Política

Benedita da Silva: “A cultura está provando que é ele que não gosta do brasileiro"

Deputada pelo Rio de Janeiro, Benedita da Silva fala sobre Bolsonaro e os ataques ao incentivo à cultura

Brasil de Fato | Natal (RN) |
Benedita da Silva, deputada federal pelo PT/RJ
Benedita da Silva, deputada federal pelo PT/RJ - Divulgação

Em visita a Natal (RN) para o Festival Elas Por Elas, a deputada federal Benedita da Silva (PT/RJ) conversou com o Brasil de Fato RN sobre sua atuação na presidência da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados e denunciou as medidas do presidente Jair Bolsonaro (PSL) contra a produção de arte e cultura no Brasil. Benedita foi a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira no Senado Federal, além de ter sido governadora do Rio de Janeiro. Na Assembleia Constituinte, que marcou a redemocratização do Brasil, ela presidiu a Subcomissão de Negros, População Indígena e Minorias.
Brasil de Fato: Atualmente, a senhora está na presidência da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados. Quais os desafios?
Benedita da Silva: Está havendo um esvaziamento da política de cultura no Brasil. Nós temos o legado de Lula e Dilma, de criação da política nacional, cultura, incentivo ao audiovisual e ao cinema brasileiro. Então, nós temos um legado muito interessante e que, neste momento, está sendo desmontado. A comissão de cultura no Congresso Nacional está, de uma certa vez, fazendo uma parceria com cada um dos deputados que são da cultura, mesmo sendo de direita ou de centro. Nós até falamos “vamos criar, aqui, o partido da cultura”. Agora, querem acabar com a Ancine. É desafiante o que a comissão tem para debater e discutir com a população.
Em abril, tivemos a diminuição de investimentos na Lei de Incentivo à Cultura, a Lei Rouanet. Como isso vem impactando o mercado cultural?
O impacto foi muito grande. Ate porque, já se tinha muitos projetos em andamento, não só do audiovisual, da arte, mas também de trabalhadores dessa arte. Houve uma série de desemprego nessa área. A cultura é uma área de rendimento. O governo não tem nenhum prejuízo com a cultura, porque ela produz de tal forma que, se você for somar os empregos que ela dá, os talentos que ela descobre, o estímulo que se dá, isso é tudo muito importante para a cultura brasileira. Então, esse impacto, já se sente.
Esse seu projeto em referência à Lei Rouanet vem em resposta à diminuição de investimentos?
Não. Houve uma CPI da Lei Rouanet. Dessa CPI resultou a indicação de um projeto das questões que foram levantadas da Lei Rouanet. Mas, o projeto começou anterior a essa modificação do governo. O governo, na verdade, desmontou o Ministério da Cultura e, agora, está demonstrando os órgãos e instrumentos que possibilitam você ter incentivos, buscar apoios fora e dentro do estado, também em empresas privadas. Esse projeto coloca essas demandas.

Benedita da Silva no Festival Elas por Elas. Foto: Luisa Medeiros.
Atualmente, que projetos voltados para as populações negras, indígenas e minorias você tem desenvolvido?
Nós já fizemos ações com povos de terreiro, com mulheres negras, quilombolas, literatura negra e em repúdio à campanha racista do Ministério da Educação. Estamos fazendo, também, os debates, no que a gente chama de rodas de conversa de cultura popular, cultura regional. Estamos conversando nas comunidades sobre a comissão, falando do hip-hop, do passinho, de funk, de música, do teatro e do audiovisual. Porque nós temos muita produção nessas comunidades, que estão fazendo acontecer independente de recurso ou não do governo. Elas sobrevivem por conta da força da cultura. Elas criam sua plateia. A cultura é algo muito forte, muito revolucionário.
Qual o cenário da população negra atualmente?
A cultura negra vem recebendo ataque do governo. O racismo existe no país, mas, nos governos Lula e Dilma houve um avanço. Por exemplo, políticas de cotas foram fundamentais para que as universidades tivessem uma outra cara no país inteiro. Vendo os filhos dos porteiros e das domésticas se formando nas universidades, e as próprias domésticas e porteiros também. Então, a política de cotas para negros e pobres é importante. O governo Bolsonaro quer acabar com essas políticas, que atendem à maioria da população brasileira, que não é rica. O que ele quer fazer agora com o Sistema Único de Saúde (SUS), como as pessoas sem recursos financeiros vão viver sem atendimento de saúde? Vai jogar todo mundo na aposentadoria privada, vai ter que ter plano privado de saúde... Os negros são maioria da população. Na educação, na saúde, nas relações de trabalho, no meio ambiente, seja o que for que o governo esteja extinguindo, atinge a população negra, que é a maioria da população brasileira.
Bolsonaro já demonstrou a intenção de extinguir a Ancine. Como você avalia isso?
Como ele não está no espírito nacionalista, a Ancine está incomodando com a boa produção e qualidade que tem o cinema brasileiro, ganhando prêmios no Brasil e fora do país. O cinema nacional, além de ser filmes atualizados, ele acompanha a conjuntura do país, fala do cotidiano, da realidade de uma região, ou de uma situação que está invisível. A produção brasileira é riquíssima, mas Bolsonaro quer uma coisa Hollywood, que estimula a violência, a arma, que é o que ele gosta. Bolsonaro presta serviço aos Estados Unidos. Faz mal para ele ver qualquer brasileiro ou brasileira ganhar prêmio, porque ele está vendendo um país desqualificado, de ignorantes, mas não é essa a nossa realidade. A cultura está provando que é ele que não gosta do brasileiro nem da produção brasileira.
 

Edição: Isadora Morena