Pernambuco

TRABALHISTA

“A estabilidade do serviço público é um instrumento de defesa da sociedade”

Presidente do Sindsemp/PE fala sobre o processo de precarização que o serviço público vem enfrentando

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Fernando Ribamar é presidente do Sindicato dos Servidores do Ministério Público de PE (Sindsemp/PE)
Fernando Ribamar é presidente do Sindicato dos Servidores do Ministério Público de PE (Sindsemp/PE) - Divulgação

O I Congresso de Servidores do Ministério Público de Pernambuco aconteceu em Recife entre os dias 7 e 11 de novembro. Esta é a primeira edição do evento, que trouxe como tema: “Superando a precarização do trabalho no serviço público”. O I Congresso foi realizado pelo Sindicato dos Servidores do MPPE (Sindsemp/PE). Em entrevista ao Brasil de Fato, Fernando Ribamar, presidente do Sindsemp/PE falou sobre a importância de denunciar a precariedade das condições de trabalho e sobre os desafios para os servidores públicos no contexto atual da política brasileira.

Esse é o I Congresso dos Servidores do Ministério Público de Pernambuco. Qual a importância dele?

Então, é o nosso primeiro congresso em 20 anos de história do sindicato. Ele tem uma importância muito grande, tanto na perspectiva de organização dos trabalhadores do Ministério Público, que precisam se atualizar para poder atuar nos próximos anos, como também na perspectiva de debater o tema da precarização do trabalho no serviço público, porque a gente entende que é um tema atual, que está alcançando os trabalhadores, a sociedade, neste momento. A gente precisa gerar um acúmulo a respeito disso, para poder compreendê-lo e pensar como enfrentá-lo.

Como tem sido feito o debate da precarização do serviço público nesse último período? O que vocês têm percebido?

A gente percebe que, depois das Jornadas de Junho de 2013 e do Golpe de 2016, com uma sucessão de governos no pós-golpe, os ataques aos trabalhadores de um modo geral, e aos servidores públicos de um modo particular, se tornaram mais intensos. Nesse contexto, a gente, enquanto servidores do Ministério Público, começou a se reorganizar a partir de 2015, criando, primeiro, um Fórum Regional dos Trabalhadores dos Ministérios Públicos e, depois, uma Federação Nacional para representar esses trabalhadores. Nesse processo, a gente vem observando essa necessidade de debater melhor a questão da precarização. A gente vê que os diversos ministérios públicos estaduais possuem problemas semelhantes e apontam soluções semelhantes, que são sempre as de precarização do trabalho, de substituir servidores efetivos por trabalhadores em condições precárias de alguma maneira, seja por terceirizados, cargos comissionados, estágios de pós-graduação, e assim por diante. Essa compreensão de dentro do Ministério Público nos levou a entender o tema de uma forma também para além dele.

Existe um discurso de que o servidor público detém privilégios e é improdutivo, que reforça a privatização das empresas públicas. Como você interpreta esse discurso?

Existe uma pequena camada de servidores públicos que tem posições de remuneração que se diferenciam da média dos trabalhadores. Mas, a gente não pode colocar todos os servidores públicos nesse “pacote” e nem entender isso como privilégio. Você pegar, por exemplo, uma carreira da magistratura ou do Ministério Público, essa pessoa que vai atuar nessa função de aplicador da Justiça e defensor do Estado de Direito vai ser impedida de atuar profissionalmente em qualquer outra área, a não ser como professor. Em comparação com a realidade do mercado, esse trabalhador é visto como privilegiado, mas essa é uma construção feita pelo mercado no sentido de desmontar o Estado de Direito. Os verdadeiros privilegiados são os banqueiros, os donos do dinheiro, não somos nós.

Vocês já visualizam os impactos de medidas aprovadas nos últimos anos, como a Terceirização Irrestrita de Temer e a Reforma da Previdência de Bolsonaro?

Essa Reforma da Previdência usou do discurso de combater privilégios para reduzir direitos. Ela não se sustenta, ela é toda falha e baseada em falsidade argumentativa, cálculos falsos e premissas falsas. Os privilégios da aposentadoria não foram combatidos de verdade. Foram excluídos da reforma aquelas pessoas que efetivamente têm situações bem mais favoráveis de acesso à aposentadoria. Com relação aos impactos que essa reforma já vêm trazendo às instituições, aqui no Ministério Público já existe uma perspectiva de cerca de 70 membros se aposentarem em razão dessa PEC da Previdência, porque eles não querem perder direitos e vão se aposentar, o que deve atrapalhar o condicionamento da instituição que vai perder uma grande quantidade de força de trabalho, sem ter aumento de orçamento. A terceirização irrestrita também não chegou ainda de maneira intensa, mas já é percebida em alguns planos de substituição de postos que hoje são ocupados por servidores efetivos.

Bolsonaro apresentou uma proposta de Reforma Administrativa que pretende acabar com a estabilidade do serviço público. Qual a sua opinião sobre essa questão?

Essa questão da estabilidade é colocada para a sociedade como uma ferramenta de defesa do servidor. Mas, na realidade, a estabilidade do serviço público é um instrumento de defesa da sociedade. Por meio do acesso via concurso público e da estabilidade via servidores, foi que se acabou com a prática patrimonialista que havia no Estado Brasileiro e que muita gente quer fazer com que volte, de servidores que em vez de servirem à sociedade e às instituições, passem a servir aos gestores. O que acontecia antes era que cada gestor contratasse os seus para assumir cargos públicos. As relações que havia entre servidores e gestão eram pessoas. A estabilidade e o concurso público serviu para quebrar essa apropriação do Estado pelos gestores. Essa medida do governo, mais uma vez, usa premissa falsa para fragilizar direitos e colocar como combate a privilégios.

Na última quinta-feira (7), foi publicada uma resolução nº 96 no Diário Oficial da União, que determina que os trabalhadores do serviço público que forem a eventos sindicais terão que compensar as horas. O que essa medida significa para você?

Não me surpreende, vem ao encontro de outras medidas desse governo de restringir e dificultar a ação sindical. Esse governo tem uma característica, colocada desde o início, de que a sociedade organizada é vista como perigosa e deve ser combatida. Eu entendo que a única condição que nós temos como trabalhadores, de fazer valer nossos direitos, é nos organizando. Se não lutarmos juntos para defender nossos direitos, ninguém fará por nós.

Edição: Monyse Ravenna