FRONTEIRA

Em Roraima, população se divide sobre "ajuda humanitária" de Bolsonaro à Venezuela

Estado viveu recentemente uma intervenção federal, tem 14% da população desempregada e problemas na saúde não são novos

Brasil de Fato | Boa Vista (RR) |

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Adriano, Daiane e Eliane comentam as ações desastradas do presidente na fronteira
Adriano, Daiane e Eliane comentam as ações desastradas do presidente na fronteira - Sebastián Soto/Brasil de Foto

É o estado com a menor população do país — em Roraima vivem pouco mais de 450 mil habitantes, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pequeno em população, grande em problemas. Viveu em 2018 uma crise no sistema penitenciário, seus funcionários terceirizados chegaram a ficar oito meses sem salários, sofreu nos últimos meses de 2018 uma intervenção federal e atualmente, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) do IBGE do último trimestre do ano passado, tem 14% da população desempregada.

No último sábado (23) o estado virou notícia nacional e mundial pois faz fronteira com a Venezuela. Localizada no extremo norte roraimense, a cidade de Pacaraima, onde fica o limite entre Brasil e Venezuela, foi utilizada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para tentar cruzar, sem sucesso, uma suposta ajuda humanitária para o país vizinho. A ação, coordenada pelos Estados Unidos com o apoio brasileiro e convocada pelo deputado opositor venezuelano Juan Guaidó, não foi vista com bons olhos por toda a população local.

Apoiadores de Bolsonaro se dividem

Embora tenha recebido 71,55% dos votos dos eleitores de Roraima no segundo turno das eleições, o presidente Bolsonaro parece não encontrar o mesmo apoio amplo entre a população da capital Boa Vista sobre as ações de “ajuda” à Venezuela. Nas ruas, as opiniões se dividem. Adestrador de cães, Adriano da Luz apoiou a iniciativa de Bolsonaro. Entretanto, ele aponta que o governo brasileiro é fraco para resolver os problemas internos, mas afirma que é importante ajudar aos que precisam mais nesse momento. “O Brasil falha muito com o próprio brasileiro, mas a gente tem uma outra forma e outro tempo de ajudar o brasileiro. A gente tem agora que ajudar a quem está precisando”, defende o morador de Boa Vista que votou no ex-capitão reformado.

Adriano da Luz aponta falta de respostas no Brasil mas defende "ajudar quem está precisando". Foto: Sebastián Soto/Brasil de Fato

Cabeleireira e DJ, Daiane Ávila pensa diferente. Para ela, que também votou em Jair Bolsonaro e que tem uma visão contrária ao governo do presidente venezuelano Nicolás Maduro, é preciso resolver os problemas internos e deixar de lado os problemas do país vizinho. “O Brasil não está nada bem. Então ele não pode chegar e tomar a frente para tentar resolver os problemas da Venezuela. Não é só a Venezuela que está com problema. O Brasil todo em muitos lugares por aí, no nordeste e até mesmo aqui tem tantas pessoas passando necessidade. Agora vai chegar e visualizar só os venezuelanos? Está totalmente errado”, critica a trabalhadora.

Daiane Ávila votou em Bolsonaro mas acredita que o país precisa arrumar a própria casa antes de se meter na Venezuela. (Foto: Sebastián Soto/Brasil de Fato)

Respeito à autodeterminação

No último domingo (24), após o principal hospital do estado receber 18 venezuelanos feridos nos confrontos ocorridos na cidade venezuelana de Santa Elena de Uairén, segundo a Secretaria Estadual de Saúde, o governador de Roraima, Antonio Denarium (PSL), decretou estado de calamidade na saúde. Com isso, o governante pode fazer a compras para o setor sem licitação. Como causa para atitude, o mandatário local afirmou que o decreto se deve ao aumento de fluxo desses pacientes.

Funcionária pública e moradora de Boa Vista, Eliane Oliveira lembra que os problemas com a saúde não são novos. Os venezuelanos são constantemente apontados por autoridades locais como a causa de diferentes problemas vividos em Roraima. “Em 2016 eu participei de uma reunião com a presença da Organização Pan Americana da Saúde, logo no início das migrações, e já se constatava a necessidade de melhoria de nossa saúde”, afirma Oliveira.

Sobre o envolvimento do Brasil na “ajuda humanitária” à Venezuela, ela manda um recado a Bolsonaro. “Presidente, você foi votado num Estado democrático, assim como a Venezuela votou e Nicolás Maduro foi eleito. Respeite a autodeterminação, que é uma determinação constitucional, respeite o Estado democrático deles. Nós não precisamos intervir na Venezuela”, conclui Eliane Oliveira.   

Eliane Oliveira pede respeito à democracia da Venezuela. (Foto:Sebastian Soto/Brasil de Fato)

Edição: Pedro Ribeiro Nogueira