ENTREVISTA

“É um caso de perseguição”, diz jornalista preso após defender embaixada venezuelana

Jornalista estadunidense Max Blumenthal conversou com Brasil de Fato sobre prisão e acusações

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |
Editor do portal The GrayZone foi detido por dois dias sem receber intimações prévias e acusa polícia de perseguiçã política
Editor do portal The GrayZone foi detido por dois dias sem receber intimações prévias e acusa polícia de perseguiçã política - Peoples Dispatch

O jornalista investigativo estadunidense Max Blumenthal foi preso no dia 25 de outubro e ficou detido durante dois dias por supostamente ter agredido uma opositora venezuelana em frente à sede diplomática venezuelana, em maio deste ano. Em entrevista ao Brasil de Fato, ele afirma que a denúncia é completamente falsa.

Blumenthal dirigiu o documentário Killing Gaza, que relatou o massacre da população palestina por parte do exército de Israel na região da Faixa de Gaza, e foi premiado em 2014 pela Fundação Lannan pela obra Goliath: Life and Loathing in Greater Israel. Também é autor de quatro outros livros: AlternNet, The Daily Beast, Al AkhbaMedia Matters for America.

Em 2015, Blumenthal fundou o portal The GrayZone, em que são publicadas reportagens investigativas sobre as operações do establishment estadunidense em países da América Latina e do mundo.

Neste ano, ele e outros repórteres da equipe do GrayZone passaram a cobrir as relações entre as ações do deputado opositor venezuelano Juan Guaidó e o governo de Donald Trump. Publicaram uma série de reportagens, defenderam o governo venezuelano e denunciaram as fake news produzidas pelos Estados Unidos nas Nações Unidas. Também fizeram parte do coletivo de defesa da embaixada da Venezuela em Washington, que impediu, durante semanas, a ocupação do edifício pela equipe nomeada pelo opositor Juan Guaidó.

Na entrevista, Blumenthal conta a sua versão dos fatos.

Brasil de Fato: Algumas coisas não estão claras sobre a sua prisão. Quantos policiais estavam envolvidos na operação? Por quantas horas você esteve incomunicável? Como você pôde ser solto? E você ainda enfrenta algum processo judicial?

Max Blumenthal: Eu fui preso duas sextas-feiras atrás, às 9 horas da manhã, por uma equipe da polícia do Distrito da Colúmbia. Eles disseram que tinham um mandado de prisão por agressão simples, que é uma contravenção penal, não um crime grave. Mas eu fui fichado, por algum motivo, como um suspeito "armado e perigoso", ainda que eu não tenha armas e não exista nenhum tipo de registro de que eu tenha representado perigo.

Apenas 3% dos mandados de prisão nos Estados Unidos contêm esse tipo de qualificação, e são emitidos para pessoas que já tenham antecedentes por homicídio ou violência. Então, é um cenário bastante perigoso.

Os policiais ameaçaram derrubar a minha porta se eu não permitisse a sua entrada, deram cerca de 2 minutos para eu me vestir. Fui algemado, colocado dentro de uma van e levado, primeiro para a delegacia do meu bairro e, depois, para o centro de fichamento.

Fiquei detido em várias celas com outros prisioneiros durante dois dias, enquanto esperava uma audiência, quando eu poderia falar com um juiz, algo muito pouco usual.

Não é legal ficar preso. Houve um momento em que fiquei com os pés e as mãos algemados por cinco horas, em um lugar muito frio, aguardando para ver um juiz. Eu fui liberado sem necessidade de prestar fiança, apenas com o compromisso de comparecer em juízo.

A denúncia de agressão simples é normalmente derrubada, mas o governo parece querer avançar no processo. Então eu vou a juízo provavelmente em março.

Não me deixaram ligar para o meu advogado enquanto eu estava detido. Foi apenas porque minha companheira, Anya, testemunhou minha prisão que eu pude receber um advogado. Essa é uma violação da Constituição.

É importante apontar que eu fui preso com um mandado judicial por um suposto incidente de cinco meses atrás e, nesses meses, eu vi você na Venezuela, eu pude sair do país, o que significa que não existia um mandado de prisão para mim até pouco tempo atrás, o que é muito incomum.

O que aconteceu nesse dia na embaixada? Você confirma que teve algum tipo de confronto com a opositora venezuelana?

Com relação ao incidente descrito nos documentos judicias, a única coisa que posso dizer é que os fatos falarão por si próprios, se o governo quiser levar essa mentira a julgamento.

Então você acredita que tudo faz parte de uma perseguição? Como você pretende denunciar essa situação?

É absolutamente um caso de perseguição política. Eu fui falsamente acusado de um crime, por um elemento da oposição de direita da Venezuela que eu e meu veículo, The GrayZone, temos exposto como violento e corrupto durante todo o ano.

Quem fez essa acusação falsa sabia quem eu era e usou o governo federal [dos Estados Unidos] e a polícia local como um instrumento de revanche, algo que me colocou numa situação de perigo, com essa equipe de policiais armados aparecendo na minha porta para executar um mandado, no qual sou qualificado falsamente como sendo "armado e perigoso".

Então isso é perseguição política de um jornalista e vingança política de um movimento de direita antidemocrático. A polícia do Distrito de Colúmbia não tentou de forma alguma investigar essa denúncia falsa antes de executar o mandado.

Isso faz parte de uma campanha maior contra o GrayZone e contra os anti-imperialistas da mídia ocidental – não querem apenas demonizá-los, mas usar o sistema jurídico contra eles.

Qual é o objetivo do governo Trump com a sua prisão? Você acredita que existe algum interesse eleitoral?

Eu acredito que precisamos de mais documentos para determinar qual o nível de colaboração entre o governo Trump e a oposição de direita da Venezuela. Mas é muito claro que a oposição de direita venezuelana, que é paga pelo governo dos Estados Unidos -- Carlos Vecchio, o falso embaixador venezuelano, tem seu salário pago pela USAID [Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional] --, pressionou consistentemente o Departamento de Justiça [dos EUA] para me processar por algo que nunca fiz. Eles forjaram e inventaram uma mentira sobre mim para poder usar o sistema judicial para me processar e me silenciar.

Eu já disse que eles querem roubar um país, tentaram roubar uma embaixada aqui em Washington e agora querem roubar minha liberdade.

Edição: Cris Rodrigues