Minas Gerais

Opinião

Artigo | Além de novo, inexperiente

Zema: o que nos parece é que o jeito “novo” de governar não inclui os mais pobres em seu projeto

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Povos tradicionais e os acampados e assentados da reforma agrária são os grupos que enfrentam as maiores dificuldades de acesso aos serviços
Povos tradicionais e os acampados e assentados da reforma agrária são os grupos que enfrentam as maiores dificuldades de acesso aos serviços - Foto: Mídia Ninja

O que se espera de um gestor público? Um profundo conhecimento sobre como melhorar a vida da população por meio das políticas públicas. Na última semana, nós, deputados estaduais de Minas Gerais, tivemos a oportunidade de debater com os secretários de estado as políticas que pretendem adotar nos próximos quatro anos. A primeira impressão é que os gestores do governo Zema (Novo) não têm a familiaridade necessária com o setor público muito menos entendem a complexidade de se fazer políticas sociais em um estado do tamanho do nosso.

Ouvimos o presidente da Cemig dizer que não conhece o programa Luz para Todos e o secretário de Desenvolvimento Econômico admitir que não domina o quão importante é a titulação de terras para a redução das desigualdades regionais. A secretária de Desenvolvimento Social, embora com uma ampla experiência, ainda não conseguiu colocá-la a serviço dos mineiros. Projetos importantes continuam “em revisão” após seis meses de governo, como é o caso do Novos Encontros e o Sementes Presentes. Vimos a secretária de Agricultura e Pecuária defender a redução de impostos para agrotóxicos, indo na contramão da prática mundial: quanto mais veneno, menos saúde.

Como representante da Comissão de Direitos Humanos, apresentei a eles minha preocupação com a oferta de serviços continuados de proteção social aos mais vulneráveis. Nosso país viveu um ciclo virtuoso de progresso social inquestionável nas últimas décadas, retirando mais de 30 milhões de brasileiros da linha da miséria, fruto de um esforço extraordinário de governos e da sociedade. Depois de algumas décadas, em 2014, o Brasil saiu do mapa da fome e alcançamos o pleno emprego.

Mas os dados divulgados pelo IBGE no final de 2018 mostram que passamos a trilhar um caminho inverso: 26,5% da população brasileira ainda vive em condição de pobreza extrema. Em 2019, voltamos a integrar o mapa da fome. Em Minas Gerais, para o mesmo período, esse percentual foi menor, chegando a 21% da população. Isso significa que nos últimos quatro anos foram feitas políticas acertadas para atender os que mais precisam, apesar da enorme crise fiscal e política.

Descaso com o Norte mineiro

Venho do Norte mineiro, região semiárida que compreende quase um terço do estado. É um território historicamente mal compreendido e maltratado pelas elites. Não herdamos políticas de infraestrutura adequadas à realidade do semiárido nem instrumentos de desenvolvimento capazes de aproximar os indicadores socioeconômicos ao patamar médio do estado. A pobreza em Minas Gerais tem endereço: ela se concentra especialmente no campo. São 229 municípios no Alto, Médio e Baixo Jequitinhonha, Norte, Mucuri e Rio Doce em situação de grande vulnerabilidade social.

Povos e comunidades tradicionais - quilombolas, indígenas, comunidades extrativistas - e grupos específicos, como acampados e assentados da reforma agrária são os que enfrentam maiores dificuldades de acesso aos serviços básicos nesses territórios. Em 2017 a Assembleia Legislativa aprovou o Projeto de Lei 4736 que instituiu o Plano Estadual de Enfrentamento da Pobreza no Campo e organizou uma ação continuada e integrada de Estado para estabelecer um caminho progressivo de inclusão e superação da extrema pobreza. O Plano reconhece a pobreza como um fenômeno multidimensional, não sendo possível atacá-la sob um aspecto único, por isso a grande importância da ação integrada de mais de 20 secretarias e órgãos.

Infelizmente, o atual governo não disse até agora o que será feito do Plano de Enfrentamento da Pobreza no Campo. Não é possível assumir um governo e sepultar iniciativas que são responsabilidades fundamentais de Estado e dever dos governos. Estão paralisados investimentos em fomento à produção sustentável nos territórios, como a aquisição e distribuição de insumos e equipamentos para produção sustentável. Com a regularização fundiária acontece o mesmo.

O que nos parece é que o jeito “novo” de governar não inclui os mais pobres em seu projeto. A política de escuta que construímos nos últimos anos está sendo abandonada e nada está sendo posto em seu lugar. Não é apresentado um projeto para Minas Gerais além da tão propalada “meritocracia” na ocupação de cargos e a venda do patrimônio.

O que o povo mineiro precisa é de mais acesso à educação e saúde; precisa dos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), dos Centro de Referência Especializados de Assistência Social (Creas), de terra para viver, do apoio do Estado para produzir. Não é possível governar de costas para o povo. Mas o que se observa nos primeiros seis meses é uma paralisia do governo do Estado em vários aspectos e níveis. Da reação diante do sofrimento do povo em Barão de Cocais à inércia dos conselhos. Do ponto de vista do desenvolvimento social e dos direitos humanos, essa paralisia significa, na prática, um retrocesso para Minas Gerais. É hora de ultrapassar o discurso de campanha e governar.

Leninha é deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores e Presidenta da Comissão de Direitos Humanos da ALMG.

Edição: Joana Tavares