VAZA JATO

Oposição articula CPI na Câmara para investigar escândalo da Lava Jato

Para lideranças partidárias, conluio entre Sérgio Moro e Deltan Dallagnol atinge Democracia e Estado de Direito

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Presidentes de partidos de oposição em reunião com lideranças partidárias em Brasília (DF)
Presidentes de partidos de oposição em reunião com lideranças partidárias em Brasília (DF) - Lula Marques

Os partidos de oposição na Câmara dos Deputados vão articular apoios na Casa com o objetivo de instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a denúncia de conluio entre procuradores da Lava Jato e o atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, quando este atuava como juiz federal em Curitiba (PR), para condenar o ex-presidente Lula, sem provas, e afastá-lo do processo eleitoral em 2018.

A decisão de propor uma CPI foi anunciada na tarde desta terça-feira (11), em Brasília (DF), após reunião entre dirigentes nacionais do PT, PSB, PDT, Psol e PCdoB, além das respectivas lideranças partidárias na Câmara.

O grupo avaliou que a gravidade da denúncia, sustentada em mensagens e arquivos divulgados pelo Intercept, exige a atuação do Parlamento no processo de apuração do caso.   

“O material que foi divulgado pelo Intercept mostra que houve uma flagrante violação aos procedimentos dos processos democráticos, do Estado democrático de direito. São ataques gravíssimos e nós temos que ver o alcance disso. Nem o que saiu até agora nem a declaração do Moro e do Dallagnol em nota são suficientes pra gente ter a dimensão do alcance dessa contaminação dos processos judiciais que tramitaram na Lava Jato. Então, a CPI vai ter esse objetivo”, explicou o presidente do Psol, Juliano Medeiros, em entrevista ao Brasil de Fato.  

A ideia é começar de imediato a coleta de assinaturas para apresentar o requerimento de criação da comissão. Segundo o regimento da Câmara, é necessário o apoio de um terço do total de deputados, o que corresponde a 171 assinaturas.

Caso seja instaurada, a comissão terá um prazo de 120 dias, prorrogáveis por mais dois meses, para concluir os trabalhos. Em geral, a parte operacional das CPIs inclui oitivas com indiciados e testemunhas, determinação de diligências, requisição de informações e documentos junto a órgãos envolvidos, entre outras medidas.   

Kit oposição  

Os opositores também vão pedir a convocação de Sérgio Moro para prestar esclarecimentos à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e ainda o afastamento do ministro e dos procuradores da Lava Jato envolvidos na denúncia, Deltan Dallagnol e Laura Tessler.

Para o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, o caso deveria ser tratado pelas autoridades brasileiras como um risco às instituições, bem como envolver todos os atores do meio político.

“Isso atinge [hoje] uma personalidade, mas amanhã pode atingir qualquer cidadão. É impossível aceitar, no sistema democrático, o comportamento que tiveram Moro, Dallagnol e sua equipe. Portanto, essa convocação e o pedido de afastamento se impõem neste momento”, argumenta.   

Nos bastidores, opositores ouvidos pelo Brasil de Fato avaliam que a denúncia pode trazer o apoio de membros do chamado “centrão”, que reúne siglas da direita liberal, no processo de desgaste da figura de Moro e da Lava Jato. Os partidos investem esta semana no diálogo com deputados do grupo e também com o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para pedir uma atuação institucional no caso.   

“A discussão que se tem é que o Congresso se posicione porque a gravidade é muito grande, ou seja, você tem aí uma quebra das relações institucionais nesse processo, envolvimento de pessoas numa ação criminosa. Não vi nenhuma manifestação [do Maia], mas era muito importante que ele se manifestasse, pelo bem da democracia”, defendeu a presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), após a reunião desta terça.

Bastidor

A denúncia atrapalha os planos mais imediatos do ministro da Justiça, que tenta aprovar na Câmara o chamado “Pacote Anticrime”, conjunto de medidas penais que propõem a alteração de 14 leis federais. Atualmente em análise por um grupo de trabalho na Câmara, a proposta ainda não começou oficialmente a ser debatida e enfrenta duras críticas de movimentos populares, especialistas e organizações sociais.

Na próxima quinta-feira (13), o relator do projeto, deputado Capitão Augusto (PL-SP), deverá apresentar ao grupo um parecer sobre a matéria, que poderá ser debatida, na sequência, por uma comissão especial ou mesmo levada direto ao plenário, numa decisão que depende de Maia.

Apesar de parte dos deputados do centrão não ter se pronunciado a respeito da denúncia do Intercept, alguns membros de siglas como MDB, PP e PSD, aproveitaram para criticar o ministro e a Lava Jato. Diante desse cenário, o trâmite do projeto poderá ser influenciado diretamente pela oposição a Moro, que deverá ser testada nos próximos dias ou semanas, conforme os diferentes movimentos do jogo político nacional.   

Além de atingir a cúpula do Executivo, o escândalo tende a enfraquecer a ventilada indicação de Moro ao Supremo Tribunal Federal (STF) – intenção anunciada no início de maio pelo presidente Jair Bolsonaro, em pagamento a um compromisso assumido entre os dois quando do convite para o Ministério.

Desgastado, Moro tende a perder capital político e ainda pode sofrer novos ataques, já que o Intercept promete continuar publicando diálogos comprometedores.

Bolsonaro e Moro se reuniram na manhã desta terça para debater o caso. Após o encontro, o Ministério da Justiça divulgou nota informando que Moro "rechaçou a divulgação de possíveis conversas privadas obtidas por meio ilegal e explicou que a Polícia Federal está investigando a invasão criminosa".

Ainda segundo a nota, "a conversa foi bastante tranquila" e Moro "fez todas as ponderações ao presidente, que entendeu as questões que envolvem o caso".  

Edição: João Paulo Soares