Rio de Janeiro

ECONOMIA

Ex-presidentes do BNDES são contrários a mudanças no Fundo de Amparo ao Trabalhador

Funcionários organizaram ato contra o texto da reforma da Previdência com mudanças no repasse do FAT para o banco

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Protesto estava marcado antes da renúncia do ex-presidente Joaquim Levy e ex-diretor de mercado de capitais Marcos Pinto
Protesto estava marcado antes da renúncia do ex-presidente Joaquim Levy e ex-diretor de mercado de capitais Marcos Pinto - Clívia Mesquita

Mais de 400 trabalhadores do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) lotaram um auditório na sede da estatal no centro do Rio de Janeiro nesta quarta-feira (19). O movimento organizado pela Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES) denuncia que o novo relatório da reforma da Previdência pode acabar com repasses constitucionais do PIS/Pasep para o banco e esgotar sua principal fonte de financiamento.

O ato contou com a participação de quatro ex-presidentes do banco que compuseram mesa no palco. Luciano Coutinho, José Pio Borges, Paulo Rabello e Dyogo Oliveira estiveram à frente do BNDES em governos distintos de 1998 até 2019. Todos criticaram com veemência o texto do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), relator da reforma da Previdência, que propõe mudanças no repasse do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para o BNDES. 

Hoje, cerca de 40% do FAT é destinado ao BNDES que, por sua vez, fomenta projetos de desenvolvimento e infraestrutura nacional. O montante é devolvido com juros ao FAT e também financia o pagamento de seguro desemprego, abono salarial e qualificação.

Segundo a AFBNDES, o fim do repasse pode significar uma perda de R$20 bilhões de recursos por ano para financiamentos do banco. Também inviabiliza R$410 bilhões de investimentos nos próximos dez anos e implicaria menos oito milhões de empregos no mesmo período. 

O economista Luciano Coutinho, que presidiu a estatal entre maio de 2007 e maio de 2016, reforça que desvincular o repasse constitucional ao banco deve prejudicar a recuperação econômica do país e penalizar os investimentos no futuro. 

"[A reforma da Previdência] debilita uma fonte [FAT] de financiamento estável e que é um dos esteios para financiamento de longo prazo que mais do que nunca é necessário pra recuperar um ciclo de investimento em infraestrutura", afirma.

"Pode haver uma visão ultraliberal que crê ser desnecessário bancos de desenvolvimento, mas eu não concordo. Acho que o mercado de capitais tem um papel relevante, mas ele sozinho não consegue suprir a necessidade de crédito de longo prazo com as características de uma economia em desenvolvimento", completa Coutinho. 

Dyogo Oliveira, presidente da instituição de 2018 a 2019, pediu que sejam deixadas de lado ideologias no debate "em defesa da fonte básica de recursos do financiamento para investimento de longo prazo do Brasil".

"O BNDES continuará sendo o principal financiador de grandes investimentos transformadores na indústria, comércio, serviços. É preciso deixar de lado a ideologia e começar a ter debates racionais. O que vai mobilizar as pessoas é mostrar que estamos falando do futuro do Brasil, em termos de qualidade da nossa estrutura econômica. São investimentos que outros países não farão por nós", disse, se referindo à capacidade do país de financiar as próprias exportações. 

No final do evento foi lida uma carta em defesa do FAT e do BNDES. "O FAT é um arranjo virtuoso que articula um sistema de seguridade ao trabalhador sem depender das flutuações típicas do orçamento da união com o financiamento de projetos que, no presente, geram empregos e receita tributária, e, no futuro, mais capacidade de crescimento e geração de receitas tributárias adicionais. O FAT, portanto, é um sistema de proteção social com responsabilidade fiscal. Não dará certo converter recursos atualmente destinados a poupança para financiar gastos correntes". 

Arthur Koblitz, vice-presidente Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES), ressaltou o compromisso que a instituição tem com o desenvolvimento do Brasil durante décadas e que a população muitas vezes desconhece. "A proposta do relator [Samuel Moreira] significaria uma redução drástica do BNDES que esteve por trás de todas as iniciativas de modernização do país. De apoio à exportação, pequenas e médias empresas, apoio a governos estaduais e municipais, obras de saneamento, estradas. Sempre agimos escondido, mas agora que resolveram nos atacar temos que ficar falando bem de nós mesmos".

Koblitz adiantou que já deu início ao diálogo com parlamentares simpáticos à causa e vai pedir uma conversa com o deputado relator da reforma da Previdência. O representante da AFBNDES fez questão de desassociar o protesto da renúncia de Joaquim Levy da presidência do BNDES e de Marcos Pinto, diretor de mercado de capitais. 

O diretor de finanças do banco, José Ferreira Ramos ocupa a presidência interina da instituição até a posse do engenheiro Gustavo Montezano, de 38 anos, nomeado pelo ministro Paulo Guedes. Levy, que antecedeu Montezano à frente do banco, e Pinto se demitiram dos seus cargos após pressão de Jair Bolsonaro (PSL).

"O que posso desejar é boa sorte e que ele compreenda o papel que o banco pode ter para o desenvolvimento do país. Que ele esteja engajado nessa tarefa de recuperar a economia brasileira e para isso se valha do potencial técnico que o BNDES pode oferecer", opinou Coutinho sobre a nova gestão.

Edição: Vivian Virissimo