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Cancelamento de 8 mil radares pode aumentar número de acidentes nas rodovias federais

Especialistas criticam anúncio de Bolsonaro; só em janeiro, sete mil mortes foram registradas por acidentes nessas vias

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Ao todo, 250 equipamentos estão em operação no país
Ao todo, 250 equipamentos estão em operação no país - Divulgação

No final do mês de março, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) anunciou na sua conta do Twitter o cancelamento da instalação de 8 mil novos radares eletrônicos em rodovias federais no país. Na sequência, também declarou que irá revisar os contratos já existentes, podendo suspender o funcionamento de mais aparelhos.

Para dois especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato, a medida e os anúncios de Bolsonaro são preocupantes.

Segundo explica Reno Ale, presidente do Sindicato dos Trabalhadores do Sistema de Fiscalização do Estado de São Paulo, as velocidades fiscalizadas pelos radares nas vias federais são estabelecidas após amplo estudo, que leva em consideração fatores como a estrutura das rodovias e a frota circulante.

"Bolsonaro faz declarações populistas sem o menor amparo técnico, sem estudar direito", critica. "A gente fica temeroso porque, provavelmente, a quantidade de acidentes vai aumentar. Quando falamos de um fluxo de via rápida, como é o caso de uma rodovia, quanto maior a velocidade, os acidentes tendem a ser cada vez mais frequentes e mais fortes. A consequência disso são vidas perdidas".

De acordo com dados oficiais da Polícia Rodoviária Federal, apenas no mês de janeiro, 7.034 mortes foram ocasionadas por acidentes de trânsito nas rodovias federais.

Ainda em suas declarações nas redes sociais, Bolsonaro disse que a grande maioria dos radares tem “o único intuito de retomo financeiro ao Estado”. Mas para Renato Campestrini, gerente técnico do Observatório Nacional de Segurança Viária, a afirmação não se sustenta.

O especialista em trânsito e segurança afirma que os radares são a mais justa forma de fiscalização da velocidade, uma vez que só são autuados aqueles condutores que efetivamente estão acima do limite estabelecido. A suspensão dos equipamentos, segundo ele, teria um grave custo social.

"É visível que as pessoas que alegam essa ‘indústria de multas’ querem saber onde o equipamento está para acelerar posteriormente. E isso é um problema porque, no acidente de trânsito, a única conta que vai ser paga é na saúde pública, que vai ficar com hospitais lotados; na Previdência Social, que muitas pessoas acabam se tornando beneficiárias em razão de acidentes em que ficam permanentemente com sequelas...", explica Campestrini.

Os radares são equipamentos que compõem a rede de controle de velocidade no país e, como explica Reno Ale, cumprem uma função na preservação da vida. "Desde a instituição do Código de Trânsito Brasileiro em 1998, a gente percebe que muitas vidas foram salvas com medidas de controle sobre os motoristas infratores", afirma.

Um estudo publicado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no estado do Paraná, em 2018, revelou a relação entre medidas de controle da velocidade e a preservação de vidas. Desde a instalação do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) no final da década de 1990, a região apresentou uma redução de 10 óbitos por ano entre pedestres e ocupantes de veículos.

Na contramão

No caminho contrário à medida do presidente, os especialistas apontam que melhorias no trânsito brasileiro poderiam ser feitas melhorando o destino da verba dessas multas. O Código de Trânsito Brasileiro estabelece que a receita gerada com as infrações deve ser aplicada para a própria estrutura das vias, como sinalização e pavimentação.

O artigo 320 do código estipula ainda que parte do arrecadado deve ser destinado a programas de educação no trânsito.

Para Reno Ale, presidente do Sindiviários, esse é o caminho: "Quanto maior o grau de consciência e educação de trânsito, menor vai ser a fatalidade no trânsito, a geração de acidentes e, consequentemente, você pode começar a diminuir a fiscalização em todas as vias do nosso país", defende.

Os 8 mil radares que deixarão de ser instalados pela medida de Jair Bolsonaro e seu ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, são os que pertencem ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). 

Por sua vez, o diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Mario Rodrigues Junior, anunciou no dia 2 de abril que o órgão vai reavaliar os pedidos de instalação de novos radares nas rodovias concedidas à iniciativa privada.

Edição: Mauro Ramos