Paraná

Luta pela terra

Lideranças religiosas e políticas se unem em apoio ao acampamento Maila Sabrina

Com cerca de 400 famílias, a comunidade existe em Ortigueira, no Paraná, há 17 anos e vive sob ameaça de despejo

Curitiba (PR) |
Crianças e adolescentes moradores da comunidade levaram pães, grãos, frutas e legumes produzidos pelas famílias para serem abençoados
Crianças e adolescentes moradores da comunidade levaram pães, grãos, frutas e legumes produzidos pelas famílias para serem abençoados - Ednubia Ghisi e Wellington Lenon

As crianças e a religiosidade protagonizaram o ato político e inter-religioso realizado na comunidade Maila Sabrina, em Ortigueira (PR), no dia 12 de outubro. Dezenas de crianças e adolescentes moradores da comunidade levaram pães, grãos, frutas e legumes produzidos pelas famílias para serem abençoados durante o ato. A ação ocorreu em apoio à luta das 400 famílias do acampamento, que vivem na área desde 2003. Assim como cerca de sete mil famílias do estado, as agricultoras e agricultores do local sofrem a angústia da ameaça de despejo. 

O pastor David Gomes e a cantora gospel Elyssa Gomes vieram de Londrina especialmente para a atividade e emocionaram o público com canções sobre fé. O pastor Carlos Xavier, integrante do grupo Evangélicos Pela Justiça de Londrina, e a pastora Cleusa Caldeira, da Igreja Presbiteriana Independente de Paranavaí, também participaram do ato. 

"Nós precisamos, como pessoas de fé, estar junto com esse povo, porque esse aqui é o povo de Deus que está lutando pelo direito à habitação, de ter terra, de plantar, de cultivar, de colher aquilo que se plantou. Também de educar seus filhos [...]. É um povo brasileiro reunido e clamando por Justiça”, disse a pastora presbiteriana. 

Jocelda Oliveira, integrante da coordenação da comunidade e da direção estadual do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), recordou o esforço das famílias acampadas em construir tudo que há na comunidade. “Quem construiu as coisas, quem plantou cada árvore, foi o povo, foram as famílias. Hoje temos uma vida aqui na comunidade, uma vida social, de lazer, de fé, e nós temos que respeitar as questões da dimensão espiritual e humana”. 

A comunidade é exemplo de respeito à liberdade de crença, com igrejas de diversas denominações, entre católica, Deus é Amor, Assembleia de Deus, Congregação Cristã do Brasil. “Aqui todo mundo é aceito, todo mundo é respeitado, independente das diferenças religiosas, qualquer tipo de diferença. Nós temos a unidade que é a unidade na luta pela terra, para cada família ter sua casa, seu espaço pra produzir e ter comida”, garantiu a dirigente do MST.

Viabilidade da reforma agrária 

O Deputado estadual Professor Lemos (PT) apresentou dados que comprovam a viabilidade da reforma agrária no estado: “O Paraná tem 19 milhões de alqueires, tem dois milhões de alqueires sem título, sem escritura, sendo usadas indevidamente por fazendeiros. Terras que precisam ser devolvidas para fazer reforma agrária, conforme estabelece o Estatuto da Terra de 1964, e a Constituição Federal de 1988 [...]. Estamos certos do ponto de vista da nossa fé cristã, pois temos fundamentos da nossa bíblia, e também temos os fundamentos do Direito”.  

Roberto Baggio, integrante da direção nacional do MST, lembrou que o acampamento Maila Sabrina é o 5º maior distrito rural do Paraná, com mais habitantes do que 30 municípios do estado. 

Em 17 anos, a área se tornou uma pequena cidade, com escola, unidade de saúde, igrejas, mercado e centro comunitário. A diversidade e a produtividade são as marcas da agricultura e da pecuária no acampamento. Em 2018, foram colhidas 108 mil sacas de soja e milho; três mil sacas de feijão; 286 toneladas de arroz, abóbora, batata e legumes em geral; 900 toneladas de mandioca; 35 mil caixas de tomate, 8700 animais, entre bovinos, cabritos, cavalos e porcos. 

“A comunidade construiu aqui um projeto de vida, que transformaram esse espaço. Um projeto que é produto do trabalho das pessoas”, garantiu Baggio. 

Também participaram da atividade o militante dos Direitos Humanos Darci Frigo, da organização Terra de Direitos; o vereador Walter Souza (PTB), de Ortigueira; Maurício Barros, integrante do Sindicato dos Servidores Públicos Federais em Saúde, Trabalho, Previdência Social e Ação Social do Paraná (Sindprevs); e Claudio Oliveira, advogado do MST.  

Histórico da área

O território de 10.600 hectares, um dos maiores latifúndios do Paraná, era de devastação ambiental, pela produção de búfalo, sem cumprir os critérios de reserva legal. A área foi ocupada em 2003 e a ordem de reintegração de posse foi emitida no mesmo ano. A disputa jurídica segue desde então, e nos últimos meses as ameaças de despejo se intensificaram. 

A boa notícia veio há poucos dias, quando o governo federal se manifestou no processo jurídico pedindo sete meses de suspensão da liminar de reintegração de posse. 

 

Edição: Lia Bianchini