intransigência

Casa Branca impede retorno de mais de 500 venezuelanos que estão nos Estados Unidos

Por conta do bloqueio econômico, governo bolivariano não está autorizado a enviar voos para território estadunidense

Brasil de Fato | Blumenau (SC) |

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Governo disponibilizou voos da companhia estatal Conviasa para repatriar 524 cidadãos que pediram ajuda - Divulgação

O bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos à Venezuela desde 2015 está impedindo o governo venezuelano de resgatar 524 cidadãos que se encontram em solo estadunidense e querem voltar para casa.

O bloqueio impede que companhias aéreas da Venezuela aterrissem nos Estados Unidos, país que apresenta o maior número de infectados no mundo, com quase 86 mil casos.

Segundo o governo do presidente Nicolás Maduro, está tudo pronto para ir buscar os venezuelanos. “O governo dos Estados Unidos insiste no seu bloqueio aéreo contra o povo venezuelano. Ainda com o pedido público dos passageiros para permitir um voo, as autoridades não mudam de posição. Eles não se importam com a dor das pessoas”, afirmou o vice-ministro de Relações Exteriores para a América do Norte, Carlos Ron Martínez.

Para resgatar seus cidadãos ilhados pelo mundo por conta da pandemia de covid-19, o governo bolivariano lançou uma nova edição do Plan Vuelta a La Patria (Plano de Volta à Pátria), com voos da companhia aérea Conviasa. Dessa forma, 100 pessoas puderam voltar, na última quarta-feira (25), da República Dominicana.

O Executivo venezuelano disponibilizou um questionário online, por meio do qual cidadãos em qualquer parte do mundo poderiam solicitar apoio. No caso dos Estados Unidos, em apenas dois dias, mais de 500 pessoas responderam ao questionário.

Prejuízos

Por conta das sanções econômicas, segundo a organização não governamental Sures, o bloqueio pode ter gerado um prejuízo de 114 bilhões de dólares. A começar pelo congelamento dos ativos da CITGO Petroleum – sede da petroleira estatal venezuelana PDVSA nos Estados Unidos –, o que representou um patrimônio de US$ 7 bilhões (cerca de R$ 35 bilhões).

Também desde 2018, a administração Trump suspendeu as importações de petróleo venezuelano, o que representava cerca de 35% das exportações petroleiras do país.

“A situação já era bastante grave antes da pandemia. Nós não temos acessos a créditos internacionais, não temos os ingressos da CITGO, apropriada pelo governo dos EUA e pela oposição venezuelana. Não temos possibilidade de negociar a dívida externa, tampouco podemos ter acesso a cerca US$ 33 bilhões que estão depositados em outros bancos, porque o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos nos impede”, afirma Roy Daza, deputado da Assembleia Nacional Constituinte (ANC).

Para o analista, a economia venezuelana, que já está em crise, com um PIB que reduziu em 64,2% em quatro anos, segundo dados do Banco Central, será ainda mais afetada com a quarentena total e paralisação dos serviços – medidas necessárias para conter o avanço da covid-19.

“Acredito que será um ensinamento da capacidade de resistência, de organização e disciplina do povo venezuelano. Se conseguirmos direcionar essa capacidade de trabalho, de abnegação que nosso povo está demonstrando nesse momento, nós poderemos recuperar nossa economia com ou sem bloqueio”, garante Daza.

 


“O governo dos Estados Unidos mostra uma posição inumana, atacando um direito dos venezuelanos de maneira insólita”, afirma Roy Daza / El universal

Pedido à ONU

Não é apenas a Venezuela que sofre com a aplicação de medidas coercitivas pela Casa Branca. Por isso, representantes dos governos venezuelano, iraniano, sírio, cubano, chinês, russo, norte-coreano e nicaraguense enviaram um pedido ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Antônio Guterres, pedindo ajuda do organismo internacional para pressionar pelo fim das sanções.

 

Nessa semana o secretário geral da ONU já havia se manifestado a favor do levantamento das medidas punitivas durante a pandemia de covid-19, enviando uma carta ao G20 – grupo das 20 maiores potências do mundo – afirmando que é tempo de “solidariedade e não de exclusão”.

A alta comissionada de direitos humanos das Nações Unidas, Michelle Bachelet, endossou o pedido. “As sanções econômicas deveriam ser atenuadas ou suspendidas, tanto por razões de saúde pública, como para reforçar os direitos e defender a vida de milhões de pessoas. As medidas que obstaculizam a importação de insumos médicos essenciais causariam prejuízos duradouros nas comunidades mais vulneráveis”, afirmou a ex-presidenta chilena na última terça-feira (24).

O Parlamento Latino-americano e Caribenho (Parlatino) também aprovou uma moção que exige o fim do bloqueio contra Cuba e Venezuela e um pedido dirigido ao Fundo Monetário Internacional (FMI) de suspensão do pagamento da dívida externa para todos os países da região, que, segundo a Comissão Econômica para América Latina (Cepal), representam 42,3% do PIB mundial.

 

 

Enquanto isso, a Organização Mundial da Saúde e a Organização Pan-americana da Saúde enviaram ajuda financeira e médica para a Venezuela, uma das 20 nações que receberão esse tipo de ajuda da OMS.

“Queremos dizer que nós não estamos sozinhos. A presença dos médicos cubanos, também as pontes aéreas de Moscou e Beijing até Caracas, são fatos concretos que revelam que no mundo ainda existe a solidariedade e a cooperação entre os povos e nós fazemos parte desse mundo”, conclui Roy Daza.

Novos ataques

Na última quinta-feira (26), o procurador-geral dos Estados Unidos, William Barr, apresentou uma denúncia contra 13 cidadãos venezuelanos por supostos crimes de lavagem de dinheiro, tráfico de armas e narcotráfico.

Apesar de não apresentar provas, o Departamento de Justiça estadunidense chegou a oferecer uma recompensa de US$10 milhões pela captura dos ex- militares Clíver Alcalá e Hugo Carvajal — opositores e participantes de planos de desestabilização contra o governo Maduro —, do presidente da ANC, Diosdado Cabello, e do vice-presidente de Economia, Tarek El Aisami.

O governo bolivariano publicou um comunicado repudiando a denúncia. "Num momento em que a humanidade enfrenta a mais feroz das pandemias, o governo de Donald Trump volta a arremeter contra o povo venezuelano e suas instituições democráticas, utilizando uma nova modalidade de golpe de Estado, baseado em acusações miseráveis, vulgares e infundadas ", afirma.

 

 

Para o ex-deputado do Parlatino pelo PSUV, Roy Daza, a denúncia chega num momento em que se consolida o isolamento do deputado opositor Juan Guaidó no cenário político interno venezuelano e de dificuldades de Donald Trump para enfrentar a pandemia de covid-19 e manter seu apoio num cenário pré-eleitoral.

“É um passo da agressão do governo Donald Trump contra Venezuela. Não existe a menor dúvida de que a diminuição da popularidade de Trump pela sua ineficácia ante a pandemia do novo coronavírus fez com que agora ele buscasse desviar a atenção com essas acusações. É uma denúncia ridícula das autoridades norte-americanas. Essas autoridades deveriam estar preocupadas em nos devolver CITGO, levantar as sanções, buscar cooperação para atender essa pandemia”.

Na última quarta-feira (25), o presidente Nicolás Maduro convocou uma nova reunião do setor de saúde da mesa de diálogo nacional entre governo e representantes da oposição.

“Na política interna, Guaidó já não representa nenhuma voz importante. Sua única validez política é ser um agente do senhor Trump no nosso país. Todos os políticos de oposição, com exceção do pequeno grupo que acompanha Guaidó, não estão apenas respaldando as medidas do presidente Maduro, mas também estão oferecendo cooperação, atuando conjuntamente. Hoje a Venezuela talvez esteja vivendo um dos períodos de maior unidade nacional das últimas décadas”, finaliza.

 

Edição: Vivian Fernandes