Atentado

Para fundadores, Al Janiah foi atacado por ser de esquerda: “Não foi só xenofobia”

Restaurante de refugiados foi atacado no domingo. Reginaldo Nasser, membro do espaço, responsabiliza a extrema direita

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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“São pessoas que agem com covardia", afirma fundador do Al Janiah
“São pessoas que agem com covardia", afirma fundador do Al Janiah - Foto: Al Janiah

Na madrugada do último domingo (1º), por volta das 3h30, a sede do restaurante palestino Al Janiah, no bairro da Bela Vista, em São Paulo (SP), sofreu um ataque. Cinco homens se aproximaram da entrada do espaço e jogaram garrafas e gás de pimenta contra os clientes e funcionários.

Imediatamente, se espalhou nas redes sociais que se tratava de um atendado xenófobo. Porém, para Reginaldo Nasser, que é fundador e membro do estabelecimento, a motivação foi “porque somos de esquerda.”

“O ataque, sem dúvida nenhuma, ocorreu porque somos de esquerda. A xenofobia está mais presente nos grupos de direita. A esquerda sempre esteve alinhada contra a xenofobia. Portanto, não é só xenofobia, é porque somos de esquerda”, afirma Nasser, que é professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Ainda de acordo com Nasser, o discurso do presidente Jair Bolsonaro (PSL) estimula atos como o da madrugada de domingo. “De certa forma, esse discurso fortalece as pessoas e esses grupos para que ajam em consonância com o governante. É como se dissessem: ‘Eu e o presidente estamos juntos’. Não é uma causa direta, mas indiretamente, [o discurso de Bolsonaro] é o fator estrutural que permite aumentar esse tipo de acontecimento, isso é fato”, explica.

Para Nasser, o ataque foi organizado por grupos de extrema direita. “São pessoas que agem com covardia, planejamento, num horário que pouca gente está na porta e, portanto, sem resistência. Tanto que quando há o revide, eles correm. São covardes. Portanto, o melhor para combater isso é ocupar os espaços e fazer o debate, não mudar absolutamente nada”, argumenta.

Também fundadora do espaço, a socióloga Marina Mattar explica porque o restaurante não procurou imediatamente a polícia. “A primeira preocupação foi ver se as pessoas estavam bem e se os clientes estavam feridos. Por isso, não corremos para a delegacia para fazer um Boletim de Ocorrência. Também porque sabemos que o problema não é especificamente essas cinco pessoas, não somos punitivistas, a grande questão não são esses cinco, é mais que isso”, relata.

No momento do fechamento desta matéria, membros do Al Janiah registravam um Boletim de Ocorrência sobre o ataque. Veja o vídeo da câmera de vigilância da parte externa do restaurante.

O Al Janiah divulgou uma nota sobre o atentado. Confira na íntegra:

"Como tem sido noticiado em parte da imprensa, o Al Janiah - Bar, Restaurante e Centro Cultural sofreu um ataque na madrugada do domingo (1/9). Por volta das 3h30 da manhã, um grupo de cinco pessoas se aproximou da porta principal do estabelecimento portando uma faca e spray de pimenta. As câmeras de segurança registraram o momento do covarde ataque. Os membros do grupo fugiram na sequência. Ninguém ficou ferido, nossa equipe conseguiu conter o ataque e todos os presentes estão bem. Não podemos nos calar diante da motivação deste ato, num contexto de crescente discurso de intolerância e ódio que acomete este pais. Desde o inicio, o Al Janiah sempre foi conhecido por ser um espaço democrático, de defesa das minorias políticas e acolhimento de refugiados. Sua historia se liga a luta pela Libertação da Palestina. Institucionalmente estamos tomando as devidas providências por meio de nossos advogados. Agradecemos o apoio que temos recebido de todos os cantos do Brasil. Não vai ser fácil destruir a solidariedade e os espaços democráticos que foram construídos.

Da resistência palestina, buscamos inspiração:

"Vocês que passam com palavras efêmeras,

como a poeira amarga, passem onde quiserem, mas

não passem entre nós como insetos com asas

temos o que fazer na nossa terra

temos trigo a criar e regar com o orvalho do nosso corpo

temos o que a vocês aqui não agrada:

temos pedra... e perdiz!" (Mahmud Darwish)

É preciso estar atento e fortes. Seguimos! Nos mantemos firmes na luta, tão necessária nesse contexto de ataque à democracia. Nossa resistência continua e nossa programação cultural segue normalmente, em defesa da Cultura e celebração da diversidade."

Edição: Rodrigo Chagas