Rio Grande do Sul

Educação

Governo Eduardo Leite muda regras para adicional de difícil acesso nas escolas

Para o CPERS a ação é desumana e traiçoeira, uma vez que muitas escolas que não terão como reorganizar os funcionários

Sul 21 | Porto Alegre |
"Temos professores que percorrem cerca de 70 quilômetros para ir trabalhar na sua escola e que perderão o difícil acesso", destaca Helenir - Fabiana Reinholz

A presidente do Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul (CPERS Sindicato), Helenir Aguiar Schürer, denunciou na manhã desta sexta-feira (17) que a decisão do governo Eduardo Leite (PSDB) de alterar as regras de pagamento da gratificação de difícil acesso, para professores e funcionários de escola, é uma atitude desumana que vai penalizar ainda mais os profissionais que já estão convivendo com graves dificuldades, em meio à pandemia do novo coronavírus, e poderá inviabilizar o funcionamento de muitas escolas no Estado. “Estamos indignados com essa medida que foi tomada sem nenhum dialogo com a categoria e representa uma ação traiçoeira em tempos de pandemia. Há muitas escolas que não terão como reorganizar seus quadros de recursos humanos, pois os professores e funcionários não são obrigados a pagar para ir trabalhar”, disse Helenir Aguiar Schürer.

O CPERS convocou uma coletiva de imprensa virtual para apresentar o problema criado com a decisão do governo estadual de alterar os critérios e regras de enquadramento do difícil acesso. Além da presidente do sindicato, participaram da coletiva a economista Anelise Manganelli, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o advogado Marcelo Fagundes, assessor jurídico do escritório Buchabqui e Pinheiro Machado, e a professora Klymeia Mendonça Nobre, vice-diretora da EEEM José do Patrocínio, da Restinga Velha. (confira aqui a íntegra da coletiva)

A presidente do CPERS lembrou o que significa para professores e funcionários de escolas uma nova perda de renda na atual conjuntura. “Além de recebermos os salários mais baixos do Brasil, de estarmos há seis anos sem reajuste salarial e com salários atrasados e pagos de forma parcelada há 54 meses, agora vem essa decisão do governo do Estado que está gerando um novo e grande estresse na categoria. Ainda estamos completando esse levantamento, mas já dá para dizer que a maioria das escolas perderá recursos com essa decisão. Temos professores que percorrem cerca de 70 quilômetros para ir trabalhar na sua escola e que perderão o difícil acesso. Esses professores terão que pagar para ir dar aula daqui em diante”, questionou Helenir, que também criticou a retirada da avaliação da periculosidade do entorno das escolas como critério para o pagamento do adicional. “Todos sabem que temos escolas hoje que funcionam em regiões controladas pelo narcotráfico, onde professores e funcionários trabalham em situação de grande risco”, assinalou.

A economista Anelise Manganelli fez uma apresentação das principais mudanças propostas pelo governo e como elas impactarão os rendimentos de professores e funcionários da rede pública estadual. A primeira mudança foi no nome. A gratificação de difícil acesso passa a se chamar adicional de local de exercício. A proposta do governo Eduardo Leite muda os critérios de enquadramento das escolas para o pagamento do adicional aos servidores. Hoje, esses critérios são os seguintes:

– linha de transporte coletivo com parada a mais de 500m de escola, quando houver fatores físicos ou sociais adversos, no percurso;

– linha de transporte coletivo a mais de 1.000m da escola, incompatível com o início ou término dos turnos de funcionamento da mesma, desde que no Município haja transporte coletivo urbano;

– distância de mais de 20Km da Prefeitura Municipal fora do perímetro urbano, sem linha de ônibus regular;

– acesso por estradas vicinais de difícil trafegabilidade em dias de chuva, em distância superior a 2km;

– atendimento por apenas uma linha de ônibus com tempo de percurso igual ou superior a 60 minutos, do ponto inicial à escola;

– periculosidade do meio físico ou social em que a escola esteja inserida;

– escolas situadas em locais sem adequada infraestrutura.

Pelas novas regras apresentadas pelo Executivo, esses sete critérios são reduzidos a quatro, cada um deles ganhando um grau, variando de 0 a 100%, para o pagamento do adicional. Os critérios passam a ser: distância da sede da Prefeitura Municipal (40%); trafegabilidade da via de acesso (20%); transporte (20%) e vulnerabilidade social (20%).


Para a economista Anelise Manganelli, do Dieese as mudanças representam perda de recursos para professores e funcionários. / Igor Sperotto

Anelise Manganelli manifestou surpresa com esses novos critérios, pois eles restringem os enquadramentos atuais e representam grande perda de recursos para professores e funcionários que trabalham em regime de 40 horas semanais recebem R$ 1.260,00 de difícil acesso e, dependendo do novo enquadramento da escola, passarão a receber algo em torno de R$ 250,00 ou R$ 300,00. Pelo novo enquadramento, se a escola preencher todos os requisitos, esse adicional será de, no máximo, R$ 504,00. Ou seja, no mínimo, os servidores perderão metade do que recebem hoje a título de difícil acesso. A técnica do Dieese criticou os novos critérios propostos pelo governo:

“Eles deixam de avaliar as condições de infraestrutura das escolas, de periculosidade, a qualidade e condições de horário e trafegabilidade de transporte coletivo, além de estabelecer o número de alunos que recebem o Bolsa Família como critério único de definição de vulnerabilidade das escolas. Por esses novos critérios somente 1,1% das escolas estaduais hoje entrariam neste enquadramento de vulnerabilidade”.

Manganelli destacou ainda que, neste momento de pandemia, por todo o mundo, economistas de todas as tendências concordam que o Estado precisa intervir e se fazer presente na sociedade para minimizar os impactos sociais e econômicos. Enquanto isso, aqui no Rio Grande do Sul, questionou, o governo está propondo retirada de direitos, insegurança e maior perda de renda para os servidores?

Klymeia Mendonça Nobre relatou que as direções de escola foram pegas de surpresa esta semana quando receberam, por email, uma determinação para que fossem redefinidos os critérios de enquadramento das escolas, visando o pagamento do difícil acesso. “Não somos técnicos para fazer esse tipo de cálculo e pediram que fizéssemos isso para o dia seguinte, pois já valeria para a folha de pagamento de abril. Os professores ficaram abalados e em pânico com mais essa perda de dinheiro. Tem gente que depende desse recursos para pagar o aluguel, para comprar combustível ou mesmo para comprar material para ser utilizado na sala de aula. Temos professores que hoje recebem R$ 1.260,00 de difícil acesso e passarão a receber R$ 200,00 ou R$ 300,00. Além disso, já estão recebendo menos por conta dos descontos dos dias de greve”, protestou a vice-diretora da escola José do Patrocínio.

Ela também criticou a utilização do Bolsa Família como critério único para definir a condição de vulnerabilidade. “Nós temos muito alunos que não recebem Bolsa Família porque alguém de sua família já recebe aposentadoria. É lamentável tudo isso. A gente espera que o governo ponha a mão na consciência e reveja o que está fazendo”.

O advogado Marcelo Fagundes definiu a decisão do governo como um “ataque brutal” aos direitos de professores e funcionários de escola. Ele chegou a anunciar que, no dia 23 de abril, o pleno do Tribunal de Justiça do Estado julgaria, em uma sessão virtual, o mérito do mandado de segurança que trata do corte do ponto dos professores por conta da greve. Desde fevereiro, o governo vem descontando do salário dos servidores os dias da paralisação. No entanto, logo após o encerramento da coletiva, o CPERS informou que o TJ, sem notificar a assessoria jurídica do sindicato, retirou da pauta de votação o julgamento do recurso contra o corte de ponto, marcado para ocorrer em sessão virtual do Pleno no dia 23 deste mês. Ainda segundo o sindicato, informações preliminares dão conta de que o processo foi retirado de pauta a pedido do Estado.

Ao final da coletiva, Helenir Aguiar Schürer reafirmou a disposição do CPERS em dialogar com o governo sobre esses temas, mas disse que os pedidos de dialogo vêm sendo ignorados pelo Executivo. “Já pedimos para governar, mas o governo não responde. Parece que o secretário de Educação virou um adorno dentro do governo, sem nenhum poder de decisão. E as consequências dessa decisão poderão ser extremamente penosas para professores e funcionários”, alertou.

Confira aqui o estudo divulgado pelo Dieese sobre o impacto das medidas propostas pelo governo Eduardo Leite:

Edição: Sul 21