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MOBILIDADE

Artigo | No Recife, o BRT precisa melhorar nossas vidas e não torná-las pior

As mudanças após a implantação do trecho Leste/Oeste tem dificultado a mobilidade dos usuários

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Os novos termos de uso do BRT tem dificultado o ingresso na plataforma e aumentado o tempo de percurso das linhas
Os novos termos de uso do BRT tem dificultado o ingresso na plataforma e aumentado o tempo de percurso das linhas - Grande Recife

Quarta-feira, 13 de março de 2019. Com o cartão VEM sem valor suficiente para uma passagem, Julia Nogueira andou até a estação BRT mais próxima, localizada na Avenida Caxangá, à 2km de distância de sua casa. Isso não aconteceria se nos ônibus ainda houvessem cobradores para receber a tarifa em dinheiro. A estação fica próxima ao Parque de Exposições do Cordeiro, não na frente do parque como seria mais adequado para garantir aos usuários uma chegada tranquila e em segurança, como era a parada de ônibus antes da reforma para implantação do corredor leste/oeste do BRT em Recife.
Chegando lá, Julia viu que a máquina de carregar o VEM não estava funcionando. Então, impossibilitada de embarcar para ir ao seu compromisso a usuária se viu sem saída e com seu direito de ir e vir violado, pois não há outra opção de transporte público no local. 
Naquele dia, seu compromisso era às 9h e mesmo saindo de casa às 7h ela não conseguiu chegar antes das 10h, num percurso que antes durava 40 minutos. E só conseguiu chegar porque o funcionário da estação ligou pra outro de uma estação próxima e pediu que ele viesse com a máquina portátil carregar o VEM dela, o que gera mais encargos na tarifa. Nisso se passaram mais de 30 minutos. O estresse e o transtorno do episódio custaram a usuária um atraso ao seu compromisso e muito desgaste emocional. Num outro dia, ela  relata ter levado uma hora e meia no trajeto Derby/Iputinga, que levava 15 minutos antes da implantação do sistema BRT. 
O sistema de transporte BRT foi implantado no corredor Leste/Oeste do Recife para otimizar o transporte, a fim de organizar o tráfego no gargalo Derby/Centro, mas tem se mostrado um sistema falho ao acrescentar, no mínimo, 40 minutos no tempo de trajeto. Todos os ônibus nos bairros próximos ao corredor Leste/Oeste não vão mais direto pro centro, eles alimentam os “Terminais Integrados” de onde saem os BRTs que vão para o centro da cidade. 
Acontece que a demanda não está sendo suprida satisfatoriamente e depois de anos de transtornos com as obras de implantação, que duraram quatro anos a mais que o previsto, os usuários sofrem com os termos de uso: embarque exclusivo com VEM, ausência de cobrador nos ônibus para receber passagem em dinheiro, obrigatoriedade de pegar mais de um transporte para trajetos curtos, dificuldade em carregar o VEM. Tais termos de uso se tornam empecilhos para que os usuários usufruam do serviço que deveria ser público, gratuito e de qualidade. Porém nem pagando uma fortuna, depois do último aumento em pleno carnaval, conseguimos usar em paz. 
Espera-se que um sistema premiado internacionalmente como o BRT funcione bem e melhore nossas vidas. As catracas deveriam ser abertas em caso de impossibilidade de carregamento do vem. Ou que se instale bilheteria em todas as estações. Que sejam oferecidos mais ônibus saindo dos bairros para os terminais integrados e mais BRTs saindo dos terminais para o centro.  Com uma das passagens mais caras do país para percorrer pequenas distâncias, o sistema de transporte público do Recife está longe do ideal. O atual governador prometeu tarifa única de R$ 2,15 em toda a RMR na campanha e hoje a tarifa chega a R$ 4,70. Nada justifica o preço absurdo, ainda mais com um sistema que só funcione lotado todos os horários de funcionamento. 

*Julia Nogueira é Arquiteta e Urbanista e usuária de transporte público no Recife

Edição: Monyse Ravenna