Negociação

Coronavírus: como manter o aluguel em dia na quarentena?

Advogado dá dicas para que locador e locatário cheguem a um entendimento durante a pandemia de covid-19

Belém (PA) | Brasil de Fato |
negociação Como manter o aluguel em dia na quarentena? Foto: Demolição de casa, no Pará, em setembro de 2019, na periferia de Belém do Pará - Catarina Barbosa/BdF

A pandemia do novo coronavírus alterou a dinâmica da sociedade em vários setores. Além do fechamento do comércio, necessário ao isolamento social para a não proliferação da doença, milhares famílias perderam se viram sem recursos suficientes para honrar o pagamento de aluguéis residenciais.

Com as medidas do governo federal que autorizam o corte nos salários e também com a redução de renda para quem trabalha informalmente, como conseguir pagar o aluguel? O Brasil de Fato ouviu sobre o assunto o advogado civil Bruno Brasil Carvalho, que é conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil Pará (OAB-PA) e faz doutorado na Universidade Federal do Pará (UFPA).

Bruno Brasil explica que a crise financeira gerada pela pandemia de covid-19 pode ser interpretada a partir do artigo 393 do Código Civil, que diz que "o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houve por eles se responsabilizado". A pandemia seria considerada um caso de "força maior", por ser um evento imprevisível e inevitável, além de ser tida como situação de calamidade pública em vários países do mundo.

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Em todo o Brasil, a moradia tem inúmeros impasses. Contudo, a região Norte é a que mais sofre. Nela, 24,4% das pessoas são privadas do direito à moradia adequada: ou arcam com aluguéis abusivos, ou têm casas construídas com materiais não duráveis e sem banheiro de uso exclusivo no domicílio. Para saber o que fazer nesse momento, o advogado respondeu a algumas dúvidas sobre o assunto. Veja abaixo.

Brasil de Fato: Com base no artigo 393, o inquilino não precisa pagar o aluguel?

Bruno Brasil Carvalho: Sim, precisa. Mas a Justiça entende que, por conta do isolamento social — que impede as atividades normais das pessoas —, o trabalho e por consequência a garantia dos ganhos habituais, as pessoas podem ter um comprometimento da sua renda.

Se a pessoa não pagar, pode ser despejada?

Não. A moradia é um direito fundamental de habitação, portanto, o indivíduo que nesse momento está com dificuldade de pagar o seu aluguel não pode vir a ser despejado. Logo, as ordens de despejo não serão deferidas. Mas isso não faz com que a pessoa fique isenta do pagamento do aluguel. Até porque precisa levar-se em consideração que muitas vezes o proprietário do imóvel tem no aluguel a sua única fonte de renda ou muitas vezes como uma fonte extremamente importante para a composição do orçamento pessoal e familiar dele.

O que fazer se a pessoa tiver dificuldades de pagar o valor integral do aluguel?

O melhor caminho é o entendimento. Uma tentativa de se conversar com o locador expondo a situação para tentar parcelar o pagamento, conseguir um desconto, ficar isento de juro, de multa.

Quais os artigos do Código Civil que amparam o inquilino?

Artigo 317, 478, 479 e 480 do Código Civil. Um fato imprevisível, como o da covid-19, altera toda a realidade da coletividade e impõe uma onerosidade excessiva para umas das partes, que significa que se configura no fato de que cumprir as obrigações ordinárias ganha uma conotação muito maior, um ônus muito maior.

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Ou seja, a pessoa conseguia pagar o aluguel, mas, como está sem renda, o salário não está sendo pago ou diminuiu, porque, se eu sou autônomo, eu não estou conseguindo ter rendimentos. Então, eu não tenho como arcar o mesmo valor do aluguel.

O que fazer se o proprietário exigir o valor integral do aluguel?

Se essa conversa não for possível, por conta da intransigência do locador, em atender esse pleito, que é justo, tem que se buscar uma revisão judicial. Essa revisão judicial é a intromissão do Poder Judiciário dos pactos privados nos contratos para tentar readequar a uma realidade.

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Nessa hipótese, o que se espera é que o proprietário do imóvel entenda que deve baixar o valor do aluguel, facilitar o pagamento, parcelar, dispensar multas, dispensar juro. No entanto, se ainda assim ele for intransigente, o pleito deve ser feito na Justiça, por meio de uma ação de revisão judicial, onde se alegando o caso fortuito, a força maior da covid-19, que é um fato imprevisto, a onerosidade excessiva e que a postura do intransigente do credor impõe algo parecido como um abuso de direito. Vai se pedir que o juiz faça a diminuição desse valor, adeque a realidade.

O que é indispensável nesse acordo com o proprietário do imóvel?

Se você mora em casa alugada, deve ter em mente que algum pagamento — ainda que parcial do aluguel, por meio do depósito, por meio do pagamento direto — precisa ser feito para que a pessoa não fique inadimplente. Esse é um fato para que o locador não venha posteriormente a ter o contrato de locação rescindido e até mesmo despejado por falta de pagamento.

O melhor caminho é uma negociação direta com o proprietário, então?

Isso mesmo. O primeiro caminho é o da tentativa de conciliação, do entendimento entre as partes. Se não for possível buscar a revisão judicial dos aluguéis para se evitar uma rescisão, o despejo, com alegação do fato imprevisto e da onerosidade excessiva.

Edição: Camila Maciel