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O coronavírus, a crise econômica, e a janela histórica para superar o neoliberalismo

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No Brasil, no entanto, seguimos aplicando de forma acentuada os ditames do neoliberalismo, comprometendo vidas e nossas futuro econômico - Angela Weiss / AFP
A crença no livre mercado e no equilíbrio fiscal, com forte contração do gasto público, estão – nova

Antes qualquer análise, é importante atentar que, desde 2008 – pelo menos –, a economia mundial vem dando sinais de desaceleração. A média de crescimento econômico mundial não superava os 2,5%, atestando um profundo processo de desaceleração da atividade produtiva, conforme texto elaborado pelo Grupo de Estudos e Acompanhamento da Conjuntura Econômica (GEACE).

No Brasil, o cenário já era de relativa estagnação econômica, com baixíssimo crescimento anual; queda acentuada nos investimentos (o que determina, em última instância, a capacidade futura de crescimento); subutilização da força de trabalho; alto nível de desemprego e queda da renda média dos trabalhadores.

Portanto, as previsões desastrosas para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2020 não poderão ser creditadas, unicamente, ao fenômeno do coronavírus, na medida em que já estávamos sob forte contração do investimento e do gasto público, com efeitos importantes sob os demais indicadores da atividade econômica.

Estamos, atualmente, sob uma possibilidade de emergência de uma “janela histórica”. A crença do auto ajustamento do livre mercado e as teses de manutenção do equilíbrio fiscal, com forte contração do gasto público, estão – novamente – em xeque.

Esses períodos de crise e/ou baixo crescimento econômico mundial, ensejam oportunidades de apontamento de novas saídas políticas e econômicas.

Vejamos exemplos na história recente: 

a) A grande depressão do fim do século XIX criou as condições para a emergência de um novo padrão de dominação mundial, tanto do ponto de vista político, com a emergência do fenômeno do imperialismo, como do ponto de vista econômico, com uma brutal concentração e centralização de capital que levaram ao surgimento do grandes monopólios e abriram espaço para políticas estatais que dispensaram o liberalismo do passado e constituíram um intervencionismo imperial;

b) O período que contempla o entre guerras e o findar da segunda guerra mundial, questiona o padrão do capitalismo desregulado e ainda relativamente liberal, e vê a emergência de um novo acordo internacional, pautado nos fluxos de capitais, no câmbio fixo e necessidade da edificação de Estados Nacionais comprometidos com o bem-estar social e o pleno emprego;

c) A crise dos anos 1970, no entanto, foi palco para o soerguimento de um novo tipo de liberalismo sintetizado no Consenso de Washington, pautado na ideia de equilíbrio fiscal, na ineficiência do Estado e na retomada da crença do livre mercado.

Dessa forma, muito embora o neoliberalismo já fosse uma teoria consolidada do ponto de vista econômico, com sua elaboração ainda na década de 1950, ele só ganhou corpo a partir da emergência de uma “janela histórica” que se abriu a partir do questionamento dos Estados de bem-estar social mediante a crise dos anos 1970.

Assim compreende-se, também, o emergir de figuras de direita e extrema direta de partidos não tradicionais na cena política mundial, uma vez que estamos – mais uma vez – numa crise das promessas do neoliberalismo. A esquerda, no entanto, não tem conseguido aportar uma resposta que nos recoloque como uma alternativa real de poder.

Para que os países não mergulhem em uma forte depressão econômica no próximo período e para que não sofram uma brutal escalada das mortes advindas da pandemia, urge a necessidade de dispensar os dogmas neoliberais e retomar a capacidade do Estado e dos bancos públicos de conduzirem uma nova rota de política de econômica, pautada – sobretudo – na política fiscal e monetária. 

No Brasil, no entanto, seguimos aplicando de forma acentuada os ditames do neoliberalismo, comprometendo vidas e nossas futuro econômico. É hora de um novo consenso político, que explicite que para sair da atual crise brasileira – mas, sobretudo para que ela não se aprofunde e ganhe dimensões sociais inestimáveis – o Estado vai precisar gastar.

Só o Estado, em uma situação como essa, tem condições de exercitar um gasto autônomo, que independe do nível de renda, por meio do aumento da dívida pública, ampliando o gasto social, provendo crédito subsidiado, suspendendo as cobranças de tarifas públicas e aportando dinheiro suficiente para garantir a renda daqueles mais prejudicados, sobretudo os trabalhadores desempregados, desalentados e do mercado informal, assim como as pequenas e médias empresas. 

Edição: Rodrigo Chagas