado é complacente com a ordem mundial liderada pelos EUA, então não é um Estado vilão nem seu líder é um ditador. Esses termos só são úteis quando a "comunidade internacional" quer derrubar um governo e colocar um fantoche em seu lugar.

'Sociedade Civil' - Abdel Hadi El-Gazzar, Mahassib al-Sayyida, 1950

Sociedade Civil (substantivo). Organizações dentro de um "Estado vilão" que são apoiadas financeiramente ou politicamente pela "comunidade internacional". Essas entidades frequentemente operam com a melhor das intenções e são vistas como úteis por aqueles que querem derrubar governos obstinados, tais como o de Aristide, no Haiti, ou o de Maduro, na Venezuela. A mídia da "comunidade internacional" pinta essas organizações como a voz autêntica do povo, diminui o papel das eleições e menospreza as organizações de massa dos pobres urbanos e rurais, que seriam ferramentas do "Estado vilão".

Prestação de Serviço, 2018. Fawzi al-Junaidi (16 anos) detido em Hebron (Palestina)

Prestação de serviços (substantivo). Estados dóceis que provêm o fundamental para a população a fim de evitar protestos e tumultos. O FMI, o Banco Mundial, os bancos privados e o terceiro setor seguram as mãos dos pobres e lhes desejam sorte com um pouco de água, alguma eletricidade e um pacote de comida. "Parcerias público-privadas" (que dão contratos a empresas privadas) operam através da generosidade de "filantropos" (que não pagam impostos) para cuidar do colapso social. Temas como reforma agrária, democracia econômica, planejamento popular e tributação progressiva estão fora de questão.

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Nosso Guia de Expressões do Imperialismo será ampliado, com termos como austeridade, responsabilidade fiscal, liberdade, confiança do investidor e encargos regulatórios. Por favor, envie-nos sugestões de termos que você acha que devem pertencer a este Guia.
Para ter uma ideia dessa linguagem ridícula, te convidamos a dar boas risadas com esse ensaio satírico [em inglês] de P. Sainath, membro sênior do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social.


Por trás do nosso Guia está a agenda do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social. Trabalhamos duro no ano passado para desenvolver nossa compreensão da Batalha de Ideias, do papel do intelectual e de nossa agenda de pesquisa neste – difícil - contexto.
Nosso trabalho intelectual está resumido no Dossiê nº 13: O Novo Intelectual. Nos baseamos em Karl Marx e Antônio Gramsci, mas, mais do que tudo, nas lutas do povo cubano para definir sua revolução na década de 1990, e nas lutas de povos pelos três continentes que estão na batalha pela sobrevivência. Você pode baixar o dossiê aqui. Está disponível gratuitamente. Estamos ansiosos para que você leia, compartilhe e nos diga sua opinião. Por favor, entre em contato.

Manifestação em defesa da Revolução Bolivariana em Caracas no dia 2 de fevereiro de 2019

O epicentro dessa batalha campal está agora na Venezuela. Dois pontos breves sobre essa questão:
1. Os EUA sabem que a queda do governo bolivariano levaria a sérias dificuldades em Cuba;
2. Os EUA estão ansiosos para reencenar o que fizeram no Iraque, mas desta tomar o petróleo.
Para nos orientar, produzimos uma lista de leitura sobre a crise da Venezuela. Nossa pesquisadora Tanya Rawal escreveu um artigo sobre Ricardo Haussmann, o economista desta tentativa de golpe. Eu produzi um relatório sobre por que os Estados Unidos e seus aliados oligárquicos estão ansiosos por uma mudança de regime na Venezuela. Também importante, o historiador Samuel Moncada Acosta, representante permanente do governo venezuelano junto às Nações Unidas, sugere que o ataque à Venezuela faz parte de uma guerra mais ampla de recolonização.
Ivana Kurniawati, co-fundador do Bintang Kecil, Wiji Thukul

A foto acima, do artista indonésio Ivana, é de Wiji Thukul, nascido em 1963 em Java (Indonésia), desaparecido em 1998. Ele foi o fundador do Sanggar Suka Banjir - um projeto de artes - e um militante do Partai Rakyat Demokratik (Partido Democrático do Povo). Somos gratos a Eliza Virtri Handayani por nos dar amostras dos poemas de Wiji Thukul. Aqui está um deles:
Meus poemas não são poesia.
São palavras escuras.
Elas suam, empurram uma as outras para sair.
Você não pode matá-las, ainda que soque meu olho.
Você não pode matá-las, ainda que me tire de casa.
Ainda que me esfaqueie com solidão, você simplesmente não pode matá-las.
Eu paguei o preço.

Com meu tempo, minha força e minhas feridas.
Wiji Thukul é melhor conhecido por uma frase - apenas uma palavra permanece: lutar! Ele reconheceria pessoas como Isabel Crook (nascida em 1915), que conheci no mês passado em Pequim. Escrevi um pequeno artigo sobre o encontro com o lendário socialista. Imagino Wiji Thukul nos ajudando a escrever o Guia de Expressões do Imperialismo com sua inteligência e sentimento. E Isabel Crook nos encorajando com sua resiliência e sua fortaleza.

*Vijay Prashad é historiador e jornalista indiano. Diretor Geral do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social.

Edição: Luiza Mançano