São Paulo

Defensoria Pública pede a suspensão de reintegração de posse no Jaraguá

Guaranis ocupam a região para impedir a construção de condomínio ao lado de terra indígena

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Os indígenas guarani ocupam o espaço para impedir o desmatamento da região - José Eduardo Bernardes

A Defensoria Pública da União (DPU), em São Paulo, solicitou, nesta quinta-feira (6), a suspensão da liminar que pede a reintegração de posse de uma área vizinha à Terra Indígena (TI) do Jaraguá ocupada por guaranis desde o dia 30 de janeiro deste ano. A construtora Tenda Negócios Imobiliários, proprietária do território, pediu a reintegração nesta terça-feira (4), que foi aceita no mesmo dia pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. 

Segundo o artigo 109 da Constituição Federal, compete aos juízes federais processar e julgar “a disputa sobre direitos indígenas”. Foi com esse fundamento que, no pedido de anulação da ação, o defensor regional de Direitos Humanos, João Paulo Dorini, afirmou que o órgão estadual não tem competência para analisar o pedido da incorporadora, uma vez que questões indígenas devem ser tratadas diretamente no âmbito federal.

O defensor também citou o artigo 63 do Estatuto do Índio, que garante que “nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse” de Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio”, o que não foi respeitado pelo tribunal paulista. 

Para Dorini, “trata-se de típica disputa que envolve direito indígena”. “Estamos lutando para que isso [a reintegração de posse] não ocorra antes de conseguirmos a revogação da liminar”, afirmou o defensor. 

Thiago Karai Jekupe, liderança guarani de 23 anos, defende que a preocupação ambiental deve se sobrepor ao lucro no que diz respeito à preservação do Pico do Jaraguá. "Ele é o pouco de Mata Atlântica que sobrou na cidade de São Paulo. Hoje a população no mundo luta em defesa do meio ambiente porque sabe que sem as florestas, a gente não tem vida. Sem a água, a gente não tem vida. Sem as abelhas nativas, a gente não tem vida, não tem alimento. Então está todo mundo preocupado com o meio ambiente. Aí a Prefeitura de São Paulo se preocupou com o lucro. E quando a gente tiver muito lucro e não tiver mais mata?”.

 

Desmatamento

A Tenda é responsável pelo desmatamento de árvores na região para a construção do condomínio Jaraguá-Carinás, com cinco torres e 396 apartamentos, para cerca de 800 moradores, a oito metros da aldeia Tekoa Ytu –  única das seis aldeias da região que está na fase final do processo de demarcação da terra indígena. As outras cinco tem a originalidade indígena reconhecida por uma portaria interministerial. 

Pelo fato da construção estar a menos de oito quilômetros de uma terra indígena, os responsáveis pelo empreendimento deveriam levar em conta o componente indígena no processo de licenciamento, como garante a Portaria Interministerial 60, de 2015.

A consulta prévia aos povos também é assegurada por normas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.

A área também é protegida por ser considerada parte da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de São Paulo pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), desde 1994, abrigando um dos últimos pontos de Mata Atlântica da região.

De acordo com a  Prefeitura de São Paulo, que se manifestou em nota, existe um Termo de Compromisso Ambiental firmado junto à Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) "que prevê ao todo a supressão de 528 exemplares arbóreos e a compensação ambiental com o plantio de 549 mudas no local". Ainda segundo a prefeitura, o termo determina a doação de 1.099 mudas para viveiros municipais. Um ofício denunciando o empreendimento foi entregue à SVMA. A própria secretaria foi até o local, constatou irregularidades e suspendeu a licença, na última sexta-feira (31). 

Em nota ao Brasil de Fato, a construtora Tenda afirmou que “todos os procedimentos necessários para a legalização do empreendimento foram adotados, cumpridos e aprovados por órgãos competentes”. 

Edição: Leandro Melito