saindo há pouco do restaurante, camaradinha vendendo picolé me chama:
– e aí, grande, picolé?
– talvez.
– meu nome é Matias. o seu?
– Marcelo, mas pode chamar Z.
– tem cara de Marcos.
– Marcos Marcelo, então. e esse picolé, bom?
– não, mas tem motivo.
– hahahaha! qualé o enguiço?
– como posso fazer um picolé bom se tô começando e ainda não tenho dinheiro pra comprar ingredientes bons? então, tô sendo sincero: quem comprar agora tá investindo pra eu fazer um picolé bom. qual sabor vai?
– ok, vamos investir. qual cê recomenda?
– creme holandês. é esse que eu daria pra Dona Mariana, minha mãe.
– esse, então – disse, paguei-lhe 5 dinheiros (custa 3, mas investimento etc), me despedi, fui ao picolé.
formidavelmente péssimo.
difícil dizer de que é feito o creme holandês no palito. certeza, mesmo, groselha, leite condensado e, pra dar liga na massa, algo entre o creme de leite e o gesso.
a cor do picolé me inspirou a criar um nome pra esmalte (profissão que ainda hei de exercer: redator de nomes para esmaltes e batons), e só falta decidir qual é mais adequado, se Indecência Fúcsia ou, visando o mercado internacional, Fúcsia Lust.
limpando os beiços e os bigodes, concluí que, investimento à parte, não preciso me preocupar com o camaradinha Matias, pois seu futuro é promissor.
não como sorveteiro, claro, mas como publicitário – afinal, me convenceu a querer muito uma merda que eu não precisava, e o que faz, 99,3% das vezes, a publicidade?
Z Carota é jornalista e escritor, autor de “a beleza que existe – crônicas com uma tonelada de leveza” (Páginas Editora) e “dropz” (Editora Penalux).