em todo o país

Greve Geral termina com mobilizações em 380 cidades contra a reforma da Previdência

Sexta-feira (14) foi marcada por paralisações e atos de rua; CUT estima 45 milhões de trabalhadores envolvidos

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Paulistanos se concentraram em frente à Fiesp, uma das entidades apoiadoras do golpe parlamentar de 2016
Paulistanos se concentraram em frente à Fiesp, uma das entidades apoiadoras do golpe parlamentar de 2016 - Mídia Ninja

As ruas responderam com um retumbante “não” à proposta de reforma da Previdência e aos retrocessos promovidos pelo governo Jair Bolsonaro (PSL). Durante todo o dia, os atos convocados por 12 centrais sindicais e pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo reuniram milhares de pessoas em 380 cidades de norte a sul do país, de acordo com a Central Única dos Trabalhadores (CUT), responsável pela produção do mapa abaixo (clique aqui para acessar o mapa interativo) com o levantamento dos atos que marcaram a Greve Geral em todo o Brasil.

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Ao todo, segundo a central, 45 milhões de trabalhadores participaram ou foram impactados pelos atos e paralisações.

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Nas capitais, a adesão dos setores de transportes, ônibus, metrôs e trens contribuiu para grande número de pessoas que foram engajadas na discussão dos temas que pautam a Greve Geral.

Na internet, a #GreveGeral liderou a lista de “assuntos do momento” do Brasil na rede social Twitter. Entre 17h e 17h20, aconteceu uma mobilização virtual -- “twittaço” -- contra a reforma da Previdência, com a hashtag  #BrasilBarraReforma.

A Greve Geral desta sexta-feira (14) é um desdobramento da luta unitária das centrais sindicais, movimentos populares e setores progressistas pela educação pública e contra a reforma da Previdência. Os protestos dos dias 1º, 15 e 30 de maio também foram construídos a partir da união de forças democráticas.

 

Greve Geral de 14 junho
Brasil amanheceu com rodovias bloqueadas. (Foto: Divulgação)

Atos de rua mobilizaram as principais cidades do país

Na capital paulista, 50 mil pessoas se reuniram em frente à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e seguiram até a Praça da República, onde o ato foi o encerrado. Na concentração, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) comentou os dois episódios que marcaram a semana de Bolsonaro. 

“Qual é a moral de um presidente que se aposentou aos 33 anos tem para impor goela abaixo uma reforma da Previdência como essa?”, perguntou durante o ato, que também pediu a renúncia do ministro Sérgio Moro. “Ele já era partidário quando era juiz, imagine agora que é político. Ele descumpriu a lei e prendeu quem deveria estar no lugar do Bolsonaro.” 

O coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, discursou sobre o êxito da Greve Geral. "Várias categorias cruzaram os braços e pararam. A turma do lado de lá estava com saudade das manifestações”. Para o líder do movimento, mesmo após a modificação no texto da reforma, ainda há a necessidade de debater outros pontos. "É positivo ter tirado a capitalização e o ataque à aposentadoria rural, mas nós queremos que tire a redução da aposentadoria por invalidez e o aumento da idade mínima para aposentadoria”, argumentou.

Laurent Matalia, professor da rede municipal de São Paulo (SP), participou da manifestação na Avenida Paulista e diz que foi à manifestação porque a Previdência é garantia de uma velhice minimamente digna. "Tento convencer muitos colegas que não compreenderam ainda que isso é uma bomba-relógio que vai estourar depois. O Brasil bem ou mal dá alguma dignidade para quem trabalhou toda uma vida, e eles estão querendo destruir isso", explicou o professor que não foi trabalhar nesta sexta (14).

A ex-metalúrgica Antônia Tiossi diz que foi à manifestação defender seu país. "O Brasil está muito triste. Primeiro fizeram uma campanha de ódio, agora uma campanha de tristeza com essa reforma que não é uma reforma é acabar com a Previdência. Os mais prejudicados serão os mais jovens e os menos favorecidos", afirmou.


No Rio de Janeiro (RJ), a manifestação se concentrou na região da Candelária e percorreu o centro; houve repressão policial. (Foto: Clívia Mesquita)

Além da capital paulista, tarde e noite de Greve Geral teve atos registrados em pelo menos outras 13 capitais de todas as regiões.

Em Salvador (BA), 2.700 ônibus do sistema municipal de transporte não saíram das garagens, sendo que o serviço é utilizado diariamente por mais de 1,3 milhões de soteropolitanos. Durante a manhã houve passeata na capital, da Rótula do Abacaxi até o Iguatemi, e durante a tarde o ato que reuniu cerca de 70 mil manifestantes, do Campo Grande à Praça Castro Alves, mesmo com a paralisação dos rodoviários por 24 horas, e apenas o funcionamento do metrô e vans.

No Recife (PE), o ato público se caracterizou como um grande ponto de confluência das mobilizações da Greve Geral que parou o Brasil nesta sexta-feira (14). Milhares de pessoas se concentraram no centro da capital pernambucana, entre elas estava a professora aposentada Maria do Socorro que, aos 72 anos, foi às ruas defender um direito que ela já teve acesso, o da aposentadoria. “Estamos sendo atacados da forma mais vil, querem tirar nosso direito de descansar na velhice”, afirma.
Nilza Gomes, que também participou da mobilização, se declara veementemente contra a proposta de reforma da Previdência do governo de Jair Bolsonaro (PSL). “Eles ainda querem nos enganar chamando de 'Nova Previdência'. A previdência não é nova. Ela é um direito nosso já garantido”, diz.

Greves e manifestações ocorreram nas principais cidades, com a participação dos trabalhadores do campo. Nos Campos Gerais, cerca de 1.200 pessoas participaram da manifestação na cidade Ponta Grossa. Em Londrina, o ato unitário teve cerca de três mil pessoas e paralisação do principal terminal de ônibus da cidade. Foz do Iguaçu registrou sete mil manifestantes e Cascavel, na região Oeste do estado, cerca de 2 mil pessoas.

Em Natal, capital do Rio Grande do Norte, os organizadores da Greve Geral afirmam que cerca de 80 mil pessoas compareceram na manifestação ocorrida nesta tarde. Inicialmente, a concentração do ato aconteceu nas redondezas do Shopping Midway Mall e, depois, manifestantes caminharam até o Natal Shopping, localizado no bairro de Candelária.

Na capital paranaense, Curitiba, estudantes, professores e demais grevistas mobilizaram 6 mil pessoas em ato iniciado às 18h, a partir da praça Santos Andrade. O dia foi repleto de atividades e, no final da manhã, havia ocorrido concentração de servidores e professores em frente ao palácio do governo. Às 14h, houve caminhada dos sindicatos pelo centro da cidade.

"Estamos marcando uma página importante na defesa dos nossos direitos, na defesa de um Brasil que seja um país para a maioria do seu povo, e não esse Brasil do governo federal", avaliou o professor Hermes Leão, presidente da APP Sindicato.

No interior do estado, houve mobilizações em Maringá (10 mil), Cascavel (2 mil), Londrina (3 mil), Ponta Grossa (1,2 mil), Araucária (mil), Foz do Iguaçu (7 mil) e Toledo (500 manifestantes).

O dia de Greve Geral foi marcado por passeatas e mobilizações contra a reforma da Previdência em todo o estado do Rio de Janeiro. No final da manifestação que reuniu cerca de 100 mil pessoas no Centro do Rio, segundo os organizadores, a Polícia Militar dispersou trabalhadores e estudantes lançando bombas de gás lacrimogêneo.

Durante a manifestação no Centro do Rio, trabalhadores e estudantes entoaram palavras de ordem contra as mudanças nas regras da aposentadoria que poderão afetar a parcela da população mais pobre do país: “Eu não abro mão da Previdência e nem da educação”, “Pisa ligeiro, quem mexeu com a Previdência atiçou o país inteiro”, e “A nossa luta unificou é estudante junto com trabalhador”.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) participou das manifestações em todos as regiões brasileiras. Em Pernambuco, o dirigente nacional Jaime Amorim disse ao Brasil de Fato que o país ainda está tentando se recuperar do golpe contra a democracia e o Estado Democrático de Direito, pós-impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT). Na análise de Amorim, o sentimento de antipetismo e o ódio criado pela elite fez a população identificar como opção o governo autoritário de Bolsonaro. “Agora, a população está acordando, está vendo que há um grande risco de a gente retroceder na construção da Democracia, da soberania nacional e do país nação”, disse.

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Ao todo, o MST realizou 50 bloqueios de rodovias federais durante a sexta-feira.

Em Rondônia, os atos de rua reuniram 3 mil manifestantes na capital Porto Velho, 150 em Ariquemes, 100 em Guajará-Mirim, 200 em Jaru, 500 em Ouro Preto, 200 em Ji-Paraná, 200 em Rolim de Moura e 300 em Vilhena.

No Largo do Zumbi, em Porto Alegre (RS), trabalhadores e estudantes encerraram a noite com uma votação simbólica por adesão a novas paralisações contra reforma da Previdência de Bolsonaro e Paulo Guedes.

Repressão

As manifestações foram alvo de repressão policial em algumas cidades do país.

Em São Paulo, um ato pela manhã na Universidade de São Paulo (USP), com participação majoritária de estudantes, professores e servidores públicos, foi dissolvido com balas de borracha e bombas jogadas por policiais militares.

Na confusão, algumas pessoas foram atingidas por estilhaços de bombas e em seguida levadas para o Hospital Universitário da USP, segundo o sindicato dos trabalhadores da universidade. Além disso, 15 manifestantes foram detidos e levados à 51ª Delegacia de Polícia, no Rio Pequeno.

À tarde, manifestantes também relataram violência das forças de segurança do Estado, que tentavam dispersar o ato, na altura da Consolação e da Praça Roosevelt. A PM ainda não se pronunciou sobre o caso.

Ainda de acordo com o sindicato, não há motivos para uma acusação de flagrante de qualquer tipo de crime. A audiência de custódia, para saber se eles vão aguardar o julgamento em liberdade ou presos, vai acontecer neste sábado, dia 15.

Em Araucária, no Paraná, a guarda municipal atacou com balas de borracha o protesto de trabalhadores na BR 426, na região metropolitana de Curitiba, perto da refinaria Presidente Getúlio Vargas. Três pessoas ficaram feridas e foram levados para um hospital. Um agricultor do MST foi atingido no rosto.

Na Paraíba, um policial foi filmado dando um tapa no rosto de um estudante, diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE).

Ao Brasil de Fato, o estudante agredido contou que manifestantes faziam piquete em frente à empresa de Call Center A&C, quando um dos trabalhadores da empresa chegou e eles ficaram segurando a pessoa para ela não entrar no prédio, por conta da greve. Então um policial militar chegou gritando, dizendo para "acabar logo com essa porra".

Manhã foi de atos, trancamento de rodovias e paralisações de categorias

A Greve Geral desta sexta começou cedo para as centrais sindicais, para o MST e o MTST, que bloqueou vias em São Paulo e também organizou ações em terminais de ônibus. Ao todo, de acordo com o movimento, foram 16 intervenções. Por volta das 7h, os sem-teto fecharam a avenida Hélio Schimidt, que dá acesso ao Rodoanel, na altura de Guarulhos (SP), impedido a chegada até o aeroporto. A Polícia Rodoviária Federal tentou impedir o travamento da via avançando com os carros em dire~çao os manifestantes. Não houve feridos. 

Todas as ações do MTST começaram às 7h. A mais volumosa foi na Ponte João Dias, zona sul de São Paulo, que ocupou todas as faixas da via no sentido centro. Os manifestantes marcharam e seguravam uma faixa que dizia: “Não à reforma da Previdência”.

No Terminal Ferrazópolis, na entrada pela avenida Faria Lima, em São Bernardo do Campo, os militantes do movimento fecharam o acesso ao local. Na zona norte da capital paulista, na avenida Corredor, eles também marcharam e travaram as vias. Na zona leste, o MTST ocupou a Radial Leste e seguiu em marcha até o Metrô Itaquera, que estava fechado por conta da adesão dos metroviários à Greve Geral. No local, há também um terminal de ônibus, que permanecia inativo. Por volta das 10h, os manifestantes dispersaram.

Até as 13 horas, mais de 300 cidades de todos os estados haviam registrado protestos. Das 27 capitais, 19 tiveram o sistema de ônibus afetado pela mobilização. Outras oito não tiveram interrupção no transporte coletivo por ônibus, mas registraram bloqueios de ruas ou estradas por manifestantes, ou tiveram paralisação parcial no metrô.

Organizaram paralisações trabalhadores de portos como o de Pecém no Ceará; refinarias, como Recap em Mauá e Abreu e Lima em Pernambuco; indústria metalúrgica, como Volks e Mercedes em São Bernardo; energia; bancários em São Paulo e no ABC; pessoal da Saúde; Eletricitários; Correios no Rio e São Paulo; e universidades como UFRJ, UFSC, UFAL, UFBA e UFCG.

Encontro das duas principais vias do Plano Piloto, a Rodoviária de Brasília (DF) amanheceu sem veículos e sem pedestres em seu entorno. O local, que recebe mais de meio milhão de pessoas por dia, permaneceu vazio até por volta das 15h30, horário em que a reportagem do Brasil de Fato deixou a área. 

No trajeto até a Rodoviária, havia fluxo reduzido de carros, mas ainda sem ônibus. O comércio dentro e próximo ao marco zero da capital apresentava volume abaixo do usual para uma sexta-feira. 

O impacto da Greve Geral no cotidiano foi sentido pelos taxistas da região. Ao menos três motoristas ouvidos relataram ter feito apenas duas viagens desde a manhã até o horário do almoço, quando normalmente realizam ao menos o dobro, especialmente às sextas. “Hoje não consigo nem pagar o combustível. Tento fazer mais uma viagem e vou para a casa”, disse um deles. 

Pela manhã, ao menos duas vias foram bloqueadas por manifestantes no Distrito Federal, a BR-020 e a BR-070. A interrupção do fluxo nas pistas foi breve. Em greve desde dois de maio, o metrô manteve a circulação com número reduzidos de trens.  Agências bancárias e escolas públicas, além da Universidade de Brasília (UnB), não funcionaram durante o dia.

Além das paralisações, a manhã desta sexta (14) foi marcada por dezenas de atos em todo país, organizados por movimentos populares. Além de MST e MTST, participaram o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e Marcha Mundial das Mulheres, com interdições de rodovias e avenidas.

Na cidade de São Paulo, ocorreram bloqueios na avenida 23 de Maio, no elevado João Goulart, na USP e em Sapopemba, entre outros pontos. No estado foram registrados atos em São Bernardo, Diadema, Campinas, Bauru, Itapeva, Sorocaba, Vinhedo, Taubaté e Presidente Prudente.

Houve bloqueios ainda em Santa Catarina (Florianópolis e Chapecó), Alagoas (Maceió), Paraná (Araucária, Francisco Beltrão, Cascavel e Pato Branco), Pará (Belém e Eldorado doas Carajás), Pernambuco (em várias rodovias do entorno de Recife e outros pontos do estado, como Aliança, Jaboatão, Gravatá, Pesqueira e Caruaru), em Minas Gerais (Ouro Preto, Juiz de Fora, Congonhas e BH), Rio de Janeiro (Capital, Niterói e Campos dos Goytacazes), Sergipe (Aracaju e Monte Alegre), Rio Grande do Norte (Natal, Extremoz e João Câmara); em vários pontos na Paraíba; na Bahia (Barreiras, Catités, Santo Antonio de Jesus, Salvador); no Maranhão (São Luís), no Rio Grande do Sul (Porto Alegre e Eldorado do Sul), em Rondônia (Jaru) e em Goiás (Goiânia).

“Acabar com a Previdência para colocar a capitalização e vender nos bancos é o que o governo quer. As centrais sindicais não vão discutir a retirada de direitos. A mudança do relator não ajudou. Ela continua retirando os direitos. A proposta do Bolsonaro e do Guedes é tão ruim que o relator para fazer pior tinha que fazer muita força. Queremos a Previdência geral, ampla e pública. Queremos melhorá-la e a proposta é só para pior”, disse Vagner Freitas, presidente da CUT, ao fazer um balanço das atividades.

Edson Carneiro, o Índio, dirigente da Intersindical, afirmou que o relatório do deputado paulista Samuel Moreira (PSDB) não representa avanços definitivos na proposta e que o esforço dos trabalhadores e da oposição deve ser direcionado para a derrubada da PEC 6/2019.

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“A despeito de ter tirado o que era muito escandaloso que era desconstitucionalização e a capitalização, mantém todas as crueldades contra as mulheres, o aumento do tempo de contribuição, a idade mínima de 65 anos e 62 anos, como se o povo começasse a  trabalhar depois dos 30 anos, como acontece com os deputados. O povo brasileiro e a classe trabalhadora ainda tem muita luta para fazer”, asseverou.

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Edição: Rodrigo Chagas