Conservadorismo

Saiba quem é "Macho" Camacho, líder do golpe na Bolívia e aliado de Ernesto Araújo

O presidente do Comitê Cívico de Santa Cruz se gaba de ser quem teria conseguido unir as forças da oposição contra o MAS

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Chanceler brasileiro Ernesto Araújo, deputada federal Carla Zambelli (PSL) e Luis Fernando Camacho
Chanceler brasileiro Ernesto Araújo, deputada federal Carla Zambelli (PSL) e Luis Fernando Camacho - Reprodução

Este texto foi publicado originalmente no La Izquierda Diario Bolivia antes da consumação do golpe de Estado.

Este personagem começou a tornar-se popular no marco das mobilizações contra o que a oposição qualificação como uma “fraude descomunal” que teria concedido por uma mínima diferença a vitória ao binômio do governo para um quarto mandato. Luis Fernando Camacho como presidente do Comitê Cívico de Santa Cruz foi o primeiro a convocar a paralisação cívica. Da mesma forma, se gaba de ser quem teria conseguido unir as forças da oposição contra o MAS. Em um tuíte de 22 de outubro apontou que: "No movimento cívico encabeçado pela minha pessoa, conseguimos unir as forças políticas de oposição ao MAS."

Luis Fernando Camacho é advogado, tem 40 anos e é presidente do Comitê Cívico pro Santa Cruz. É empresário e acionista do grupo Nacional Vida S.A., do qual sua família é proprietária.

O Grupo Empresarial de Investimentos Nacional Vida S.A. de que Camacho é acionista, como se lê em seu site, mantém investimentos de forma direta ou indireta em diferentes companhias: Nacional Seguros Vida e Saúde; Nacional Seguros Patrimoniais e Garantias; Conecta; Tecorp; Xperience; Fenix Seguros; e de projeto de Clínica Metropolitana das Américas.

Segundo a revista digital “La Resistencia Bolívia” (próxima ao governo), para dar conta do nível aproximado de patrimônio deste grupo empresarial, difundiu informação de que o Camacho pai comprou a empresa paraguaia Fenix de Seguros e Resseguros por US$ 3,7 milhões de dólares para expandir seus negócios e chegar a países como Paraguai, Chile e Argentina.

Segundo a mesma fonte, o Camacho pai “era o dono da empresa que teve o monopólio da distribuição de gás em Santa Cruz, Sergas, e cidades próximas como Montero e Warnes por 20 anos, desde 1989 até 2009. Concessão dada nos processos de capitalização e privatização pelos governos neoliberais”.

Há alguns meses, no dia 31 de julho, tornou-se conhecida uma denúncia contra Luis Fernando Camacho por estar vinculado ao caso dos “Panamá Papers”. Esta informação foi vazada pelo diário opositor ao governo, Página Siete, dando conta do Relatório de Conclusões da Comissão Especial de Investigação dos "Papéis do Panamá" que aponta Luis Fernando Camacho como intermediário, a partir da criação de três sociedades (Medis OverseasCorp., NaviInternational Holding e Positive Real Estates) para “ajudar pessoas e empresas a esconder suas fortunas em entidades offshore, lavar dinheiro e estabelecer esquemas de evasão de impostos".

Esta publicação também destacou que tal relatório foi entregue na Assembleia Legislativa, momento do qual participaram a presidenta do Senado, Adriana Salvatierra, e o ministro de Comunicação, Manuel Canelas. Este último foi membro da comissão responsável pela revisão do caso “Panamá Papers” quando era deputado.

Também se difundiu nas redes sociais a informação de que Camacho teria dívidas milionárias de impostos com o Estado relacionadas a suas empresas. Como resposta a estas denúncias, Camacho em uma entrevista publicada no Infobae disse que seu envolvimento no Panamá Papers é porque o governo que deve a ele vários milhões de dólares.

Entre todas estas versões, o certo é que Luis Fernando Camacho é um individuo que tem negócios importantes e é parte do núcleo empresarial do país. Isto se observa em suas convocatórias aos conselhos, chamando os empresários, a Câmara de Indústria, Comércio, Serviços e Turismo de Santa Cruz (Cainco) e a Câmara Agropecuária do Oriente (Cao) para que o respaldem.

O “macho Camacho”

Este personagem reconhecido como um “macho” seria qualificado assim porque para muitos de seus adeptos ele tem “coragem”.

Em recentes declarações, ele sinalizou que para garantir a paralisação cívica teria que seguir exemplo de Pablo Escobar. “Temos que fazer [a paralisação], superando as diferenças e tirando a agenda como fazia Pablo Escobar, mas só para anotar os nomes dos traidores deste povo, porque queremos que amanhã sejam presos, mas não por rancor e ódio, mas por justiça”.

Desta maneira, o “democrata” Camacho recorre às mesmas técnicas de amedrontamento e perseguição política que disse combater. Em consonância com esta política, pode-se ver na cidade de Santa Cruz, em um vídeo difundido nas redes, como ele obrigou uma mulher a pedir perdão de joelhos por ter manifestado sua posição contrária à paralisação cívico. Houve também o avanço de manifestações racistas contra collas* e indígenas.

Camacho, além de ser um proeminente membro da elite empresarial de Santa Cruz, é um fanático religioso que encoraja a oração e proclama sua fé em Deus em cada ponto de bloqueio e oportunidade que tem. Isso permitiu que ele alinhasse em seu entorno todas as forças clericais e anti-direitos, como as que se expressaram durante a campanha eleitoral, que buscavam criminalizar a homossexualidade e penalizar o direito ao aborto.

Carlos Mesa, da Comunidade Cidadã, e diversos integrantes do movimento opositor começaram a sentirem-se incômodos com a direção de Camacho. Eles percebem um perigoso rumo “extremista” nesse cenário de crise. Não nos esqueçamos que uma semana atrás Camacho, junto com Carlos Mesa e outros políticos e referências da oposição de direita, criaram a "Coordenadoria de Defesa da Democracia".

Isso durou apenas alguns dias, pois quase imediatamente os comitês cívicos radicalizaram suas medidas e resolveram que "liderariam todos os movimentos no país por decisão dos conselhos" e colocaram que "se Mesa, os partidos ou seus representantes quisessem aderir, deveriam fazê-lo como cidadãos, pois o movimento nacional era cívico-cidadão".

Um exemplo desta radicalidade foi vista no encontro cívico nacional realizado em 2 de novembro em Santa Cruz, aos pés do Cristo Redentor, onde Camacho deu um prazo de 48 horas para que Evo Morales renunciasse.

Tanto o governo como a oposição desde o primeiro momento se responsabilizam mutuamente por incitar a violência. Assim também se responsabilizam de incitar o racismo. Voltam a emergir os problemas de uma Bolívia profundamente racializada e que toda a demagogia “plurimulti” adotada a partir do Estado pelo MAS e com algumas reformas formais não puderam erradicar, mas que as mesmas se encontravam latentes como mostram seu florescimento na crise atual.

* Kollas ou Collas é a denominação para o conjunto dos povos indígenas originários da região do noroeste da Argentina.

 

 

 

Edição: Esquerda Diário