Supremo

Relator vota a favor da criminalização da LGBTfobia; julgamento segue na quinta (21)

Celso de Mello encerrou posicionamento após duas sessões; o próximo a votar será Luiz Edson Fachin

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Decano da Corte aderiu à tese de que LGBTfobia é parte do crime de racismo
Decano da Corte aderiu à tese de que LGBTfobia é parte do crime de racismo - Ascom-STF

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, encerrou seu voto no julgamento sobre a criminalização da LGBTfobia no início da noite desta quarta-feira (20). Após duas sessões do plenário da Corte, o ministro se posicionou favoravelmente à interpretação de que condutas homofóbicas e transfóbicas podem ser entendidas como parte do crime de racismo. 

As duas ações que estão sendo julgadas pelo STF foram protocoladas pelo Partido Popular Socialista (PPS) e pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT). Ambas as entidades apontam que o Congresso foi omisso ao não legislar sobre o tema, o que teria violado inciso do artigo 5º da Constituição -- que afirma que “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”.

Após iniciar seu voto com uma postura sensível à questão da violência contra a população LGBT, incluindo respostas diretas a pronunciamentos de integrantes do governo Bolsonaro, Celso de Mello reconheceu a omissão do Congresso postulada nos pedidos. Relator em uma das ações, ele votou pela interpretação apresentada pelos autores até que haja posicionamento legislativo sobre o tema, não determinando prazo para que isso ocorra. 

“O Estado tem o dever de atuar em defesa de postulados essenciais e contra qualquer comportamento intolerante de ‘conduta desviante’. Racismo, esse preconceito perverso, designa toda forma de intolerância que fomenta ódio e divisões entre grupos sociais. Preconceito desumaniza a pessoa. O problema da homofobia supera a expressão ‘gay’”, disse, na leitura de seu voto, aderindo aos argumentos. “De nada valerão direitos fundamentais se os fundamentos em que se apoiam esses direitos deixarem de ter apoio de mecanismos institucionais que estão na Constituição”, afirmou em seguida.

Celso de Mello também fez referência expressa aos argumentos da bancada fundamentalista cristã no Congresso, que argumenta que a criminalização da LGBTfobia representa violação da liberdade de expressão: “Pronunciamentos religiosos que extrapolam a liberdade de liberdade de manifestação do pensamento, excedem limites e incitam o ódio, transgridem de modo inaceitável valores tutelados pela ordem constitucional. Não há no sistema constitucional brasileiro direitos ou garantias absolutos”, rebateu. 

O voto de Celso de Mello foi considerado “histórico” por alguns ministros. Luiz Fux e Dias Toffoli, presidente do STF, elogiaram publicamente a argumentação assim que o voto foi encerrado, ainda durante a sessão. O próximo a votar será Edson Fachin, relator da segunda ação. 

Contexto e divergências

Mais de oito mil pessoas foram assassinadas no Brasil entre 1963 e 2018 em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero, segundo relatório inédito elaborado em 2018 por integrantes do Ministério dos Direitos Humanos. No último período eleitoral, as denúncias aumentaram 227% em relação ao mesmo período do ano anterior. 

Entre juristas e especialistas no tema, há consenso de que a violência contra a população LGBT, em todas as suas dimensões, deve ser enfrentada. As divergências apareceram em relação à melhor forma para se fazer isso e quanto à legitimidade de cada instituição para fazê-lo.

Parte dessas polêmicas foi abordada por Marco Aurélio Mello. Mesmo antes de votar, o ministro  criticou a escolha da pauta feita pela Presidência do STF, ocupada por Dias Toffoli. Em sua visão, o tema indisporia o Judiciário com o Legislativo e o Executivo. Na visão de Marco Aurélio, a Corte poderá invadir a competência parlamentar caso dê provimento às causas.

“Nós podemos criar um tipo penal por meio de decisão judicial? Nem por Medida Provisória poderia. Direito Penal é algo muito sério, e nossos representantes é que devem atuar. Que eles o façam ou não façam. Eles podem cruzar os braços numa opção político-normativa. É discricionário do Congresso”, disse, sinalizando que votará contra os pedidos. 

Edição: Daniel Giovanaz