Minas Gerais

Caso Magnum

Mais uma vez, mídia condena sem provas

Polícia Civil de Minas Gerais inocentou um trabalhador acusado de abuso infantil

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |

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Cartazes colocados por estudantes em frente ao colégio
Cartazes colocados por estudantes em frente ao colégio - Foto: Reprodução

Nas últimas semanas, o suposto caso de abuso de uma criança de 3 anos tomou conta do noticiário. No dia 2 de outubro, a mãe de um aluno do Colégio Magnum, em Belo Horizonte, procurou a polícia para registrar um Boletim de Ocorrência contra um trabalhador da instituição. Em seguida outras denúncias contra o trabalhador também foram apresentadas. Ao todo, sete boletins foram registrados. Todos apontando para um mesmo suspeito: o ajudante de professor Hudson Nunes de Freitas, de 22 anos. Em duas semanas, os veículos da mídia comercial mineira divulgaram o caso endossando a conclusão de que o trabalhador não seria um suspeito, mas o culpado das acusações.

Na quinta (17), após uma intensa investigação, a Polícia Civil suspendeu as acusações contra o rapaz e decidiu pelo não indiciamento do suspeito por falta de provas. Mais de 41 pessoas foram ouvidas, inclusive as crianças envolvidas no caso. Além dos depoimentos, as investigações também contaram com vídeos de segurança da escola, a perícia no celular do suspeito e diversos exames de corpo de delito.

A equipe multidisciplinar da Polícia Civil destacou que as crianças envolvidas no caso provavelmente foram influenciadas, em seus depoimentos, por conversas entre os pais e principalmente pela cobertura da midiática do caso. A Polícia Civil afirma ainda que nunca expôs o nome do investigado, nem mesmo da instituição de ensino ou das supostas vítimas.

“Nós percebemos ao longo da investigação que tiveram alguns fatores externos que podem ter interferido no relato das crianças. Como a ampla divulgação do caso na mídia e a grande repercussão nas redes sociais, além da conversa entre os pais”, explica Elenice Cristine Batista Ferreira, Chefe da Divisão Especializada de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente e uma das responsáveis pelo caso.

Na avaliação de Lina Rocha, diretora do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, a condenação prévia da mídia desnuda a falsa imparcialidade pregada pelos veículos de comunicação. “Esse tipo de abordagem é totalmente exploratória da mazela humana. O papel ético da imprensa tem que ficar muito bem definido, porque de uma forma ou de outra somos condutores do ponto de vista da população”, ressalta.

Aliviado com o resultado das investigações, o estagiário, que desde o início do processo afirmou sua inocência, agora reflete sobre a repercussão dada ao acontecimento. “A mídia tem que averiguar, ser cautelosa na hora de dar uma notícia e expor o nome de uma pessoa”, diz.

O inesquecível caso da Escola Base

Essa não é a primeira vez que a busca irresponsável por audiência assola a vida de inocentes. Em 1994, quatro pessoas que trabalhavam na Escola Base - instituição de ensino privada, sediada em São Paulo - foram acusados de cometer abusos sexuais contra crianças de quatro anos. Á época, o comportamento da imprensa foi ainda mais feroz do que o conferido à Hudson.

Por causa da repercussão da mídia, a Escola Base teve que fechar as portas. No ano seguinte, em 1995, os quatro acusados entraram com processos contra diversos meios de comunicação, como a Folha de S. Paulo e a Rede Globo, por danos morais.

Atualmente eles convivem com diversas consequências do caso, como  estresse e fobia, cardiopatia. O caso, que virou um livro, se tornou um ícone de exemplo a não ser seguido. Para Lina Rocha, mais uma vez se torna mais que necessária uma autocrítica da mídia sobre sua atuação “O que a gente vê é se repetir a história. É muito importante que a imprensa faça essa análise crítica sobre a seu papel na condução das reportagens e das denúncias que são apuradas todo dia”, aponta.

Edição: Joana Tavares