perseguição

Lava Jato só aceitou delação da OAS quando Léo Pinheiro incriminou Lula

Empreiteiro era tratado com descrédito pela força-tarefa e só acusou Lula após um ano de negociação com procuradores

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

Ouça o áudio:

O triplex no Guarujá apontado como suposto pagamento de propina da OAS ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
O triplex no Guarujá apontado como suposto pagamento de propina da OAS ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - Foto: Nelson Almeida / AFP

Novas conversas reveladas a partir do conteúdo obtido pelo site The Intercept Brasil, publicadas em parceria com o jornal Folha de S. Paulo, na madrugada deste domingo (30), demonstram a forma como procuradores da força-tarefa da Lava Jato tratavam as negociações com advogados da construtora OAS para pactuar um acordo de delação premiada para Léo Pinheiro, ex-presidente da empresa.

Continua após publicidade

"Sobre o Lula eles não queriam trazer nem o apt. Guarujá", escreveu numa conversa de Telegram o promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes a outros integrantes da equipe de negociação com a empreiteira: "[Os advogados] diziam q não tinha crime".

"Léo Pinheiro, que ao longo do processo nunca havia incriminado Lula, foi pressionado e repentinamente alterou sua posição anterior em troca de benefícios negociados com procuradores de Curitiba, obtendo a redução substancial de sua pena'', declarou a defesa do ex-presidente no caso, em nota divulgada na manhã deste domingo, assinada pelos advogados Cristiano Zanin e Valeska Martins.

As negociações entre a OAS e a Lava Jato começaram em fevereiro de 2016. As mensagens acima datam de agosto do mesmo ano. Léo Pinheiro só apresentou a versão sobre o triplex no Guarujá que permitiu a acusação e condenação de Lula em abril de 2017. Meses antes, em junho de 2016, os jornais brasileiros noticiavam que Léo Pinheiro negava ter pago qualquer propina ao ex-presidente.

As mensagens publicadas mostram que os relatos apresentados pela empresa foram mudando até que os procuradores aceitassem assinar um termo de confidencialidade com os advogados da OAS. O período de negociações foi conturbado, envolveu episódios de vazamentos do conteúdo das delações à imprensa, e culminou com a prisão de Léo Pinheiro.

O depoimento do ex-empreiteiro, no dia 24 de abril de 2017, foi crucial para que o Ministério Público Federal (MPF) estabelecesse conexões entre o apartamento e os casos de corrupção na Petrobras, essencial para que o caso fosse mantido em Curitiba e julgado por Moro.

O MPF pediu a redução da pena de Pinheiro pela metade. Em julho, Sergio Moro condenou o empresário a 10 anos e 8 meses de prisão, mas autorizou sua soltura após 2 anos e 6 meses de detenção.

Preocupado com a imagem da operação, Deltan Dallagnol disse na época em conversa com colegas pelo Telegram: "Não pode parecer um prêmio pela condenação de Lula".

O acordo de delação premiada com a OAS foi firmado no fim de 2018, mas não foi homologado pelo Supremo Tribunal Federal até hoje.

A defesa do ex-presidente Lula divulgou nota comentando esse novo vazamento:

A reportagem publicada hoje (30/06) pelo jornal Folha de S.Paulo (“Lava Jato via com descrédito empreiteiro que acusou Lula”) reforça a forma ilegítima e ilegal como foi construída a condenação do ex-presidente Lula no chamado caso do “triplex”. Conforme histórico do caso, Leo Pinheiro, que ao longo do processo nunca havia incriminado Lula, foi pressionado e repentinamente alterou sua posição anterior em troca de benefícios negociados com procuradores de Curitiba, obtendo a redução substancial de sua pena.

Em 16/06/2016 e em 14/04/2017 apresentamos Notícia de Fato à Procuradoria Geral da República pedindo que fossem devidamente apuradas informações divulgadas pela imprensa, dando conhecimento de que Leo Pinheiro estaria sendo forçado a incluir artificialmente o nome do ex-presidente Lula no seu acordo de delação. Tais procedimentos, no entanto, foram sumariamente arquivados.

Também alertamos no início do depoimento de Leo Pinheiro, com base em reportagem da própria Folha de S. Paulo e do Valor Econômico publicadas naquela data (23/04/2017), que estava em curso uma negociação com procuradores da Curitiba sobre a versão que seria apresentada por Leo Pinheiro naquela ocasião. Com base nesses fatos, pedimos a suspensão do depoimento naquele momento, diante do prejuízo imposto à defesa de Lula — pois enquanto a acusação estava conversando com o ex-executivo sobre premiação para que ele incriminasse Lula, a defesa sequer tinha conhecimento da sua real situação jurídica. O pedido da defesa, porém, foi negado pelo ex-juiz Sergio Moro, permitindo que Leo Pinheiro pudesse prestar depoimento naquela situação.

Tais elementos mostram que jamais houve intenção de apurar a verdade dos fatos, mas apenas a de impor a Lula uma condenação sem qualquer prova de culpa e desprezando as provas de inocência que apresentamos durante o processo.

As novas revelações se somam a tantas outras que mostram a necessidade de ser anulado todo o processo e a condenação imposta a Lula, com o restabelecimento de sua liberdade plena.

Cristiano Zanin e Valeska Martins

 

Edição: Rodrigo Chagas