AMÉRICA LATINA

Paraguai cancela acordo com Brasil sobre Itaipu, e impeachment de Benítez perde força

Termos do acordo assinado entre chancelarias paraguaia e brasileira abriu crise em governo do presidente Abdo Benítez

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Após divulgação dos termos de acordo assinado entre Paraguai e Brasil sobre hidrelétrica, oposição acusou Abdo Benítez de traição à pátria
Após divulgação dos termos de acordo assinado entre Paraguai e Brasil sobre hidrelétrica, oposição acusou Abdo Benítez de traição à pátria - Foto: Norberto Duarte/AFP

O governo do Paraguai anunciou nesta quinta-feira (01) o cancelamento do acordo entre as chancelarias paraguaia e brasileira no dia 24 de maio, que previa um aumento no preço pago pela nação vizinha pela energia gerada na hidrelétrica de Itaipu. 

A decisão freia, ao menos por enquanto, a possibilidade de impeachment do presidente Mario Abdo Benítez. Após o Ministério das Relações Exteriores do Paraguai divulgar nesta quinta o documento de cancelamento do acordo com o Brasil, o presidente da Câmara dos Deputados, Pedro Alliana, anunciou que a bancada da qual faz parte, o Movimento Honor Colorado, considerava "reparado o dano feito ao país" e retirou seu apoio ao processo de impedimento do mandatário.

Na madrugada de quarta (31) para quinta-feira, o Honor Colorado, fração do partido governista liderada pelo senador e ex-presidente Horacio Cartes, decidiu apoiar o processo de impedimento contra Abdo Benítez, o que garantiria os 53 votos na Câmara dos Deputados necessários para derrubar o presidente.

"Quero agradecer aos deputados e deputadas que seguiram dialogando para buscar uma saída que não rompa esse processo democrático que precisa ser fortalecido no Paraguai", disse o mandatário nesta quinta-feira em pronunciamento oficial no Palácio de López, sede do governo.

O presidente ainda afirmou que se deve evitar um processo de impeachment que jogue o país "na incerteza" e cause "danos ao povo". "Quero agradecer aos líderes de todos os partidos que mudaram sua posição e optaram pelo diálogo", disse.

Crise

A revelação dos termos do acordo assinado entre as chancelarias paraguaia e brasileira abriram uma crise política dentro do governo de Abdo Benítez. Assinado em maio e tornado público apenas na semana passada, o documento previa elevar os custos para a ANDE (Administração Nacional de Eletricidade) - estatal de energia paraguaia - em mais de 200 milhões de dólares.

Os termos da ata levaram à renúncia do então ministro das relações Exteriores, Luis Castiglioni, e do embaixador paraguaio no Brasil, Hugo Saguier. Importantes funcionários do setor de energia do país vizinho também pediram demissão do cargo: o titular paraguaio da usina hidrelétrica de Itaipu, José Roberto Alderete, e o atual presidente da ANDE, Alcides Jiménez, que havia assumido o cargo poucos dias antes com a renúncia de seu antecessor, Pedro Ferreira, também por discordâncias em relação ao pacto.

A oposição acusou o governo de traição à pátria e, na manhã desta quinta-feira o Partido Liberal Radical Autêntico já havia protocolado um pedido de impeachment contra o presidente.

As acusações contra o governo ganharam proporções maiores após o jornal ABC Color informar que o advogado José Rodríguez González interviu em nome do vice-presidente do Paraguai, Hugo Velázquez, para retirar um dos pontos do acordo na véspera de ser assinado, em 24 de maio.

Empresa brasileira

De acordo com o jornal paraguaio, González, que se apresentou como assessor jurídico do vice-presidente, afirmou que ligou para a representação paraguaia que estava no Brasil na ocasião da assinatura do documento e pediu para que o ponto 6 do acordo fosse subtraído do texto final.

O ponto em questão permitiria ao Paraguai comercializar com empresas privadas brasileiras o excedente da produção de energia de Itaipu. Segundo o advogado, o cancelamento do parágrafo foi acertado durante uma reunião "com o mais alto escalão do país vizinho" a pedido da empresa brasileira Leros Energia e Participações S.A.

González ainda afirma que se reuniu com Alexandre Giordano, empresário brasileiro filiado ao PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, que é suplente do senador Major Olímpio (PSL-SP). Segundo o ABC Color, Giordano teria falado em nome da família Bolsonaro em um lobby que privilegiaria o Grupo Leros na compra de energia paraguaia.

Ao site BuzzFeed, Giordano confirmou a presença em reunião com a empresa e representantes da estatal ANDE no Paraguai, mas negou que tenha realizado qualquer lobby em nome da família do presidente brasileiro. "Não conheço os filhos de Bolsonaro, não conheço e nem tenho relação com Bolsonaro", disse.

Nesta quarta-feira, o vice-presidente paraguaio compareceu ao Congresso do país para apresentar explicações sobre o escândalo. Velázquez disse que o advogado não trabalha como seu assessor jurídico e negou que tenha pedido por qualquer modificação no acordo entre os países.

Edição: Opera Mundi